Confesso que fresquei! (II)
Chiquita
era a impecabilidade em primeira pessoa. Correção chegou ali e parou.
Detalhista, demais cuidadosa, esmerada, caprichosa, primorosa, irritantemente
perfeita; em muitos, dava arrelia tanta virtuose. Eu achava supimpa aquele
jeito imaculado de ser. Parecia incapaz de exalar o mínimo mal cheiro, de
adoecer, de cair, de quebrar, de falar de boca cheia. Uma sumidade.
Para
comprová-lo, vejamos o emblemático caso do carro de Chiquita - um gol 1988 com
cara de zerado, embora os 37 anos de estradas. Todo original ainda - bancos,
aros, toca-fitas, motor. Antes dos 5 mil km rodados, já o transporte na oficina
do Lérlis. Em 20 anos de revisões, o mecânico tinha pouco que fazer, apenas
trocava o óleo, completava a água no radiador, passava flanela, calibrava
pneus. Carro pegando que nem catarro na parede.
Até
que um fato botou abaixo a ideia de irrepreensibilidade de Chiquita: o dia em
que ela, que sempre ia sozinha à oficina, apareceu com o marido Joel, 50 e
poucos anos. Dia de revisão. Joel no gol, sentadinho feito "estauta".
Passados 30 minutos, a mulher se demorando em conversa com Lérlis. Rola ciúme.
Joel sai do carro e vai lá. O que vimos? Joel caxingando, tossindo, se coçando,
corpo encalombado, "tisgo", banguela, quengado...
O
mecânico, vendo a arrumação se arrastando, arquejando, lembrou desses anos
todos de perfectibilidade de sua cliente em relação ao carro bem cuidado e não
segurou o espanto:
-
AH! Agora eu sei por que o golzinho da senhora não dá prego!!!
Minha casa, minha rua
Numa
cidadezinha do interior, a vizinhança deu fé de que a belíssima residência de
Mané Coco, solitário morador do lugar há 15 anos, estava mal posta - avançava
metade da rua. A posição da edificação (alcunhada "Fiofó de calango")
chamava a atenção. Realmente estranho: a rua vinha normal, fluindo até a altura
do número 350; ao chegar ao "Solar do Mané", uma construção se lhe
cortava ao meio, restando 5 metros para a passagem de animais, bicicletas e
pedestres. Era o povo reclamando e Mané, nem aí.
-
Deixe esse magote de abestado 'falarem'!
-
Mas, seu Mané - refutava um amigo -, o povo tá em pé de guerra!
-
Se vexe não!
Após
denúncia anônima, o fiscal da Prefeitura vai ao local. Sem dúvida, a coisa
estava fora de esquadro. Frente a frente com Mané, o barnabé avisa que é multa
pesada se não rolar remoção. Calmamente, o ermitão pede ao servidor que espere
na sala, enquanto pega álbum de fotografias no quarto. E...
-
Meu fí dos outros, repare aqui essas fotos!
-
Sim, sua casa sendo construída... Ano: 2010.
-
Tem alguma rua aí?
-
Não! Só a casa do senhor, e mato ao redor.
-
Sou o primogênito da rua! O problema foi o corno dum engenheiro que, pra se
vingar dum cifre que botei nele, construiu uma rua na minha casa! Só fazer o
mal!
Lições para não morrer fácil
"Você
pode até bater as botas, mas papoca feliz!", garante o poeta dos cachorros
Jair Moraes, repassando três iniciativas que me farão chegar aos 100 (Jair
piorou do juízo!):
Evite
o estresse na cabeça do dedo, ouvindo 'os The Fíveres';
-
Crie formiga, esqueça as galinhas;
-
Tenha sempre uma ideia luminosa na cabeça e fuleragem muita no coração.
Por
fim, um post motivacional evangélico pra eu guardar: "Vá por mim: eu sou a
vereda, a categoria e as coisas! - disse Jesus, em cearensês, conforme li em
João 14:6".
Fonte: O POVO, de 23/05/2025. Coluna
“Crônicas”, de Tarcísio Matos. p.2.
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