terça-feira, 2 de dezembro de 2025

FRONTEIRAS CULTURAIS: o imaginário do interior cearense

Por Vladimir Spinelli Chagas (*)

Dentre as muitas riquezas do Ceará, a literatura oral tem uma enorme relevância, pela tradição rica em mestres do improviso e da narrativa, como os nossos contadores de história, cordelistas, repentistas e as benzedeiras e parteiras.

Para além de artistas, esses personagens são os guardiões do nosso patrimônio imaterial, da memória coletiva e da identidade regional, em contraste a um mundo cada vez mais voltado para as telas dos computadores e dos celulares.

Quando se perde um desses guardiões, parte dessas riquezas também é perdida, com exceção daquelas que tenham sido gravadas, escritas, ensinadas. Mesmo nessas, há uma perda com relação à performance, pois o tom de voz, os gestos e o contato direto nunca podem ser repostos.

Os nossos repentistas, têm uma habilidade rara de criar versos sob pressão, totalmente conectados com temas atuais ou do passado e a responder a motes complexos, mesmo assim respeitando a métrica e as rimas e criando um ambiente único.

Já nossos cordelistas fazem o elo entre o oral e o escrito, popularizando a literatura e a história contada, com temas que despertem a atenção do povo, levando à venda dos respectivos cordéis, impressos de forma artesanal e comercializados normalmente em feiras do interior.

Quanto às benzedeiras e parteiras, estas carregam também saberes dos seus ancestrais, que são repassados por gerações, incluindo rezas, orações e curas, em rituais carregados de fé e tradição.

O Ceará tem buscado preservar esses saberes, como é exemplo o projeto que instituiu o Programa de Mestres da Cultura, que além do incentivo à difusão e fortalecimento das tradições, apoia financeiramente esses guardiões, para que possam melhor se dedicar à sua arte.

As instituições cearenses, de uma forma geral, devem juntar esforços no sentido de ampliar essas iniciativas, para que nomes como o poeta Patativa do Assaré, o cordelista Arievaldo Viana, o repentista Geraldo Amâncio, a contadora de histórias, Mestra Zulene Galdino e a benzedeira, Mestra Margarida Guerreira permaneçam vivos, mostrando que a literatura oral cearense é um manancial de poesia, fé e memória.

(*) Professor aposentado da Uece, membro da Academia Cearense de Administração (Acad) e conselheiro do CRA-CE. Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Fortaleza.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 3/11/25. Opinião. p.22.


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