quinta-feira, 26 de setembro de 2024

QUE CORAÇÃO, QUE CÉREBRO...

Por Tales de Sá Cavalcante (*)

Em um de seus chistes, Delfim Netto julgou o sedentarismo uma forma de prolongar a vida, ao afirmar: "A ginástica é uma das piores coisas para a sobrevivência. O coração tem um limite de batimentos cardíacos. Após atingi-lo, o músculo para. Sendo assim, atividades físicas que aumentam a frequência cardíaca, como a corrida, aumentam esse consumo e, portanto, encurtam a vida." Na madrugada de 12/08/24, o seu coração atingiu o limite.

Meu pai, Ari de Sá Cavalcante, tornou a Faculdade de Ciências Econômicas da UFC uma das melhores do Brasil; trouxe destaques da USP e um desses foi Delfim, considerado czar da economia brasileira de 1967 a 1974. Foi ministro de 3 presidentes e deputado federal durante 21 anos, inclusive, constituinte em 1988. A amizade entre anfitrião e convidado possibilitou-me perguntar a este por que FHC preferira Serra a Tasso para candidato a presidente pelo PSDB. A irônica resposta foi: "O Fernando sabia que o Tasso faria melhor que ele."

Delfim tinha grandes qualidades e também possuía defeitos, mas quem não os tem? O economista foi um dos signatários do AI-5, porém alegava que, à época, o ato era necessário, e não esperava que torturas e outras coisas ímpias viriam. Segundo Marcos Lisboa, "Pode-se discordar de Delfim. Pode-se criticar muitas de suas escolhas na vida pública. A ditadura foi deplorável. Em vários momentos, critiquei severamente opções de política econômica que ele defendeu com o maneirismo usual. Mas não se pode deixar de ler Delfim". E acrescenta: "Delfim tem o mérito adicional da prosa sinuosa, elegante e sutil. Sua crítica parece um truque de mágico. Convida-nos a olhar sua mão direita, quando a surpresa vem pela esquerda." E dizia, de acordo com a mídia, ter sido três: "o 1º, um socialista fabiano, adepto do movimento inglês surgido no século XIX e que defendia a implantação do socialismo por meio de reformas graduais. O 2º, o homem do governo militar. E o 3º, o que contribuiu no fim da vida com as políticas sociais dos primeiros governos Lula." Talvez os segredos de sua longevidade tenham sido "poupar" o coração e se reinventar até o fim, aos 96 anos.

(*) Reitor do FB UNI e Dir. Superintendente da Org. Educ. Farias Brito. Presidente da Academia Cearense de Letras.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 22/08/24. Opinião, p.20.


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