Por Ricardo
Alcântara (*)
Preceito milenar do Oriente adverte: a nação perde o
respeito quando os governantes perdem a vergonha. O secretário Ciro Gomes não
honra os servidores estaduais de saúde com o exemplo mínimo de sua presença na
secretaria que comanda.
De seus deveres não, mas da vida alheia cuida bem: ontem,
em encontro da legenda de aluguel da qual faz parte, definiu (se o termo
atende) as posições da ex-ministra Marina Silva sobre o agronegócio como
“simpatiquinhas, mas mentirosas”.
À ex-ministra que ele agora aponta o dedo, sujo de raspar
em muitos tachos, coube o mérito de iniciar políticas públicas ambientais que
hoje rendem reconhecimento internacional ao governo para o qual ele oferece os
favores de sua vassalagem.
Logo, a “simpática” e “mentirosa”, quando fora investida de
responsabilidades públicas, prestou serviços cujas relevância e consistência
não pactuam com a pior versão que sempre cabe ao (eternamente licenciado)
secretário de Saúde simular.
Ele a acusa de “desconsiderar que o agronegócio paga a
conta do nosso país”. Não: o agronegócio paga, e paga bem, a conta desse modelo
que está aí, isto sim, porque quem paga a conta de um país é seu povo,
trabalhando muito e falando menos.
Com isso, o ultraconservadorismo dos porta-vozes Kátia
Abreu e Ronaldo Caiado recebe agora a providência de sua solidariedade a um
discurso que além de desonesto, com sua adesão passa a agregar o valor do seu
afamado oportunismo.
Alguma novidade? Até pouco tempo, o eternamente licenciado
secretário de Saúde rasgava elogios a Marina Silva. Fez o mesmo com Fernando
Henrique. Fez até com ACM, babalorixá de “tenebrosas transações”. Faz com
todos, ao sabor da ocasião.
Ciro Gomes ataca Marina Silva, a quem quase santificara em
outros momentos, porque ela se alia agora a quem lhe deu as contas, o
governador Eduardo Campos, e a quem ele tentara esmagar, a liderança do PSB
local de Sérgio e Eliane Novaes.
Melhor exemplo do oportunismo que aciona o instinto de
preservação de Ciro Gomes não há do que sua relação política com Lula, a quem
já definiu como “genial” e “idiota” diversas vezes, alternadamente, de acordo
com as obrigações conjunturais.
Quem queira fazer um julgamento isento das posições da Rede
Sustentabilidade, à qual Marina Silva deve obrigações programáticas, procure
conhecê-la naquilo que ela declara como compromisso e encontrará posições
diferentes do que foi dito.
Sem desconhecer a importância que o agronegócio tem para o
país, ali se pretende somente submetê-lo a uma agenda de sustentabilidade que
em nada transgride ao que é praticado nas nações mais desenvolvidas do espectro
democrático.
Saber da relevância com que o agronegócio participa dos
percentuais de crescimento não nos obriga a crer que ser a “fazendinha do mundo”
é o destino final do país, que precisa diversificar mais os acentos em que
apoia seu desenvolvimento.
Estranho, não? Aderido a uma sigla de aluguel, postado,
portanto, ao lado de quem faz da vida pública um balcão de negócios, Ciro Gomes
declarou seu “nojo” a Marina Silva e confessou “pavor” às suas ideias,
“superficiais” e “irresponsáveis”.
Observado sob a perspectiva do que milhares de brasileiros
foram às ruas revelar como suas aspirações cívicas, “nojo” tem a nação pelas
companhias de Ciro Gomes. E “pavor” ela confessa aos políticos que se
movimentam e se resolvem como ele.
(*) Jornalista e
escritor. Publicado In: Pauta Livre.
Pauta Livre
é cão
sem dono. Se gostou, passe adiante.
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