quinta-feira, 18 de setembro de 2025

MAS QUE TUDO É VOLTAR PARA CASA

Por Patrícia Soares de Sá Cavalcante (*)

Quando viajo, gosto de observar as pessoas, especialmente as nativas: o que elas fazem, o comportamento, se são mais amáveis ou reservadas, como se comunicam. Agora, em julho, fui para a Itália. No início, tudo é — de certa forma — estrangeiro. A começar pela língua. Achei curioso, e até divertido, o fato de a palavra prego ser utilizada em múltiplos contextos. Pode significar “obrigada”, “de nada”, “com licença”, “está tudo bem”, “que bom”! Tudo depende da entonação da voz e da gesticulação. Um prego vai sempre bem.

Já um pouco familiarizada com a região, num passeio no final da tarde, tomando sorvete, detive minha atenção nos pássaros que ali estavam. Eles não pareciam estar de passagem, fazendo uma viagem mais longa, como a minha. Estavam à vontade. Pareciam conhecer intimamente o lugar. Lá era a casa deles.

Senti-me como nos filmes infantis em que observamos, com riqueza de detalhes, a vida dos animais. Brancos, de porte médio, com o bico pontiagudo. Espalhavam-se pela vila, pelo mar, pelas ruas. Brincavam uns com os outros e admiravam o pôr do sol. Às vezes, ficavam calmos, contemplando o mar. De repente, voavam. Livres.

E foi no meio daquela novidade, de tantas experiências diferentes das que vivo no meu cotidiano, que comecei a perceber o que era meu — na verdade, nosso — ali na Itália. Enquanto assistia a um pianista tocar à beira-mar músicas belíssimas, meu ouvido reconheceu os primeiros acordes de “Mas, que nada”, interpretada por Jorge Ben Jor. Mas que nada não, Jorge. "Um samba como esse tão legal!" Mas, que tudo! Que beleza de música! Estou em casa?

Mimo do céu. Foram inúmeros os que vi. Uma florzinha lilás, bem pequena. Havia um canteiro na casa onde nasci, cresci e teci meus primeiros e mais sólidos laços. Ela foi meu lar por mais de vinte anos. Sinto saudades dela. Não sei quando vi um mimo do céu pela última vez. A Itália me trouxe a minha casa de volta.

Por mais fascinante que seja o destino, o melhor de uma viagem é voltar. Voltar para casa. E sentir-se nela, como aqueles pássaros, numa relação íntima com o próprio lugar — seja ele onde for.

(*) Médica psiquiatra.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 12/08/2025. Opinião. p.16.

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