Por Ana Miranda (*)
Andamos dizendo adeus aqui, ali, um adeus a cada dia, cada
instante, cada coisa. Adeus dia, adeus noite! Adeus fim de semana, adeus
domingo! Adeus lua cheia, adeus chuva, adeus florzinha murchando. Adeus, amor!
Adeus é uma palavra perturbadora, complexa, sutil; quer dizer na nossa língua
uma separação longa, ou para sempre, encomendando algo a Deus, entregando algo
em Suas mãos. Tão diferente de tchau, Até mais, Até breve, Até amanhã! Fique
com Deus, que Deus te acompanhe, significa a palavra adeus; mas também pode ser
uma expressão de lamento numa perda, numa lembrança, Adeus juventude! Adeus
férias! Adeus paraíso! Ou alívio: Adeus sapato apertado, Adeus solidão!
Dizer adeus pode ser um recomeço. Pode ser um gesto de coragem, ou
de generosidade, ou mesmo um gesto de amor. Se digo adeus a algo bom, a algo
que amo, a algo que desejo, é um adeus triste; mas se digo adeus a uma
tristeza, o adeus é não apenas bom, como precioso. Há adeuses e adeuses.
A primeira música que aprendi ao violão, eu tinha uns doze anos,
foi "Adeus, amor, eu vou partir"... E uma das minhas preferidas
canções na adolescência, "Adeus, vou pra não voltar e onde quer que eu vá
sei que vou sozinho" (Torquato e Edu); eu a ouvia como uma música de amor
perdido, Vem! Nem que seja só pra dizer adeus. Dizem que Torquato estava se
despedindo da vida.
Sei que é muito difícil dizer adeus ao que amamos. Minhas
despedidas dos netos que moram lá no fim do mundo sempre foram emocionais. Vovó
I love you! Gritaram do outro lado do aeroporto e ainda escuto, até hoje,
tantos anos depois. Queremos ter todos conosco, mas o mundo e nossos corações
andam a cada dia mais repartidos em pedaços. Adeus, Amsterdã, estou voltando
para o Brasil.
Tão bom quando um amigo nos abraça e diz que nunca vai nos dizer
adeus, Se depender de mim, nunca vamos nos separar. Muito bom imaginar algo
perene, invertendo o sentido da natureza, da vida. Acreditar que nada muda,
nada passa. Mas também é bom ir adiante, renovar, recomeçar, reencontrar... Tem
gente que vai logo dizendo adeus, com medo de ouvir alguém lhe dizer adeus. Tem
gente que diz adeus e repete, adeus, uma vez apenas não basta.
Na hora do adeus, você pode dizer: Este adeus é pelos últimos dez
mil anos. Do mundo nada se leva. Para onde for, levarei teu olhar, levarás
minha saudade. Este é um adeus ou uma curva do caminho? Não se preocupe comigo,
adoro ficar só. Não saberei nunca dizer adeus. Nada resta de mim que seja meu.
Viajo com o meu coração. Minhas velas ao mar. Adeus.
Diga adeus, se não quiser mais ver a pessoa. Ou diga, Até logo, na
esperança de um reencontro. Deixar nossa casinha, deixar nossa vidinha, nossa
rotina, enfrentar uma viagem, uma mudança de rua, bairro, de amor, desejo, emprego,
de um vestido velho confortável, de praia, livro, todo adeus é difícil. Estou
aqui dando adeus a meus leitores, meus colegas de jornal, meu ilustrador, vou
parar de escrever crônicas por um tempo, não sei quanto. Aproveitarei os novos
dias para desenhar ou escrever um livro, pode ser romance, poesia, memórias...
um caderno de sonhos... Abraços a todos.
(*) Escritora. Colunista
de O Povo.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 27/01/24. Vida & Arte, p.2.
Nenhum comentário:
Postar um comentário