quarta-feira, 31 de março de 2021

O VÍRUS SOMOS NÓS

Por Fabiano Piúba (*)

Não estamos entendendo nada. O vírus não é apenas a Covid-19 ou novos que estão por vir. O vírus somos nós.

Sugiro uma suspensão. Um exercício de afastamento do Planeta Terra, como se fôssemos um astronauta ou mesmo a Estrela Dalva. Vista de longe, na "Hipótese de Gaia" pensada em 1969 pelo químico James Lovelock, a Terra é um organismo vivo que respira e se auto regula.

O yanomami Davi Kopenawa, lá do fundo da mata, vai além num alerta para a humanidade: "Acho que vocês deveriam sonhar a Terra, pois ela tem coração e respira. (...) A floresta respira, mas os brancos não percebem. Não acham que ela esteja viva". A Terra precisa respirar.

O livro "A queda do Céu" soa como um recado. Por que estou fazendo essa associação entre as palavras de Kopenawa e o contexto da pandemia? Porque não deixa de ser amargo que a Covid-19 venha nos matando sem fôlego, nos deixando sem respirar.

Seria um recado da Mãe Terra diante da devastação do mundo causada pelo vírus humano? Essa conexão não deixa de ser instigante. Repensamos nossa relação com as outras espécies e com a natureza ou nos afundamos nessa catástrofe planetária em que estamos metidos.

Desenvolvemos o espírito solidário no compartilhamento das culturas e das economias geradas ou estamos fadados ao fracasso físico e espiritual como seres humanos. Nós, que ameaçamos tantas espécies, seremos extintos.

Estamos em meio a uma pandemia, mas parece que continuamos celebrando o "Ano Novo", desdenhando da ciência e desfilando sobre mais de dois milhões de pessoas no mundo, que não respiram mais conosco o ar que a Terra ainda nos oferece. Ainda, porque o ser humano - esse vírus devastador - tem sufocado a Terra e a si mesmo.

O que nos resta de ar e de esperança é de que o antivírus somos nós mesmos. Davi Kopenawa, por exemplo, é um antivírus. Só nós podemos fortalecer o sistema imune de nossa natureza humana, espiritual e amorosa, produzindo anticorpos contra esse ciclo devastador humano que tem infectado sua própria Mãe Terra. Que sobreviveria sem nós, mais verde e mais azul. Porém, Ela nos ama tanto, que não desiste de seus filhos. Seja uma árvore, um pássaro, um felino, um inseto, um peixe ou uma menina.

(*) Gestor cultural, poeta, historiador, doutor em Educação e secretário da Cultura do Estado do Ceará.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 26/02/21. Opinião, p.34.

terça-feira, 30 de março de 2021

PANDEMIA E EVASÃO ESCOLAR

Por Eloisa Vidal (*)

Já vai fazer um ano que as aulas presenciais estão suspensas devido à pandemia. Nas piores projeções, no início de 2020, não se previa tanto tempo com escolas fechadas.

Nesse período, professores e gestores tiveram que se reinventar criando metodologias de ensino e produzindo materiais didáticos passíveis de serem disponibilizados por meio de tecnologias digitais. Novos processos educacionais foram concebidos e implementados num curto espaço de tempo.

Uma das grandes preocupações dos sistemas de ensino foi não perder contato com os alunos, porque na ausência de contato físico, se impôs a necessidade de algum tipo de conexão para preservar a ideia de escola, aprendizagem e ensino.

As dificuldades com acesso a internet e dispositivos como computador, tablet e smartphones foram fatores que afetaram essas possibilidades de conexão com os alunos. Este fato serviu para mostrar o quão agudo é o problema da inclusão digital no país.

Olhando de forma retrospectiva, dados levantados junto a alguns sistemas de ensino público mostram que apesar de todos os esforços, se anunciam taxas de evasão altas por parte de alunos do ensino fundamental e médio.

