Por
Romeu Duarte Junior (*)
Nunca fui muito de assistir a novelas, mas
concordo que, nos últimos tempos, algumas delas abandonaram o modelito
dramalhão mexicano para discutir as mazelas de Pindorama. Talvez a que mais
investiu no tema foi Vale Tudo, quem sabe, a melhor de todas já realizadas, tão
boa que ganhou até um recente remake. Sua primeira versão deu-se entre 1988 e
1989, com enredo do genial trio Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor
Bassères, e cunhou para sempre a imagem da maior vilã da teledramaturgia
nacional, a venenosa Odete Roitman, vivida pela magnífica Beatriz Segall, bem
como personagens inesquecíveis, qual a filha desta, a junky Heleninha,
encarnada pela correta Renata Sorrah. À época, o Brasil parava quando a Globo
punha no ar o teledrama, coisa de tirar o fôlego.
Sua complexa trama, capitaneada pela vil
Odete, envolvia arrogância, traições de todo tipo, ambição, preconceito e
discriminação com foco no povo brasileiro, que era considerado pelo núcleo
central da narrativa, um grupo bastante representativo da classe dominante
brazuca, como destinado ao fracasso por ser mestiço e, por este motivo,
indolente. A megera odiava o país e a sua população e se achava no direito de
cometer todo e qualquer tipo de crime para que seus interesses prevalecessem.
Claro, os alpinistas sociais também se faziam presentes no roteiro. No último
capítulo, os noveleiros com os olhos arregalados e as respirações suspensas, a
bruxa foi abatida a tiros por engano depois de praticar diversas modalidades de
delitos. Caiu o pano para a perversa.
Caiu o pano?! Caiu nada. Neste ano, a
novela foi reencenada, com Débora Bloch, a sempiterna Bete Balanço, no papel da
malvada e a roliça Paolla Oliveira interpretando a rebenta beberrona e
desajustada. Mais uma vez o Brasil teve que se olhar no espelho, situação
tornada mais tensa pelas criminosas ações executadas pelo (des)governo do hoje
réu e inelegível e a firme atuação do STF no exame das bandidagens e na dura
punição dos envolvidos. Mais uma vez a telinha se encheu com as idiossincrasias
da nossa cruel elite financeira, fazendo surgir uma nova geração de fãs, para
desespero dos pobres de direita, que devem ter odiado a narrativa. Nesta
versão, a biltre escapa da morte e, na cabine do helicóptero, fala blasé:
"Au revoir, Brasil, Odete Roitman sempre volta". Será?
Tal como acontece nos filmes de terror, em
que monstros da categoria de Freddy Krueger, Jason Vorhees e Michael Myers
nunca morrem e sempre retornam na película seguinte para dar rotineira
continuidade aos seus rosários de cruentos assassinatos, as víboras parecem não
perecer. Guindada a esse brilhante e ao mesmo tempo obscuro patamar da ribalta
da maldade, Odete Roitman desfila a sua vileza ao lado de colegas de ruindade
humana tais como as personagens interpretadas por atrizes do naipe de Anne
Baxter, Bette Davis e Joan Crawford. Seremos eternamente obrigados a conviver,
na cena e na vida real, com tal tipo de gente que se compraz com o sofrimento
alheio? Já se planeja um repeteco de Vale Tudo? Diz, Shakespeare: "O mundo
inteiro é um palco". Aí, baby, lascou.
(*) Arquiteto e
professor da UFC. Sócio do Instituto do Ceará. Colunista de O Povo.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 27/10/25. Vida & Arte. p.2.

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