sexta-feira, 3 de março de 2023

Crônica: “Anoiteceu e não amanheceu” ... e outros causos

"Anoiteceu e não amanheceu"

Pro freguês ver como são as evoluções da vida. Um primo João de Vilbalba, da Guaiúba, viu o sobrinho Ricardo pela primeira e única vez quando o bruguela tinha tenros três meses de nascido, sem um dente ainda na boca, claro. E nunca mais se encontraram. Ricardo se fora de muda com a família para o Acre. O tempo passou. 

60 e poucos anos depois, João - agora oitentão, tornou a ver ex-bebê, que cresceu desleixado com a saúde bucal. Quedê dente em Ricardo pra uma dentada em naco de toicim? Perdeu-os cedo. Pois muito bem. "Ternanteontem", João tomou um susto quando disseram que aquele homão que lhe apresentaram na Guaiúba era ninguém menos que o dito sobrinho de tempos remotos. No ato, João se lembrou do pivete d'outrora, com seus tenros três meses de nascido, sem um dente. E exclamou sincero:

- Beisso, macho!?! Continua banguela! Sem um canino nessa boca de bode? 

O ridimunho do menino

O juízo de João de Vilaba é curtinho. Dizia a mãe dele - quiçá a ciência um dia comprove - que essa forma diferente de o filho querido ver o mundo tinha a ver com a "conformação da croa do quengo" dele. Ou melhor, com aquilo que muitos trazemos de nascença, o velho redemoinho, que conforme o @ulete Digital é a "mecha de cabelos, geralmente situada na parte superior da cabeça, em que os pelos crescem na direção contrária à dos demais circundantes, formando uma espiral que se destaca de modo bem evidente".

- Primeiro de tudo, não se pronuncia redemoinho. É "ridimunho" - informava a senhora mãe de João de Vilalba, dona Vilalba, quando viva.

- Certo. E o que tem a ver o ridimunho com o nível de "mentalidade pra mais ou ora menos" da pessoa? - indagou alguém.

- Com 01 (um) ridimunho, a pessoa é marrumeno mental. Com 02 (dois), é doida de pedra. Se tem 03 (três) ridimunhos, pode internar quando criar cabelo no sovaco!!! 

As mangas da Marlene

Conhecida por ostentar 02 (dois) "ridimunhos" na croa da cabeça, a colega acima citada, horas depois de haver chegado do sítio do Issac, começou a se sentir mal. Ainda na garagem, vômito de arranque, febre de café na hora, calafrio de ponto morto, reboco assustado (pele descamando). Já posta na alcova, tosse de cachorro brabo, diarreia em X, vontade de se lascar. E um desmaio apagativo pra coroar a lascação. Após manobras caseiras, alguém indica o hospital. 

Enquanto arrumam a doente em busca do Frotão, uns dizem que é dengue, outros que é covid. Teve quem suspeite de febre tifoide e até mau-olhado de revestrés. Fato é que a um quarteirão de casa, o marido perguntou, em insight que eu diria divino:

- Meu bebê comeu algo diferente no sítio de Isaac? Fala, criança!!!

- Tu num briga comigo não, amor, se eu te contar a verdade?

- Claro que não, vida!

- 35 mangas coité... Comi com casca e tudo! Sô ferroada por esse troço! 

O vizinho de Berlim

Mamãe ainda mora naquele condomínio de São Gerardo. Tem por vizinho, de uns meses pra cá, o Sr. Hans, alemão simpático. Sempre que cruza o caminho de mãe, no elevador, o "galego" ("lourão de quase três metros") a cumprimenta com indisfarçável gentileza. O conterrâneo do grande Johann Wolfgang von Goethe junta alemão com português e bodeja algo incompreensível. Para dona Terezinha, um "alemês engrolado". Dona Terezinha, muito falante, não aguentou e, solícita, confidenciou a Hans:

- O senhor resmunga tão lindo, seu menino!

Fonte: O POVO, de 10/02/2023. Coluna “Crônicas”, de Tarcísio Matos. p.2.

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