Por Márcio de Souza Porto (*)
Os acervos cartoriais
dos séculos XVIII, XIX e XX, são fontes documentais para a história, para
pesquisas e construções historiográficas, sociológicas, antropológicas,
jurídicas e culturais de qualquer povo. Encontram-se no Arquivo Púbico do
Estado do Ceará, há mais de noventa anos, uma diversidade de documentos, à
disposição dos historiadores e demais pesquisadores: inventários, testamentos,
certidões de casamentos, documentos comerciais, ações cíveis e criminais,
daqueles séculos, que após perderem suas finalidades específicas, foram
depositados no Arquivo Público para diferentes fins de pesquisa.
Os arquivos armazenam
conhecimentos coletivos e funcionam a partir de três características:
conservação, seleção e acessibilidade. Esta última é que define se se trata de
uma instituição repressiva ou condizente com uma sociedade democrática.
Nos estados totalitários, os arquivos são silenciados, já nas democracias,
funcionam como bens comuns, de natureza pública, que podem ser interpretados.
Não há a coisa pública, a res publica, sem acesso às fontes de arquivo. Um dos
lugares sociais dos arquivos públicos é como memória institucional da sociedade
e do Estado.
Na semana passada, o MP
do Ceará, determinou que os cartórios de Fortaleza, com documentos custodiados
pelo Arquivo Público, os recolham de volta. Tal medida terá consequências
prejudiciais à historiografia, à sociologia, à antropologia e ao
direito. Os cartórios não são instituições de pesquisas, os arquivos públicos,
sim. Como teremos novas abordagens sobre a história do Ceará, se esses
documentos serão mantidos sob propriedade dos cartórios, que podem alegar que
para acessá-los, cobrarão taxas que garantam a preservação, conservação,
organização e higienização dos documentos? Que história será escrita com
possíveis impedimentos de acesso, a dos vencedores? Como os alunos e
professores de História e outras disciplinas, das IES públicas, contarão a
história dos subalternos, sem acesso a esses acervos?
Com a palavra, os cursos
de Graduação e Pós-Graduação em História da UECE, UFC e Unilab, com urgência,
antes que se decrete, este sim, o fim da história.
(*) Doutor em Sociologia
e professor da UFC,
Fonte: O Povo, de 11/02/24. Opinião. p.18.
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