Por Alexandre Sobreira Cialdini (*)
Nos últimos 20
anos, o acesso à internet nas residências brasileiras saltou de 13% para 85%.
Esse avanço acelerado da conectividade impulsionou a formação de modelos de
negócios inovadores, que influenciam diretamente a economia e exigem novos
arranjos fiscais. No Brasil, essas mudanças foram regulamentadas pela Emenda
Constitucional 132/2023, que redefiniu o sistema tributário nacional.
Muito além das
restritas questões fiscais, um novo sistema tributário impõe uma discussão
geoeconômica sobre os caminhos do desenvolvimento. Trata-se de um momento que
demanda ação planejada, abrangente e sistêmica, ao mesmo tempo em que
representa uma oportunidade estratégica para o crescimento econômico.
A difusão rápida
e ampla da informação pela internet faz com que a comercialização de produtos e
serviços assuma diferentes e desafiadoras feições. Basta observar as
transformações globais ligadas à computação em nuvem, moedas virtuais,
impressão 3D, robótica, economia compartilhada e colaborativa, data centers,
cabos submarinos e logística de transportes, incluindo os portos secos. Esses
fenômenos desafiam os países a adaptarem suas estruturas tributárias à nova
realidade digital.
Não foi por acaso
que o Plano de Ação do Projeto BEPS (Base Erosion and Profit Shifting ou Erosão
da Base Tributável e Transferência de Lucros, em tradução livre para o
português) foi coordenado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE). O principal objetivo desse projeto foi estudar medidas de
combate à evasão e à elisão fiscal por meio da transferência artificial de
lucros para países com baixa tributação.
A iniciativa
contou com a participação não apenas dos países-membros da OCDE, mas também de
países do Grupo dos 20 (G20), do qual o Brasil faz parte. Intitulado
"Economia Digital", o plano abordou a questão das empresas com
presença digital significativa em determinados países, mas que não estavam
sujeitas à tributação doméstica devido à falta de elementos de conexão capazes
de regulamentar a incidência tributária.
O instrumento
multilateral publicado pela OCDE no âmbito do BEPS recomenda a inclusão de
regras antiabuso nos tratados internacionais, aplicáveis aos Estabelecimentos
Permanentes (EPs) situados em jurisdições terceiras, frequentemente utilizados
para evitar a tributação por meio dos métodos de isenção ou imputação previstos
nos tratados entre os países envolvidos.
Sem adentrar nas
questões relacionadas à tributação indireta, nosso alerta neste artigo é para
ratificar a correlação e plena convergência entre tributação, desenvolvimento e
transformação digital. A análise do conceito de Estabelecimento Permanente, as diretrizes
do relatório Tax Challenges Arising from Digitalization - Interim Report (2018)
e a recente proposta de Diretiva Europeia evidenciam os riscos e oportunidades
da revisão dos atuais critérios de fonte e residência. A nova dinâmica da
economia digital sugere a necessidade de considerar o mercado consumidor como
elemento de conexão na tributação internacional.
O que estamos
considerando é que a reforma tributária não se limita à mudança de um regime de
recolhimento e de recomposição de tributos sobre o consumo. Trata-se da
construção de um novo modelo que impulsiona tanto o consumo quanto a produção
tecnológica. Nesse sentido, deve ser vista como uma questão de Estado, em que
governos precisam interagir com seus players (estados, municípios,
contribuintes, consultores e organizações internacionais), todos desafiados a
repensar e operar em uma nova ordem econômica internacional no âmbito
tributário, agindo de forma sistêmica com as áreas do desenvolvimento
econômico.
(*) Mestre em
Economia e doutor em Administração Pública e Secretário de Finanças e
Planejamento do Eusébio-Ceará.
Fonte: O Povo, de 6/03/25. Opinião. p.19.
Nenhum comentário:
Postar um comentário