sexta-feira, 13 de setembro de 2024

Crônica: “Nunca peça penico, jamais peça pra obrar e sair!” ... e outro causo

Nunca peça penico, jamais peça pra obrar e sair!

Oportunidade apareceu e Zé Milton, bufo! Agarrou! Se mandou pra China, aos 30 de idade. Lá trabalhou por 35 anos com catrevagens que fazem o maior sucesso nos sex shops daqui - algemas de metal, lubrificantes corporais, lingeries, vibradores. Pois bem. O homem voltou de lá rico, trazendo da Ásia três caixas grandes desse material, guardadas a sete chaves no apartamento de 250m2 comprado à vista. Ultrapassando hoje a casa dos 60, botou os pés na terrinha e casou. Tá junto com a mulher tem semanas; parelhos na idade.

Ela não sabia dos produtos made in China escondidos, vindo a descobrir as tais caixas mais tarde, sem, contudo, abri-las e ver os conteúdos.

- Zé! Que caixonas são essas na despensa?

- Perfumes, Glorita! Perfume que eu trouxe da China!

- Cheiro estranho! Bora rebolar no mato?

- Bora, amor! Você que manda! Jogue fora tudim!

Autorizada a ver-se livre daquilo, Glorita pede ao zelador do prédio que dê fim aos "perfumes", acondicionados nas enormes caixas de papelão, contendo dezenas de caixotes nelas. Crente que era algum Vetiver vencido, o encarregado da limpeza do condomínio ficou com uma caixinha, pra presentear a paquera Virgínia, solteirona da igreja que frequenta, nunca dantes flagrada com alguém. A "moça véa", cara de desdém, abre a caixa lentamente, joga a mão dentro e... ó susto magistral! Agarra (ainda na validade) um vibrador ponto G aveludado com formato golfinho. O grito dela?

- Aaaaaaaaaaiiiiiiiii!!!!!!!!!!!!!! Meus Deus!!!!!!!!!!!!!!! Santo, santo, santo!!!!!!!!!!!!!

Resultado, largou a igreja e pediu o zelador em casamento. A declaração, sábias frases de um para o outro:

- Nunca peça penico, meu bem! Corra atrás dos seus sonhos que nem eu!

- Glorita.

- Pedir pra obrar e sair antes do jogo terminar, jamais! Você se garantiu, querida! - zelador.

O céu é dos pedreiros

Nêgo Zezé da Cabras, da Vila dos Industriários, foi o melhor meia-direita que vi em campo, além de mestre de obra de inigualável gabarito. Joelho quengado, largou a pelota e maneirou na construção civil. Há um ano, pra não ficar parado, entrou pra lei dos crentes. Aos domingos, irmão Zezé agora arrasta multidão ao culto: mulher, filhos, demais parentes e aderentes e amigos que lhe comungam a fé fervorosa; uns 30 vão com ele, em média, rezar. Obreiro querido, trabalhador da última hora, craque evangélico.

Numa das pregações vespertinas, o pastor ensina que seremos todos julgados por nossas obras. Pessoal do Zezé aplaude efusivo a assertiva, voltando o olhar para o recém-convertido, como a constatar sem nenhuma dúvida: "Esse é o cara, Senhor! Tem obra a mostrar! E é de ruma!" Pastor insiste: "Só as obras interessam na Contabilidade Divina". De novo Zezé é saudado pelos seus, com singular admiração. "Tem lugar garantido no Paraíso". Gente chorando de emoção.

Terminado o culto, do lado de fora do templo, um dos familiares - o mais afoito e animado, bem fortão - bota o ex-meia-direita nos ombros e comemora, aos gritos.

- Aleluia, Senhor, aleluia! Tio Zezé vai 'dicretado' ao encontro de Jesus!!!

O próprio eleito do Pai Celeste, ao que parecia a todos, se pronuncia enfim. E todos entendemos mais perfeitamente o porquê da certeza de que ele é o ungido:

- Realmente, como mestre de obra levantei 50 casas, 30 bodegas e oito oficinas. Sem contar que, avulso, reboquei 200 muros, pintei 300 paredes e cimentei 17 fossas etc....

Fonte: O POVO, de 26/07/2024. Coluna “Crônicas”, de Tarcísio Matos. p.2.

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