Meraldo Zisman (*)
Médico-Psicoterapeuta
O
objetivo da epidemiologia é reduzir os problemas de saúde da população. Na
prática, ela estuda principalmente a ausência de saúde sob as formas de doenças
ou agravos. É também importante não confundir endemia com epidemia. Quando uma
enfermidade existe somente numa região, é considerada uma endemia; quando se
difunde para outros lugares, atingindo mais de uma cidade, uma região ou todo o
país, chamamo-la de epidemia e quando se alastra pelo mundo é considerada uma
pandemia.
Vale
comentar os propalados direitos humanos, cujos defensores esquecem que cada ser
humano é singular, tanto biológica quanto psiquicamente, e ainda que a ordem
por eles defendida permite apenas melhorar a organização da sociedade, não
reformá-la. A maioria da população crê nos políticos e nas instituições. Se não
acreditassem nos direitos humanos, a sociedade não seria viável. Para a
filósofa Hannah Arendt (1906 -1975) os direitos humanos não são um dado, mas um
constructo, uma invenção humana, em constante processo de edificação e
reconstrução. Com isso não desejo afirmar, e me acastelo, que os sistemas
jurídicos internacionais são válidos para todos os lugares ou deveriam sê-lo,
mesmo que teoricamente.
Os
conceitos ligados aos direitos humanos refletem uma construção axiológica,
erguida a partir de um espaço simbólico de luta e ação social, compondo uma
racionalidade de resistência na medida em que traduzem processos que abrem e
consolidam espaços para a dignidade humana. Invocam, nesse sentido, uma
plataforma emancipatória voltada à proteção da dignidade humana.
Os
direitos humanos são um organismo consciente que visa a assegurar a dignidade e
a evitar sofrimentos em face da persistente brutalidade humana. Considerando a
historicidade dos direitos, destaca-se a chamada concepção contemporânea de
direitos humanos, expressa em dois documentos: a Declaração Universal de 1948 e
a Declaração de Direitos Humanos de Viena de 1993.
Referindo-se
ao dedo-duro, denunciante, o escritor francês Jules Romains (1885-1972) diz:
“as vocações de delator abundam na espécie humana”. Imagine agora quando
premiada!?
Como
médico e cidadão pergunto:
— Qual o
impacto psicológico de anos de notícias negativas na vida de um país? Como
afetam a saúde mental da população? Não chego a dizer que os brasileiros são os
que mais sofrem com a ansiedade, apesar de a Organização Mundial da Saúde (OMS)
afirmar que somos os que mais sofremos de transtornos de ansiedade, no mundo.
Na verdade, os dados alarmantes sobre a situação mental no país apontam que
23,9% da população apresenta algum tipo de transtorno de ansiedade.
Deixando
de lado as estatísticas, lembro que nosso país atravessa uma grande crise, o
que por si só cria ansiedade. Atribuir aos meios de comunicação a origem dessa
crise é simplificar demais. Culpar a mídia isoladamente é ingênuo, para não
dizer algo mais grave sobre essa epidemia de ansiedade.
Contudo,
apesar de entender plenamente que a mídia brasileira deva estar vinculada aos
problemas do país e os abordar a partir da perspectiva nacional, a mídia não
deveria ser porta-voz da cultura punitiva que hoje domina todos os setores da
vida nacional. Medo, ódio, revolta ou desejo de vingança é o que não tem
faltado no cenário sociopolítico brasileiro, gênese da ansiedade.
Creio que
o suicídio de pessoas comuns, desempregadas, sem importância midiática, o
aumento do consumo de ansiolíticos e a depressão generalizada deveriam ser mais
bem acautelados. Não sou eu quem o diz: ‘Não são as notícias que fazem o
jornal, e sim o jornal que faz as notícias; a questão é que os jornais não são
feitos para divulgar, mas para encobrir as notícias’. Livro: Número Zero, de
Umberto Eco. Ed. Record, página 57;162, ano: 2015.
Será que
estamos sendo expostos a notícias ‘selecionadas’, que propositadamente provocam
maior ansiedade?
Será?
(*) Professor Titular da Pediatria
da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União
Brasileira de Escritores (UBE) e da Academia Brasileira de Escritores Médicos
(ABRAMES). Consultante
Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha).
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