terça-feira, 12 de novembro de 2013

A LOROTA DA GOVERNABILIDADE



Por Ricardo Alcântara (*)
Se a primeira vítima de uma guerra é a verdade e certo for pensar que a política a realiza por outros meios, correto seria concluir que também ela, a política, vitima frequentemente a verdade em função dos interesses e paixões que a movem, não?
Uma mistificação é preciso denunciar, mesmo ao custo de suportar a ira de quem tem o seu arado atado às reses do poder e a ele se curva como um servo, incapaz de pensar sem pedir licença a alguém. Paciência, meu filho: cedo me perdi da manada.
Como não trago no couro a marca de nenhum senhor, escrevo com lealdade apenas a quem me dedica a atenção de sua leitura, algo incômodo em tempos de farta capatazia, unanimidades burras e licenciosas resignações. Prefiro morar no pasto.
Por inanição teórica ou miopia passional, quando não por negligência moral ou, até, a acumulação nociva dos fatores, é servil defender a rendição do Lulismo ao fisiologismo extremo como uma fatalidade, inevitável à “governabilidade”.
Claro, todo governo precisa construir – melhor e pior qualidade da democracia – maioria parlamentar para garantir aprovação àquilo que em seu programa seja fundamental no atendimento ao compromisso firmado com a nação. Isso ou o caos.
Mas o imperativo institucional não esgota todas as responsabilidades: ao contrário, reclama ainda maior capacidade de liderança. Trata-se, então, de definir um limite a partir do qual o pacto é depreciativo porque, daí em diante, quem ganha, perde.
E perde porque submete seu patrimônio político – legado por sangue, suor e lágrimas – a contradições corrosivas à sua representatividade sem que com isto obtenha os ganhos qualitativos que justifiquem o sacrifício de sua deterioração.
Partido de massa cresce na perspectiva do poder, mas como numa democracia o exercício do poder é alternado, ele não deveria se distanciar das ruas ao ponto de com ela perder a sintonia por inteiro, como se viu nas mobilizações recentes.
É aquela sintonia que garante às suas lideranças a capacidade de acioná-la quando as pressões internas de um pacto de qualidade política precária ameaçam comprometer sua hegemonia com afrontas às expectativas centrais da nação.
Não se trata, portanto, de um “purismo despolitizado” – rótulo que denuncia mais a inconsistência de quem defende o indefensável do que as supostas fragilidades da denúncia – mas de compreender que a democracia precisa ser democratizada.
Estreitar os compromissos da representação é necessidade maior do interesse popular porque ao Capital não é indispensável, a democracia, para preservar os mecanismos que garantem a continuidade das relações sociais vigentes.
Daí que o erro político do Lulismo foi ter abdicado da mobilização popular como forma de pressão constante sobre um sistema representativo precário para dele extrair decisões mais efetivas para as soluções dos graves problemas sociais.
Tal desafio transcende em muito questões de Emprego e Renda, igualmente relevantes e para as quais os governos petistas deram respostas de alcance inquestionável. Isto é só o começo. Mas no começo, é o que parece, nos perdemos.
Digo “nos perdemos” porque um projeto que se pretende reformista – é de sua própria definição – retrocede quando para de avançar: o fim do governo Dilma já se aproxima sem dar a conhecer notícia de nenhum avanço significativo.
Tudo que aí está, lá já estava quando, então ex-presidente, Lula voltou para São Bernardo: pleno emprego, crédito popular, Bolsa família. Desde então, generaliza-se o sentimento de que paramos de avançar e foi a isto que as ruas reagiram.
Assim, quando vejo o Lula reclamar por reforma política, cá pergunto eu, como seu eleitor que tantas vezes fui, por que não mobilizou ele a sua base popular com este fim quando presidente de larga popularidade? Se a conta não for dele, é de quem?
E se de Lula ainda cobramos isto, agradecidos deveriam ficar seus seguidores: se reconhece nele assim alguma atualidade porque, na roda da história, chega para qualquer líder – todos, sem exceção – o dia em que dele o povo já não espera nada.
PS: E agora, professor Moacir Tavares, o senhor entendeu ou quer que eu desenhe?
(*) Jornalista e escritor. Publicado In: Pauta Livre.
Pauta Livre é cão sem dono. Se gostou, passe adiante.

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