Essa situação aponta para várias condutas que devem ser adotadas na fase de retração da pandemia e que precisam de simultaneidade, como: busca ativa de estudantes que perderam contato com a escola, acolhimento de todos(as) alunos(as) que depois de tanto tempo voltam ao convívio dos colegas, mecanismos que permitam lidar com a diversidade de níveis de aprendizagem dos alunos, recomposição das relações socioafetivas dos alunos entre eles e com os docentes e a gestão da escola.

Como não há experiência acumulada sobre isso, tais ações demandam inovação e criatividade, porque o resgate das crianças e jovens é tarefa urgente, prioritária e relevante socialmente.

Depois de muitas décadas de esforços deliberados o País tem conseguido avançar nos seus indicadores de acesso e permanência na escola, o que implica em redução da taxa de evasão.

A pandemia pode fazer esses indicadores retrocederem a níveis anteriores, não desejáveis para os sistemas de ensino. A superação da evasão escolar nesse momento é desafio que precisa ser enfrentado de forma coletiva pela sociedade e pelas famílias.

(*) Professora da Uece. Doutora em Educação.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 26/02/21. Opinião, p.35.

segunda-feira, 29 de março de 2021

DUAS TESES FILOSÓFICAS

Por Luiz Gonzaga Fonseca Mota (*)

René Descartes (1596-1650) nasceu na França e faleceu na Suécia. Considerado o pai da filosofia moderna, destacou-se como o primeiro grande representante do Racionalismo, seguido então por Leibniz. David Hume (1711-1776), nasceu e faleceu na Escócia, foi um dos mais célebres filósofos da Época Moderna, fundador da escola cética ou agnóstica, admirado por muitos amigos, inclusive membros da Igreja. Como Descartes, Hume possuía muitos seguidores, dentre os quais se destacou Locke. Os pensamentos de Descartes e Hume deram origem a duas correntes filosóficas, respectivamente: o Racionalismo e o Empirismo. A primeira diz que a razão é a fonte do conhecimento, a segunda mostra a importância dos sentimentos: audição, visão, olfato, tato e paladar. Kant iniciou suas observações filosóficas tentando conciliar as duas correntes, causando muita tensão, o que levou Hegel a conceber com profundidade o seu sistema dialético, desenvolvido por tese, antítese e síntese. A filosofia cartesiana tem por base dois pontos opostos: a coisa pensante (res cogitans), relacionada com o espírito, e a coisa extensa (res extensa) inerente à matéria. Espírito e a matéria seriam criações de Deus, cuja existência era essencial à filosofia de Descartes, embora seus seguidores, em épocas posteriores, procuraram omitir qualquer referência a Deus, porém mantendo a divisão entre o espírito e a matéria. Por sua vez, as relações matemáticas, segundo a teoria cartesiana, deveriam proporcionar uma descrição racional de todos os fenômenos naturais, objetivando descobrir a verdade. Defendeu que o início seria a dúvida e não a fé. Por outro lado, vale ressaltar que o argumento “Penso, logo existo” não foi original, pois fora dito, em outras palavras, por Santo Agostinho há mais de doze séculos. Já Hume desenvolveu suas teses tendo por base o Empirismo. No tocante à lógica, analisou a relação de causa e efeito, o que nos leva além de nossos sentidos. Todavia, Hume nega que não há conexão entre o que existe e o que não existe. Ademais, não obstante suas concepções céticas e agnósticas, a existência de Deus seria provada, mediante o argumento da causalidade.

(*) Economista. Professor aposentado da UFC. Ex-governador do Ceará.

Fonte: Diário do Nordeste, Ideias. 12/3/2021.

domingo, 28 de março de 2021

A CARREIRA MILITAR DE UM SANTO BAIANO

           Nascido como Ilha de Vera Cruz e depois Terra de Santa Cruz, por sua formação católica, desde o Brasil-Colônia, o País se acostumou a conviver com a presença da Igreja em todas as esferas de sua vida social: comércio, literatura, educação, política etc.

Até nas forças armadas, a Igreja Católica se fazia presente, direta ou indiretamente. Como prova inconteste dessa vinculação foi a concessão da patente militar, no grau de soldado, ao primeiro padroeiro da cidade de Salvador, Bahia, que foi conferida à imagem do Santo Antônio do Forte da Barra em meados do século XVII, posteriormente elevada à capitão, em 1705.

