Por Carlos Viana (*)
A morte do pequeno Heitor Viana da Silva, de 9 anos, mostra, mais
uma vez, a invisibilidade das pessoas com deficiência.
Heitor era autista não verbal e morreu na última semana. Como
sempre, a mãe da criança, que a deixou no carro enquanto ia ao banco, foi
atacada nas redes sociais.
No entanto, ninguém se perguntou se essa mulher tinha ajuda para
cuidar do menino. A responsabilidade sobre a criação de uma criança, sobretudo
de uma com uma deficiência severa como Heitor, não é responsabilidade apenas da
mãe.
Cresci convivendo com pessoas com deficiência e pude presenciar a
luta dessas mulheres guerreiras para que seus filhos tenham cuidados médicos e
acesso à educação.
Minha mãe é exemplo disso. Quando ela descobriu que eu era cego,
com quase um mês de vida, largou o emprego para me levar ao médico e,
posteriormente, à escola.
A escola de cegos em Fortaleza fica num bairro distante de minha
casa, e minha mãe, assim como as mães dos meus colegas, ficava a manhã inteira
na escola, sentada em duros bancos de madeira, esperando que nossas aulas
terminassem para nos levar de volta para casa. Raros foram os casos que algum
pai acompanhava algum amigo cego até a escola. Aliás, muitos homens, ao saberem
que seus filhos têm alguma deficiência, deixam a responsabilidade apenas sob os
ombros da parceira.
A morte de Heitor é um tapa na cara de uma sociedade tão
preconceituosa, que prefere julgar em vez de entender os motivos. Essa
sociedade que tenta, a todo custo, tornar nós, pessoas com deficiência,
invisíveis.
A morte de Heitor dói, não só pelo sofrimento da família, mas por
expor assim, de forma tão crua, como as pessoas não se importam com o outro.
Onde estavam os seguranças e demais funcionários do local, que não
interceptaram uma criança andando sozinha? Onde estavam os demais estudantes,
que também não fizeram nada.
Ao ler a notícia da morte do pequeno Heitor, meu peito encheu-se de
tristeza e dor. Quantas vezes eu, que sou cego, precisei de ajuda na rua e,
mesmo o local estando lotado, as pessoas fizeram de conta que não me ouviam?
Quantas vezes, numa parada de ônibus, pedi para alguém me informar quando meu
coletivo chegasse, e ninguém o fez?
Que a morte de Heitor sirva para tornar essa sociedade em que
vivemos mais humana.
E a você, mãe do Heitor, meu mais forte abraço e mais sinceros
sentimentos.
(*) Jornalista. Repórter do Núcleo de Opinião do jornal O POVO.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 11/09/23. Opinião, p.22.
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