sexta-feira, 5 de abril de 2024

Crônica: “E assim sucessivamente sem cessar!” ... e outros causos

E assim sucessivamente sem cessar!

Quem entendia de som na cidade? Jotinha, também motorista da ambulância, do trator e do ônibus escolar. E era preciso preparar pra já o palco que receberá grande comício político, até o governador vem. Enfim, tudo pronto. Ou quase. O prefeito, organizador do ato, dá pela falta de uma bateria (de carro) para alimentar engrenagens do som. Lá em cima, autoridades coçando o gogó. Mas, quedê bateria? Só havia uma saída:

- Jotinha! Corra, pegue a bateria da ambulância e bote aqui! - ordenou o gestor municipal.

- Doutor, se rolar urgência e eu precisar usar a ambulância?

- Tenha fé! Hoje aqui ninguém se engasga nem cai no cacimbão, corações não pifarão!

De fato, as preces foram ouvidas; o comício, um espetáculo. Dia seguinte, porém, ambulância no prego - bateria descarregada, claro. E a sogra do prefeito precisou ser levada às pressas pro Frotão, em Fortaleza. Prefeito só via uma saída:

- Jotinha! Corra, pegue a bateria do trator e bote aqui! - reordenou.

- Doutor, e se bater urgência e um agricultor precisar virar um lote de terra?

- Tenha fé! Chuva que é bom, esse ano, nem pra fazer um chá!

Uma vez bate-fofo, sempre furão

Chico Ambrósio é a graça dele. A última: faltou ao velório do melhor amigo. A desculpa dele, então, pasme! Certamente que qualquer de nós pode faltar a compromissos, imprevistos acontecem. Mas, com ele, a coisa assume proporções escandalosas. O amigão, Joaquim, morreu agora, em 5 de janeiro, e Chico não deu as caras na vigília do defunto. A viúva ligou, dois dias, convidando para a missa de sétimo dia. Chico...

- E o enterro não é lá pro final de maio?!?

Uma pérola do amigo Sávio Pinheiro

Na cidade de Cedro foi preso o filho de um ilustre morador, detentor de muitas posses. Como é de se separar em todo interior que se preze, formou-se logo aquela roda de curiosos em frente à delegacia. Lá dentro, junto ao adolescente infrator, estavam o delegado e o Juiz de Direito. Enquanto o Delegado relatava ao Juiz o ilícito cometido pelo jovem, a todo instante se ouvia, do meio da multidão, uma voz que se insurgia e colocava em dúvida a autoridade do Magistrado:

- Aposto que esse aí não dorme hoje nessa delegacia!

Desde que ouviu tal afirmação, o Juiz se plantara nas venezianas para identificar o autor da insinuação caluniosa, que ia de encontro à moral do administrador da justiça, como se ele não tivesse autoridade suficiente para "segurar" o filho do endinheirado local. Decorrido algum tempo, ouviu-se novamente o ultraje disparado da multidão.

- Aposto que esse aí não dorme nessa delegacia!

Depois de vociferar várias vezes a dita ofensa, o Juiz conseguiu localizar o autor e deu-lhe voz de prisão. "Caba safado! Teje preso!"

- Tá pensando que não tenho autoridade pra prender qualquer um que ultrapasse os limites da lei? Pois fique sabendo que agora você vai fazer companhia ao detido!!!

O sujeito ofensor, então, perguntou:

- Mas, por que o senhor vai me prender, se eu não disse nada que lhe desrespeitasse?

- Como não, cabra safado! - retrucou o homem da Lei. - Você tava, a toda hora, dizendo que esse meliante aqui não iria dormir na delegacia hoje!

Nessa hora, o gozador repete, senhor de si:

- E não vai dormir mesmo não, ora, ora! Com o tanto de muriçoca que tem aqui, doutor, não tem ser humano nenhum que consiga!

Fonte: O POVO, de 23/02/2024. Coluna “Crônicas”, de Tarcísio Matos. p.2.

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