quarta-feira, 10 de maio de 2023

PREMATURIDADE MÉDICA 2

Por José Lima de Carvalho Rocha (*)

Em abril de 2021, publiquei “Prematuridade Médica “pela primeira vez. Espero que nossa comunidade entenda o risco que corremos, quando a má-formação médica é estimulada.

Nesta segunda versão, atualizada, volto ao mesmo tema.

Os cursos de Medicina no Brasil formam médicos generalistas que devem possuir conhecimento teórico e prático nas cinco áreas básicas: Pediatria, Ginecologia e Obstetrícia, Clínica Médica, Clínica Cirúrgica e Medicina de Família e Comunidade.

Em grande emergência na saúde pública, existe a necessidade de médicos, muitos médicos, que necessitam ser muito bem formados, pois a má-formação profissional em saúde leva a diagnósticos errados e a tratamentos desastrosos.

O Código de Ética Médica autoriza que médicos exerçam a profissão com autonomia. A responsabilidade final é do médico. Diante de várias opiniões divergentes, o bem formado saberá escolher o correto tratamento. Ao ser graduado, o profissional tem total autonomia para estabelecer qualquer diagnóstico e tratamento em todas as especialidades, mesmo que ele ainda não tenha o título de especialista. Por exemplo, recém-formados podem, legalmente, realizar neurocirurgia, caso exista hospital que os aceite.

As residências médicas formam o especialista; no entanto, na residência de Psiquiatria, por exemplo, médicos não apreenderão nem praticarão conceitos de Pediatria ou de Cardiologia. Caso não tenham apreendido essas áreas na graduação, não apreenderão na residência.

Formação cronologicamente antecipada leva, necessariamente, a uma formação incompleta.

Há 50 anos, o curso médico é desenvolvido em seis anos, não menos do que seis anos. Nestes 50 anos, a educação médica muito evoluiu. Hoje, os estudantes precisam apreender maior quantidade de conteúdos, precisam desenvolver novas habilidades e competências quando comparados a estudantes da década de 1960. Todas as habilidades e competências do curso médico necessitam de práticas e de tempo para a sua devida assimilação. Assim, no meio médico, já foi discutida a necessidade de que o curso tenha a duração mínima de sete ou oito anos; porém, por vários motivos, não foi possível sua concretização.

Por outro lado, existem pessoas que defendem que o curso de Medicina seja concluído em menos de seis anos. Frequentemente, pedem o posicionamento do Poder Judiciário para esse fim.

A fim de formar médicos em menor prazo, faz-se necessário retirar conteúdos e práticas. Então, que área médica deve ser sacrificada? Pediatria? Cirurgia? Clínica? Outra? Entendo que essa escolha não pertence apenas aos médicos ou aos educadores médicos. Representantes do nosso povo precisam participar da decisão que necessita estar fundamentada na qualidade do médico necessário à nossa sociedade.

Durante as últimas décadas, estudantes de medicina tentaram, de várias maneiras, antecipar sua graduação. É um ímpeto estudantil o desejo de, antecipadamente, exercer a profissão “ser doutor”. Entretanto, compete aos cursos médicos zelar pela qualidade da formação de seus egressos. Não é possível aceitar que qualquer estudante venha a se tornar um mau médico. As consequências são terríveis e já conhecidas por nossa população.

Os cursos médicos recebem alunos egressos do ensino médio com diferentes condições acadêmicas. Os professores conhecem essa situação. O curso é desenvolvido considerando o nível dos ingressantes, pois alguns estudantes apresentam deficiências e outros não.  Existem cursos que recebem quase todos os alunos com deficiências.

As consequências que existirão no desenvolvimento da matriz curricular são inevitáveis, pois, ao final dos seis anos, o curso precisa entregar à sociedade médicos que exerçam a profissão com grande qualidade, independentemente de como os alunos chegaram ao curso superior. Cursos que recebem alunos que não tiveram bom desempenho no ensino médio necessitam ter maior dedicação a seus alunos e, por parte deles, maior dedicação à aprendizagem.

O esforço institucional, envolvendo alunos, professores e coordenadores, leva a que, na Unichristus, nossos alunos consigam obter aprovação, desde 2012, em concursos antes mesmo de completar os seis anos obrigatórios para a duração do curso. A aprovação não implica que o aluno já tenha domínio das competências, atitudes e habilidades necessárias ao exercício ético e técnico da profissão médica.

O Brasil necessita de excelentes médicos, especialmente para os mais carentes; por essa razão, precisamos de excelentes cursos médicos. Seguindo todas as leis e portarias, as instituições de ensino precisam ter liberdade para trabalhar. Entregaremos, assim, para a sociedade, egressos com as competências fundamentais nas áreas básicas da saúde, atendendo, dessa maneira, às principais necessidades dos pacientes.

(*) Reitor da Unichristus. Membro da Sobrames/CE e da Academia Cearense de Médicos Escritores.

Fonte: Publicado na home page da Unichristus em 5/4/2023 e no jornal O Povo de 6/4/2023. p.16.


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