quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

O CUIDADO ESPIRITUAL DE ENFERMAGEM



Por Michell Ângelo Marques Araújo (*)
Constitui um desafio para profissionais de enfermagem atender o ser humano nas suas diversas necessidades, contemplando as dimensões humanas. Em outras palavras, é necessário tomar o cuidado de Enfermagem em sua dimensão ampliada, qualificando a escuta sobre os padecimentos do paciente com o intuito de ir além do diagnóstico de sinais e sintomas, auscultando as subjetividades produzidas na condição do adoecimento.
Devido à formação naturalista dos profissionais de saúde, quase sempre se dá maior ênfase à dimensão físico-biológica, relegando-se a segundo plano – e até mesmo negando – as demais dimensões, particularmente a espiritual. Tal conduta configura um paradoxo, considerando-se a tão propagada abordagem holística na saúde, a qual percebe o ser humano não somente como a soma das partes, mas como a inter-relação e a influência de cada uma sobre as demais, ou seja, como um todo.
As instituições de ensino ainda persistem em um modelo centrado no biológico, privilegiando a doença e não o homem como a finalidade de sua ação, apesar de o discurso ser diferente. Esse fato, alvo de muitas críticas, tem sido exposto como inadequado, principalmente ao se propor uma humanização do cuidado em saúde. Isso mostra o distanciamento das práticas de saúde com aquilo que é realmente a integralidade do cuidado, o respeito e a dignidade da pessoa humana.
Faz-se mister compreender este homem, suas necessidades e seus desejos, de forma que contemple toda a sua complexidade dimensional. Compreender as dimensões humanas constitui o primeiro passo para um cuidar integral, tendo em vista que há uma multidimensionalidade ontológica e uma unidade antropológica que precisam ser contempladas.
Dentre todas as dimensões humanas, a espiritual tem destaque para a área da saúde: primeiro, porque é ela que diferencia o homem dos demais seres, pois integra a capacidade de ser livre, de ser responsável e de buscar, constantemente, um sentido para a vida; segundo, por ser uma dimensão pouco valorizada, devido à ênfase dada às dimensões psicofísicas e ao distanciamento histórico da ciência tradicional, que desvaloriza tudo aquilo que não poderia ser comprovado por seus métodos experimentais, quantificáveis e replicáveis. Nesse ínterim, somente a filosofia e a religião são responsáveis por explicar e estudar os fenômenos que fogem dos objetos estabelecidos da ciência tradicional.
Os enfermeiros vivenciam constantemente momentos de crise, tanto seus quanto das pessoas submetidas aos seus cuidados, envolvendo-se num emaranhado de sentimentos e pensamentos, nos quais elementos subjetivos emergem. Em meio a tudo isso, precisam atender às demandas desses pacientes de forma que consigam alcançar os objetivos de seu cuidado..
Nos serviços de saúde, esses profissionais deparam-se rotineiramente com problemas tão complexos que não conseguem visualizar outro caminho a não ser se fechar e criar uma couraça de insensibilidade, reforçada, inclusive, na formação exigida pelos mestres. Para quebrar esse paradigma, é imperativo o desenvolvimento de forma integral das dimensões, racional, sensitiva, afetiva e intuitiva. Do contrário, o sofrimento dos pacientes, intensos e constantes, tornar-se-ão insuportáveis para os cuidadores.
É a partir da espiritualidade que conseguirão superar essa tendência de afastamento. Nessa perspectiva, a espiritualidade mostra-nos o poder do homem de, pela transcendência, criar, transformar e decidir mesmo em situações extremas de comprometimento. Vislumbra-se a possibilidade de, mesmo no sofrimento, emergir criatividade, crescimento e superação.
(*) Michell Ângelo Marques Araújo é professor doutor em Enfermagem na Faculdade Católica Rainha do Sertão
Publicado In: O Povo, de 8/09/13. Cad. Espiritualidade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário