Meraldo Zisman (*)
Médico-Psicoterapeuta
Discurso de psicóloga no "Domingão do
Faustão" deixa mães de autistas e especialistas indignados, é o que
estampa a primeira folha do meu provedor UOL no dia 20.12.12. Como professor de
pediatria e hebiatra (médico de adolescentes, jovens) há quase 55 anos e atualmente praticando psicoterapia,
fiquei tremendamente revoltado, triste e desesperançado com a entrevista e o
programa escolhido para esclarecimentos das diversas síndromes de sofrimento
mental que podem ocorrer no ser humano
e sua influência no crime coletivo cometido na escola primária Sandy Hook, em Newtown,
Connecticut, nos Estados Unidos.
E surgiram absurdas explicações do porquê da tragédia
ocorrida na pequena cidade norte americana. Como simples ser humano, fico de
luto pelo trágico acontecimento, mas as coisas podem sempre piorar. Certamente
o bom jornalismo saberia como, onde e quando abrir uma discussão sobre assunto
de tamanha importância. Critico a mídia, qualquer que seja ela, quando convida
“especialista” que, salvo as clássicas exceções à regra, estão geralmente
correndo em busca dos seus 15 minutos de glória, sem se importar com a higiene
mental e social do povo que pagou seus estudos.
Quanto mais importante for uma emissora, ou coisa que
o valha, deveria ter muito mais cuidado ao divulgar temas controversos,
principalmente num país onde a novela passou a ser o maior difusor de
conhecimento, através de uma dramaturgia distorcida, disforme (repito, salvo
raras ressalvas).
Onde estão os Conselhos de Medicina, Psicologia para
se manifestarem sobre esse mau jornalismo? E o pior, são esses pobres peritos
profissionais (fora alguns casos isolados) que não perdem uma oportunidade de
comparecer a esses programas, debates midiáticos...
Quando teremos os fatos mais bem estudados e mais bem
anunciados? Os Psiquiatras falam de síndrome de Asperguer, Psicopatias, Autismo, e entram por aí em uma discussão
sem fim, pois nem sabem o que é.
A Medicina é a ciência das verdades transitórias. E
toca a surgirem programas e artigos no éter sobre autistas, psicopatas e
assassinatos em massa.
Bastaria fazer uma pergunta à nossa massa semianalfabeta para
constatar qual o gênero de filme preferido e típico do americano do norte: o
faroeste, com a presença do indefectível caubói.
Aí está a origem – remota, mas básica – da tragédia
ocorrida na pequena cidade dos USA. Apesar de em nossa história termos também
colonos europeus matando índios, assim como a escravidão negra, o - desculpem o
termo difícil — psicossocial brasileiro é bem diferente daquele dos americanos
do norte. As nossas armas não são vendidas em lojas de departamentos e sim
contrabandeadas do Paraguai.
Para que entrar no terreno movediço da psicopatologia?
Será uma tentativa de intelectualizar a miséria na qual vive a maioria de nosso
povo ou um desejo incontrolável de aparecer na mídia?
O meu temor é que a cultura do narcisismo, do consumo
e da violência tenha contaminado nossos psicólogos, psiquiatras, assistentes
sociais, enfermeiras e outros profissionais assemelhados... É apenas uma
advertência de um velho médico.
(*) Professor Titular da Pediatria da Universidade de Pernambuco.
Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União Brasileira de Escritores (UBE)
e da Academia Brasileira de Escritores Médicos (ABRAMES).
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