Aqui vale mentir, só não vale
acreditar!
O
milagre da imagem.
Por
"pessoa braba" entenda o "casca grossa estrutural",
ignorante das coisas, mas sem malícia. O "canto de cerca" que mela a
vara por insipiência. É o caso de uma rica viúva por nome Tota, moradora da
zona rural de Apuiarés, ignorante de pai, mãe e parteira, como diziam os provençais.
Contou-lhe
uma vizinha interesseira que a Mesbla vendia o mais monumental lançamento da
época: o videocassete. Que numa propaganda o aparelho "amostrava"
imagens bacanas numa "telona". Que podia parcelar em 12 vezes.
Tota
embarcou na onda e veio bater em Fortaleza. Podia não ter marido, mas um
videocassete em casa ia ter. A vizinha falou! E ela já tá é na loja, mesmo.
Vendedor testa o aparelho comprado, "aprovado". De volta ao sítio...
Vizinha
se coçando de ansiedade pra ver a novidade sugerida. Mas o videocassete dá
"poblema", e Tota vem se reclamar. Vendedor crê que tenha sido
"os catabilhos" da viagem. Por via das dúvidas, entrega aparelho novo
à cliente.
Máquina
testada e aprovada. Ao ligar o bicho, em casa, no sertão, nova frustração.
"Tá pifado". À Mesbla regressa, exibindo grosseria das boas, do alto
dos tamancos. Vendedor horrorizado. Pra evitar imbuança maior, a gerência torna
a liberar aparelho zerado.
Em
Apuiarés, com cuidado, Tota liga pela terceira vez o videocassete. Necas! A tal
vizinha então se enfeza: "Vá 'dicretada' ao DECON". Em face de tanto
mal-entendido, o promotor chama as partes querelantes pra acareação.
Após
o tête-à-tête (loja se dizendo inocente, querelante anuindo prejuízo), a
conclusão: Ministério Público e Mesbla irão à casa de dona Tota, com técnico,
pra ver in loco que fulerage é essa. Lá foram todos.
Tão
somente pra constatar que não havia problema algum com o videocassete. Tota
simplesmente não tinha aparelho de TV em casa...
Computador fofoqueiro
E
o computador chegou à longínqua zona rural de Brejo Santo. Estamos no Sindicato
dos Trabalhadores na Agricultura. Na fila do recadastramento, seu Bobó,
conhecido por dar uma voltinha no mulherio sem carecer tomar o Viagra.
-
Deixo só a caixa no bolso, pro rapaz lamber os beiço.
Bobó,
velho brabo, de frente pra mocinha atendente, enfim. Nome?
-
Bobó, 'apilídio' de Raimundo Leopoldo.
-
Muito bem, seu Raimundo. Vejamos aqui.
A
funcionária do Sindicato acessa a ficha de Bobó e busca dele confirmações para
o que lá está. O senhor tem 78 anos, é viúvo de dona Telma de Sousa, mora na
Rua 15, casa 29, é alérgico a leite...
-
Cuma num havera de sê, dona.
-
Seu último trabalho foi no cartório de registros. É isso?
-
Ôxe! Cuma a senhora sabe tanta coisa d'eu?
-
O computador tá dizendo.
E
Bobó sai dali decretado pra casa, horrorizado. Encontra a filha preparando o
almoço e dispara:
-
Já tinha 'ouvisto' muita gente fofoqueira, mas cuma esse computador, nããã!
Fonte: O POVO, de 22/03/2024. Coluna “Crônicas”, de Tarcísio Matos. p.2.
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