Por Patrícia Soares de Sá Cavalcante (*)
Tinha o hábito de, ao sair da escola com
meus meninos e minha sobrinha, parar em um canteiro para pegar florzinhas. Eles
enchiam os bolsos da farda e chegavam em casa tão alegres, distribuindo ternura
para quem estivesse por perto, que o meu conflito sobre se era um erro diminuir
as flores do canteiro amenizava.
Certa vez, estava apressada e não fizemos o
que era de costume. A Marina logo disse:
- Mamãe, e as florzinhas?
- Minha filha, hoje não vai dar tempo.
Um pranto inconsolável começou. No carro,
fui tentando acalmá-la. No começo, achei que podia ser birra, mas era um choro
tão sofrido, daqueles que apertam o coração de qualquer mãe. Com os olhinhos
vermelhos e marejados, ela disparou:
- Eu quero a Sara!
A Sara, prima-irmã, tinha ido recentemente
morar em São Paulo. Meu Deus, como é que logo naquele dia não parei para pegar
as flores? Já estava na Padre Antônio Tomás quando avistei as mesmas flores no
canteiro central. Sem pensar, no sinal vermelho, rapidamente abri a porta e
colhi às pressas, sem culpa, um ramalhete enorme.
- Pronto, meu amor, aqui estão.
Pois bem, lembrei esse episódio ao ler, há
poucos dias, um texto do Freud. Ele descreve sua surpresa diante de um amigo
poeta que não conseguia extrair alegria da beleza das flores. "Tudo aquilo
que, em outra circunstância, ele teria amado ou admirado, pareceu-lhe despojado
de valor por estar fadado à extinção. A questão é que, diante da efemeridade do
que é belo, o valor de toda essa perfeição é determinado somente por sua
significação para nossa própria vida emocional, não precisa sobreviver a nós;
independe, portanto, da duração absoluta."
Aos meus olhos, as flores são belas,
delicadas e, mesmo que durem poucos dias, não deixo de me surpreender e me
encantar com o desabrochar de uma delas. Em uma quadra singela e profunda, Fernando
Pessoa escreveu: "Dizem que as flores são todas palavras que a terra
diz." Para mim, uma dessas palavras que a natureza nos oferece é saudade.
E, quando vejo a felicidade das meninas em cada reencontro, eu me emociono e
lembro que, mesmo em sua transitoriedade, as flores têm uma capacidade enorme
de renascer, muitas vezes, em um solo mais fértil.
(*) Médica
psiquiatra.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 17/06/2025. Opinião. p.16.
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