As correntes coortes de médicos graduados pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), de um modo geral, ignoram os nomes dos médicos que, logo após a II Grande Guerra, albergados no Instituto de Ensino Médico, empenharam-se em fundar a então Faculdade de Medicina do Ceará, chegando, inclusive, a desconhecer aqueles que, devotadamente, foram os primeiros docentes da nova escola.
A partida terrena desses lentes, bem como a inobservância de
um setor na UFC que restaure e preserve a sua história institucional, configuram
um retrato desanimador, capaz de liquidar a memória de uma entidade possuidora
de uma vasta folha de serviços ofertados ao Ceará, pelo que já diplomou de médicos
e por seus atendimentos aos nossos cidadãos, aportando benefícios vultuosos ao
povo cearense, aliada à valorosa contribuição conferida ao avanço da ciência
médica na região nordestina. Ao que parece, nossos primeiros professores
somente estavam sendo lembrados por seus continuadores nas antigas cátedras;
adite-se que muitos desses sucessores jazem igualmente em repouso perpétuo, sentenciando
uns e outros aos umbrais do esquecimento.
Foram cinco os principais fundadores da primeira instituição
de formação médica cearense, retratados na lendária fotografia (vide foto) em
que figuram, da esquerda para a direita: na frente, os Drs. Jurandir Marães
Picanço e José Waldemar Alcântara e Silva e, na segunda fileira, os Drs. José
Carlos da Costa Ribeiro, Newton Teófilo Gonçalves e Walter de Moura Cantídio,
todos falecidos há alguns anos.
Em 1978, por ocasião das celebrações dos trinta anos de instalação
da Faculdade de Medicina (FAMED) da UFC, foram registrados dois eventos
inaugurativos especiais, ambos gerando uma esperança de conservação da história
médica no Ceará: a Academia Cearense de Medicina (ACM) e o Remêmoro.
A ACM, solenemente inaugurada a 12/05/1978, tem a sua
fundação amparada em um pequeno grupo de professores do Curso de Medicina da
UFC, inicialmente composto por Drs. José Carlos Ribeiro, Joaquim Eduardo de
Alencar, Geraldo Gonçalves, Edísio Tavares e Walter Cantídio, sem contar então com
o seu idealizador, o Dr. Jurandir Picanço, uma vez que este falecera no ano
pretérito. Nessas suas quatro décadas de funcionamento, apesar das dificuldades
próprias das entidades associativas, esse sodalício tem exercido importante papel
para a preservação do saber e da cultura médicas no Ceará, notadamente em prol
da nossa história médica local.
O Remêmoro, montado no Campus do Porangabuçu, foi concebido
como uma estrutura física seminal de um museu médico, no modelo do existente na
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Para a consumação desse
projeto, participaram ativamente diversos professores que contribuíram com
objetos e materiais variados para suprir o acervo original, que incluía: livros
antigos, fotografias, instrumental médico do princípio do século passado,
equipamentos didáticos usados para o ensino médico nos primeiros anos da instituição
e outros instrumentos.
Na sua inauguração, esse equipamento tornou pública uma
exposição permanente de cerca de cinquenta painéis que exibiam a evolução da
Medicina, ao longo dos séculos, fruto da doação da Alemanha Ocidental,
intermediada pela Casa de Cultura Alemã da UFC, tendo à frente o seu diretor à
época, o Prof. Berthold Zilly. Dessa coleção, subsistiram poucos e esparsos
painéis, ora custodiados pela ACM.
O Remêmoro, por gradual desinteresse, ou mesmo negligência,
de alguns gestores universitários, maiormente os da própria unidade acadêmica
que o acolhia fisicamente, foi desativado nos anos subsequentes, legando um vazio,
até o presente não ocupado. Por oportuno, saliente-se que a Profa. Dra. Valéria
Goes Ferreira Pinheiro, ao ensejo dos preparativos dos setenta anos da FAMED,
acontecidos em 2018, instituiu uma comissão de professores, da qual tomavam
parte Sílvia Bonfim Hipólito, Francisco das Chagas Medeiros, Roberto Misici, Ricardo
Pereira Silva, dentre outros, que resgatou documentos e apetrechos, que
recontam momentos efusivos da FAMED, valendo a iniciativa como proposição de
soerguer o seu espaço Remêmoro.
É imperativo o reconhecimento de que a nossa FAMED da UFC
cresceu e modernizou-se, incorporando uma tecnologia médica atualizada, com
recursos pedagógicos efetivos. Entretanto, não transparece que o devido
respeito à preservação da memória institucional tenha sido por ela observado a
contento, condenando, portanto, à obscuridade grandes mestres, que edificaram e
deixaram ao povo cearense essa sólida entidade acadêmica.
Os nomes de tão atuantes docentes, que hoje não mais
convivem conosco, precisam ser reverenciados e seus feitos necessitam ser
repassados às novas gerações de estudantes da FAMED, para que nossos estimados
mestres sejam sempre recordados.
Isto posto, roga-se que se busquem os meios cabíveis para
assegurar a preservação da memória institucional da FAMED da UFC.
Marcelo Gurgel Carlos da
Silva - CREMEC 2412
Medicina Preventiva e
Social - RQE Nº: 483
Medicina do Trabalho - RQE Nº: 589
*Publicado In:
Jornal Cremec, 143: 8, setembro-outubro de 2020. (Informativo oficial do
Conselho Regional de Medicina do Estado do Ceará).
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