Entrevista conduzida por
Larissa Viegas, jornalista de O Povo.
José Lima de Carvalho
Rocha: o médico que se baseia na filosofia cristã e se encanta pelo poder da IA
OP - Como foi a sua
trajetória no colégio, da entrada e até a chegada à Direção?
José - Em 1975 eu comecei a
cursar Medicina. Imediatamente, passei a trabalhar na escola. Porque tem uma
coisa, um detalhe importante. Esses nove irmãos, 10 comigo, nós nunca recebemos
mesada. Precisávamos trabalhar.
Tínhamos que fazer
alguma coisa, como meu pai dizia, uma coisa útil, para receber. Então, podia
ser leitura de um livro no qual ele nos arguia. Depois ajudava na pintura de
parede na escola, limpeza de carteiras, sempre “trabalhou, ganhou. Não
trabalhou, não ganha”.
E com essa
necessidade de trabalhar, logo que eu entrei na universidade, eu precisei ter
também de algum dinheiro para me deslocar, colocar gasolina. Comecei auxiliando
professores nas aulas de ciências e assim fui avançando.
Depois de alguns
anos, ainda cursando Medicina, à noite eu fazia Pedagogia. E quando eu concluí
a Medicina, em 1980, e a Pedagogia, um ou dois anos depois, eu comecei a ser
formalmente o diretor da escola. Trabalhei no setor pedagógico, na parte de
coordenação, mas o meu sonho maior era exercer a Medicina.
Tive que alterar
minha trajetória por conta de necessidades de trabalho e de necessidade
econômica que meus pais viviam à época.
Foi solicitada a
minha ajuda para trabalhar lá e então tentei conciliar por mais alguns anos, eu
ainda era professor lá da (Universidade) Federal, que entrei em 1981, até uns
oito anos depois. Conciliava essa dupla jornada, mas aí não deu mais, porque os
dois lados absorviam muito.
OP - Então, até na
Medicina o senhor ia para a área de educação?
José - Exatamente. Meu
sonho na Medicina era ser cirurgião plástico e ser professor da Federal e, aos
sábados, ajudar meu pai. Só que essa questão do sábado foi ampliando, ampliando
e acabei não ficando só no sábado e não dava para conciliar as duas atividades.
Tanto que primeiro eu
fiz a residência médica em cirurgia geral. Comecei essa residência, também fiz
o mestrado, depois, mais recentemente, terminei o doutorado, tudo na área da
saúde. E na Pedagogia eu fiz também especialização em administração escolar.
Então conciliei essas
duas atividades o quanto foi possível. À medida que era mais solicitado dos
dois lados, não era só de um, eu tive que fazer uma opção.
E aí a necessidade e
o desejo de que minha família, principalmente meu pai e minha mãe, tivesse uma
velhice mais tranquila, seguindo o sonho da escola funcionar bem, eu resolvi,
pelo menos momentaneamente, abdicado meu. Na época era momentaneamente.
OP - Sobre a relação
com a senhora Valéria, pode nos contar como ela começou?
José - Eu era estudante de
Medicina. Uma professora e mais duas coordenadoras levavam os alunos (do
Christus) para excursão em Salvador, no ônibus. Os alunos se juntavam, era
término de curso, que antigamente era o oitavo ano, hoje é o nono.
E em uma dessas
excursões a gente estava lá. E a gente começou a conversar, a se conhecer. São
42 anos de casados. Ela se queixa que a gente namorou por cinco, seis anos, mas
eu tinha que terminar a faculdade primeiro, não é?
Me formei, passei no
concurso (da Universidade Federal do Ceará) e foi aí que o pai dela autorizou a
gente a casar, porque nesse tempo era assim, você tinha que ter emprego para
poder casar.
No dia a dia é desse
jeito que você viu. Acredito que a gente tenha uma vida boa, tem algumas
vontades diferentes, ela gosta de viajar, eu não gosto tanto. Aí tem outras
coisas que os gostos já se equivalem, mas a gente se entende.
OP - Parte da sua
família também atua no Christus. Como foram definidas as funções? Houve um
marco, onde cada um escolheu sua área de atuação ou foi algo mais orgânico?
José - As pessoas têm
vocações, as pessoas têm talentos e as pessoas têm vontade de trabalhar, uns
mais, outros menos. Então, não houve uma determinação para que cada um ocupasse
determinadas funções.
No nosso processo de
sucessão e de desenvolvimento de trabalho existem algumas regras gerais, que
ainda hoje são seguidas. Isso começou em 1979, 1980. Era um acordo entre
irmãos.
Eu tinha 22, 23 anos,
os outros mais novos, daí para baixo. Raquel, por exemplo, é 17 anos mais nova
do que eu. Essa distribuição de atividade, como aconteceu essa sucessão, é
diferente de outros tipos de sucessão que acontecem com outras famílias que trabalham
na mesma empresa.
Participamos, eu e
outros irmãos, de vários cursos, de vários planejamentos de sucessão e a gente
descobriu que nenhum desses dava certo para a gente. Então, a gente adotou o
próprio modelo de trabalho. Cada um foi ocupando espaços que estavam sendo criados
à medida que a escola avançava.
Não só a escola, como
outras atividades também. Nós trabalhamos com construção civil, com confecção,
com gráfica e outras atividades que foram se desenvolvendo e os outros foram
ocupando os espaços.
Não há exclusão de
quem pode entrar e quem não pode, há exclusão daqueles que não cumprem o que
promete entregar. O Brasil é um país difícil de se trabalhar empresarialmente,
porque as regras mudam muito, às vezes até retroativamente.
Então, temos que ter
uma equipe ágil, coesa, que possa resolver dificuldades e pensar também para a
frente, no futuro. Foi feito dessa maneira, não tivemos nenhuma orientação.
Posso dizer que a
segunda geração ainda segue o sonho de adolescentes que deu certo e que,
talvez, a gente não tenha conseguido ainda se libertar desse sonho inicial.
Eu espero que a
próxima geração, que a gente chama de G3, consiga ter os próprios sonhos e
segui-los, porque já, já, daqui a alguns anos, a gente não vai estar por aqui
para acompanhá-los.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 22/05/2025. Reportagem. Legados.
p.13-15.
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