Por Lúcio Alcântara (*)
Bom prefeito é o que antes de tudo ama sua cidade. O
cargo de prefeito está entre os exercidos como o que mais me satisfez
pessoalmente.
Próximo às pessoas, íntimo dos problemas, muitos
solucionáveis com presteza, graças a agilidade municipal, pus em tudo o
condimento do amor. Para Ciro Colares sou "talvez o mais apaixonado de
seus rivais". Desse olhar nunca me desfiz.
Sigo suas vicissitudes, vibro e sofro com seu
progresso e mazelas. Bela mulher em vestes desfeitas é a metáfora que me
inspira.
Fortaleza, cidade fêmea, aberta, se estende no
plano, fita o horizonte sem a orografia que barra e esconde, virada ao mar,
verde e bravio, que sopra à terra a brisa suave sob a constância do sol, luz do
céu e das almas.
A beleza, aos poucos perdida desde o início, é a
degradação da natureza, desmonte das dunas, molduras das praias, avanço no
mangue, aterro de rios e lagoas, sacrifício das matas, céu sem pássaros,
imóveis que tombam, lembrança bucólica de um passado sem volta.
Aberta e humana escancara portas e braços, generosa,
acolhe o forasteiro, livre, absorve pronta, cultura, costumes, moda e hábitos
externos, sem o ranço de suas irmãs filhas do açúcar e do cacau, a um só tempo
vulnerável e dinâmica.
O traje roto são farrapos urbanos, manchas de
miséria e mal feitos espalhados na urbe, espaços públicos invadidos
precocemente depredados atingidos pela tolerância excessiva, a transgressão
admitida, por omissão ou cumplicidade.
A cidade formal, administrada, onde se cumprem
normas e posturas municipais, diminui de tamanho, abrange área sempre menor.
Já não vamos onde queremos, apesar de maior
mobilidade, pois em amplas regiões, domínio das facções, impede-se o
acesso de estranhos, até mesmo da polícia. Retrato do paradoxo da
desigualdade, anátema dos descaminhos nacionais, imediatos e distantes.
Destino dos que a buscam esperançosos a cidade exige
urbanidade, sociabilidade mínima, respeito ao ambiente, amor, sem
individualismos irresponsáveis.
Longe, mesmo camadas mais altas, de vivermos
essa utopia, sempre será tempo para amar e proteger nossa metrópole.
Encaremos confiantes as promessas do futuro
prevenidos contra as companhias dissimuladas dos recorrentes saques urbanos.
Que os versos atormentados de Raimundo Varão, no poema Fortaleza: Por que nos
batem temporais medonhos,/e tivemos, no mundo, a mesma sorte,/ó casta Fortaleza
dos meus sonhos, sejam advertência a nos alertar.
(*) Médico. Ex-prefeito de Fortaleza. Sócio do Instituto do Ceará: Histórico, Geográfico e Antropológico e da Sobrames/CE.Presidente da Academia Cearense de Letras.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 15/4/21.
Opinião, p.19.
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