Por Tales de Sá Cavalcante (*)
Na década de 50, minha mãe, Hildete, e meu
pai, Ari, iniciaram a edificação da casa de seu sítio ao mesmo tempo que seu
vizinho começava a sua. Os imóveis situam-se às margens da bucólica lagoa tão
enaltecida por José de Alencar em "Iracema". Descreve o autor em sua
ficção que Messejana tem o significado de "lagoa abandonada", onde se
deu o abandono de Iracema por Martim.
Ali meu pai e seu vizinho, em vez de
abandonarem o próximo, resolveram unir-se. Construíram uma cacimba circular
dividida ao meio pelo muro que, se fosse uma linha reta, seria o diâmetro. Com
uso esporádico, a água poderia ser repartida. Será que hoje 2 confinantes
concordariam em usar o mesmo poço? Talvez não adotassem o lema dos 3
mosqueteiros de Alexandre Dumas, pai. E então qualquer um seguiria por si e
mais ninguém.
Que o exemplo da cacimba nos estimule a
conseguir, possuir e preservar amigos, atitudes que inclusive proporcionam boa
saúde física, mental e emocional. Renunciemos, portanto, ao egoísmo motivado
por fatores vários dos novos tempos, principalmente o uso de celular. Como
experiência, sugiro ao leitor que, quando em um restaurante, conte em cada mesa
o número de pessoas que dialogam entre si e quantas preferem o múltiplo uso do
telefone móvel ao desprezarem quem está a seu lado.
A maior vivência em coletividade traria paz
e, por consequência, menos violência ao nosso país, e assim nos aproximaríamos
do nível de Weggis, na Suíça. Nessa pequena cidade, a seleção brasileira
concentrou-se antes da Copa do Mundo de 2006, na Alemanha. Lá, "a única
delegacia policial existente só abria duas vezes por semana, e seu prefeito, à
época, não lembrava quando aconteceu o último crime".
Hoje, a mídia diz não haver registro de
crimes na história da cidade. "E a delegacia, um pequeno escritório, abre
três vezes na semana. Quem quiser reclamar algo, preenche um formulário e
coloca numa caixa de correio." Chegaremos a esse grau? Que tal seguir o
indígena que treinava para sua flecha alcançar a Lua? Nunca alcançou, porém era
a que ia mais longe.
(*) Reitor do FB UNI e
Dir. Superintendente da Org. Educ. Farias Brito. Presidente da Academia
Cearense de Letras.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 26/06/25. Opinião, p.18.
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