quarta-feira, 9 de outubro de 2024

A MORTE COMO POSSIBILIDADE DE VIDA

Por Valdester Cavalcante Pinto Jr. (*)

A morte é uma quimera: porque, enquanto eu existo, ela não existe; e, quando ela existe, eu já não existo. Epicuro

O transplante tem o poder de devolver a saúde por via da substituição de órgãos àqueles com doenças potencialmente fatais. Sua prática, porém, é limitada por escassez de doadores de órgãos adequados.

Na Europa, são 14 mil pacientes na lista de espera, mais de 110 mil nos EUA e 59.958 no Brasil. Nos EUA, 17 pessoas morrem todos os dias à espera de um transplante.

No Brasil, a necessidade estimada de transplantes é 38.787, tendo sido realizados 24.882, em 2023, défice de 35,8%. As notificações de potenciais doadores estão em 69,3 pmp e apenas 19,9 pmp são efetivados. 42% dos não efetivados foram pela recusa da família. Tomando como exemplo o transplante cardíaco, são efetivados apenas 2.1 pmp, quando o ideal seria 8 pmp.

É fundamental, portanto, transferir à sociedade informações sobre a importância do ato de doar e a influência deste na vida daquele que recebe - desenvolver a cultura de doar.

Ademais, otimizar a preservação dos órgãos aumenta o tempo de viabilidade de sua função, e melhorar a logística de captação diminui o tempo de isquemia do órgão, ensejando, dessa maneira, a utilização de doações em maiores distâncias. Já a destinação de órgãos de doadores continua sendo um dilema ético, não havendo consenso sobre o que constitui um sistema justo. Há uma tensão entre os princípios de alocação para favorecer os mais desfavorecidos, o que está conectado ao valor da equidade, e de maximizar os benefícios totais, situação ligada ao valor da utilidade.

Políticas públicas devem ser direcionadas por valores éticos que privilegiem a universalidade na atenção. Com efeito, é necessário melhorar o acesso para avaliação e indicação de transplante, aumentar o número de doadores efetivos e destinar os órgãos àqueles em estado mais grave, esperando há mais tempo, e que tenham as melhores chances de uma vida extensa e saudável após o transplante.

Eis o dilema no centro da discussão sobre a ética na distribuição de órgãos de doadores: alcançar o equilíbrio entre eficiência e equidade, ou entre utilidade e justiça?

(*) Médico cirurgião cardiovascular pediátrico.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 16/09/2024. Opinião. p.22.

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