O padre Gotardo Lemos, que morreu na semana passada, era
um dos professores da Universidade Estadual do Ceará (Uece) que venceram ação
contra o Estado desde 1996, mas ainda não receberam. A pendenga atravessou oito
mandatos de cinco governadores. Mais de mil professores seriam beneficiados,
mas 241 morreram a espera de que se concretize o direito que foi reconhecido
até no Supremo Tribunal Federal (STF).
Professores das universidades estaduais reivindicam
pagamento de piso estabelecido pelo decreto 18.292, de 1986, do então
governador Gonzaga Mota. Ao assumir o Executivo, em 1987, Tasso Jereissati
cancelou o decreto. Os docentes foram à Justiça do Trabalho e venceram. A
questão transitou em julgado em 1996.
Então, o governo foi ao Supremo Tribunal Federal (STF),
questionar a competência da Justiça do Trabalho para decidir a questão. Nova
derrota, confirmada em 2007, quando o governador era o hoje ministro da
Educação, Cid Gomes. Desde então, sucedem-se as iniciativas da Procuradoria
Geral do Estado (PGE) para postergar o pagamento.
A demora provocou situações constrangedoras, no mínimo,
para o Estado. Foram aplicadas multas por litigância de má-fé e recursos das
universidades chegaram a ficar bloqueados. Foi pedida, pela Justiça,
instauração de inquérito criminal pela Polícia Federal contra o
procurador-geral, o secretário do Planejamento e os três reitores, pela demora
em cumprir a decisão.
A juíza do Trabalho Christianne Fernandes Diógenes escreveu
que o governo “abusa do seu direito de defesa ao querer postergar para o dia
que nunca há de vir o cumprimento da obrigação de fazer”. A também juíza do
Trabalho Karla Yacy da Silva disse que “só resta à Justiça, para que a mesma
não fique desmoralizada, requisitar intervenção federal no ente estadual, por
reiteradas desobediências às ordens judiciais”, embora admita que a medida
seria extremamente controversa, por não ser tema pacífico no STF.
A essa altura, nem importa discutir se o piso de 1986 era
correto ou não. A Justiça deu sua palavra final. Há o aspecto humano, de
professores que tiveram direito reconhecido, mas não conseguem receber. Há o
Judiciário, que se desmoraliza pela decisão que não é cumprida. Mas há ainda o
problema criado para o próprio Estado.
O impacto da aplicação do teto é calculado pelos
professores em algo como R$ 4,65 milhões ao mês. Com o acumulado, já seria um
custo próximo de R$ 400 milhões. E que seguirá crescendo enquanto não for pago.
Há divergências sobre esse valor, mas já passa – há muitos anos – da hora de se
chegar a entendimento sobre o montante e começar a pagar ao menos daqui para
frente, para essa bola de neve não seguir crescendo. E que se negocie os
atrasados. A se continuar empurrando com a barriga, só crescerá uma bola de
neve que cairá na cabeça de algum governador.
Fonte: O Povo, Coluna Política, de 13/02/2015. p.18.
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