João Brainer Clares de
Andrade (*)
Não há dúvidas de que o programa
federal “Mais Médicos” é uma investida eleitoreira e que está longe de resolver
a distribuição de médicos no Brasil. Os números saltam aos olhos quando menos
de 30% das vagas tiveram inscritos na primeira chamada, o que denuncia o
descrédito local e internacional.
Paradoxalmente, podemos enxergar
ganhos com o programa e a forma desrespeitosa como o Governo vem lidando com os
médicos brasileiros. Com a proposta de médicos estrangeiros, nossos esculápios
locais reacenderam as discussões sobre a necessidade de ocupar os rincões
brasileiros, reforçando um sentimento de dever cívico quiescente por anos. A
proposta de expansão do curso médico em mais dois anos reanima o debate da
estrutura da nossa formação: estamos bem formando médicos para Atenção Básica
ou Emergência? O curso médico ainda cabe em seis anos? Além disso, a população
aproveita o metralhar do Governo e puxa coro em críticas sobre a atuação dos
médicos, sua relação com os serviços públicos e a relação médico-paciente, o
que tem suscitado consciência na classe, e que, certamente, nos dará médicos
brasileiros mais compromissados depois desse tempo. Agora, dar bom exemplo tem
se tornado regra.
A exigência de prova de
revalidação suscita outra consciência: estamos formando bem nossos
profissionais? A mesma exigência que fazemos aos portadores de diploma
estrangeiro é válida aos formados em solo nacional? As escolas médicas
brasileiras reabriram discussões internas e já iniciam grupos de requalificação
de seus currículos, focando em uma formação técnica, humana e generalista. Até
os salários, que não aparecem no rol das demandas das entidades, acabaram
arrecadando crédito: a bolsa oferecida no programa federal tem virado piso, já
representando conquista considerável.
O principal, no entanto, é a
consciência de dever social: a união dos médicos brasileiros reavaliou nossa
inércia de décadas com a saúde pública. Por anos, fomos nos habituando às
condições inóspitas, à falta de recursos, à falta de dignidade. Encontrávamos
rota de escape na máquina privada e nos acostumávamos com a mazela pública.
Pelo bem ou pelo mal, pela coerência ou não do programa federal, houve algum
ganho. Não sabemos se teremos mais médicos de fato; o que sabemos é que, pelo
menos, teremos agora mais consciência.
(*) Acadêmico de Medicina da Universidade Estadual do Ceará
(Uece)
Publicado In: O Povo, de 15/08/2013. Opiniãp. p.6.
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