Meraldo Zisman (*)
Médico-Psicoterapeuta
A sociedade, como tudo que a envolve -
crianças, adolescentes, cultura, sexo e religião - faz do assunto pedofilia uma
matéria sensacionalista. Por sua vez, a mídia reflete o que o público deseja
assistir. Este é seu papel e dever: vigiar, informar, denunciar. Como todos os
atos e engenhos humanos, ela possui falhas e virtudes. No meu entender, porém,
sem liberdade de imprensa morreremos todos por asfixia.
Quando o caso é o celibato da Igreja Católica
Romana (do qual não sou defensor por razões, até, fisiológicas) e a pedofilia,
nada me impede, como um psicoterapeuta de origem judaica, de não enxergar
alguma relação entre padres portadores deste distúrbio e, muito menos, de
entender a comparação desastrada desta patologia com o preconceito anti-judaico.
Preconceito este que levou à Inquisição, aos pogroms (palavra russa que significa
"causar estragos, destruir violentamente”. Historicamente, o termo se
refere aos violentos ataques físicos das populações europeias contra os judeus,
tanto no império russo quanto em outros países), e que culminou com o
Holocausto.
Dado às minhas raízes judaicas, eu considero
um absurdo a comparação que se faz, atualmente, à Igreja Católica, associando
as críticas aos padres pedófilos com as ações dos antissemitas contra o povo
hebreu. Quem assim pensa desrespeita tanto as crianças abusadas sexualmente,
quanto os seis milhões de judeus que foram mortos e queimados nos fornos
crematórios nazistas.
Dito isto, aviso a quem me lê, agora, e não me
conhece. Exerço a Pediatria e a Psicoterapia, há mais de 50 anos e lembro ser
ela um transtorno de personalidade e de preferência sexual que se caracteriza
pela escolha sexual por crianças, quer se trate de meninos ou meninas,
geralmente pré-púberes ou no início da puberdade. Conferir: CID-10 -
Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à
Saúde -, Organização Mundial de Saúde (OMS).
O DSM-IV (Diagnostic
and Statistical Manual of Mental Disorder) utiliza a classificação dos
transtornos mentais da Associação Americana de Psiquiatria, que condiciona o
diagnóstico deste transtorno mental às pessoas com idades de 16 anos ou 17 anos
que são, pelo menos, 5 anos mais novas do que as crianças abusadas.
O portador de tal perturbação tem pensamentos
e fantasias eróticas repetitivas, ou atividade sexual com crianças menores de
12 ou 13 anos de idade. A pedofilia está comumente associada a casos de
incesto: a maioria dos casos envolve pacientes da mesma família (pais/padrastos
com filhos e filhas). Via de regra, o ato pedófilo consiste em toques, carícias
genitais e sexo oral, sendo a penetração menos comum.
Com a expansão da internet, tem sido mais
frequente a presença de pedófilos que apreciam fotos de crianças, com a
finalidade de se excitar e/ou se masturbar. No meu entender, a história da
pedofilia não deve incluir, apenas, o escândalo dos padres católicos (0,6% dos
clérigos). Tampouco na falsa associação com o Holocausto, ou no esquecimento
deste. Solicito uma trégua. Não escrevo esta crônica para me indignar. Tento
contribuir para o debate do momento, com observações sugeridas pela
Psicopatologia e pela clínica de Pediatria. Voltarei ao assunto... Se me
permitirem.
(*) Professor Titular da Pediatria da Universidade de Pernambuco.
Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União Brasileira de Escritores (UBE)
e da Academia Brasileira de Escritores Médicos (ABRAMES). Consultante Honorário da
Universidade de Oxford (Grã-Bretanha).
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