Essa intrigante nomeação militar de Santo Antônio, que não era inusitada, pois outros santos foram igualmente aquinhoados, em diferentes tempos, aqui a alhures, é uma demonstração da forte presença da Igreja Católica na vida cultural e da popularização que o catolicismo viveu na sociedade baiana, por mais de quatro séculos, a partir da primeira missa rezada por frei Henrique de Coimbra em 1500.

A imagem do santo, no correr das centúrias, foi ganhando promoções e respectivos aumentos vencimentais, e só teve seu soldo cassado em 1912, quando já ocupava o posto de tenente-coronel.

O Frei Arnaldo Mota, ofm, frade cearense residente no convento franciscano de Salvador-BA, falou que a suspensão dos pagamentos, que eram recebidos pela ordem dos frades franciscanos menores, já que Santo Antônio fora membro dessa ordem, é atribuída a um comandante militar republicano, de comportamento reconhecidamente anticlerical.

Para não dizer que estava cassando a patente e o soldo correspondente, e diante dos reclamos de soteropolitanos contra suas medidas, o oficial-comandante determinou que o pagamento somente poderia ser feito, pessoalmente, ao santo, rechaçando intermediários, ainda que munidos de procuração passada em cartório com esse fito específico.

Decorridos mais de cem anos, até hoje Santo Antônio não compareceu para receber o que lhe é de direito, uma vez que segue como protetor da capital baiana. A despeito do seu ofício de protetor da cidade e provedor de casamentos das mulheres, encalhadas ou não, o santo não deve ter muito ou qualquer apego a pecúnia e bens materiais da vida mundana, valorizando apenas as questões espirituais.

Marcelo Gurgel Carlos da Silva

Ex-Presidente da Sobrames-Ceará

* Publicado In: SILVA, M. G. C. da (Org.). Ombro, arma! Médicos contam causos da caserna. Fortaleza: Expressão, 2018. 112p. p.56-57.

TARADOS CEARENSES

          Há um sábio provérbio milenar chinês que proclama: “Quando uma mulher trai o seu marido pela primeira vez, a justiça deve castigar o amante; se ela reincidir na prática da traição, a mulher deve ser castigada; porém, se ela trair pela terceira vez, castigue-se o seu marido”.

Um sargento da aeronáutica chegou a Fortaleza transferido de outro estado para servir na Base Aérea local. Logo que ele aportou na capital cearense, sua mulher danou-se a aplicar-lhe chifres: era uma sucessão de amantes, tanto em série como em paralelo, que não dava descanso em sua cabeça de touro.

Ela não tinha nem o cuidado de disfarçar ou de esconder do marido a sua traição, fato que passou a ser de conhecimento de toda a corporação militar da aeronáutica, o que incrementava a cobiça da mulher alheia por parte de seus colegas.

O sargento já não aguentava mais os comentários maldosos, as piadinhas e as indiretas dos seus companheiros de farda. Até os seus subordinados, cabos e soldados, não mais o respeitavam, sendo isso imperdoável por afetar o seu desempenho profissional.

Sentindo-se desgastado com a situação, por ser alvo da chacota geral de seus camaradas, que o tachavam de corno manso, após se aconselhar com o capelão, pediu para que o religioso desse uns conselhos à sua esposa, para que ela voltasse para o caminho do bem e não persistisse na trilha do pecado, desonrando o seu lar.

O apelo do religioso não surtiu qualquer efeito, posto que a candidata à Messalina fez ouvidos de mercador, prosseguindo a sua sanha de plantar apêndices corneanos na testa do inditoso marido.

Diante disso, o sargento solicitou a um oficial superior que intermediasse uma audiência diretamente com o comandante da Base Aérea, para tratar do seu caso.

Durante a audiência, o sargento expôs ao comandante, por longo tempo, a sua vexaminosa condição, sendo ouvido atentamente pela autoridade militar, que então declarou:

– Eu compreendo perfeitamente a sua situação e sou solidário com o seu penar; porém, nada posso fazer contra a sua cara-metade, porquanto se trata de um problema particular, e no âmbito familiar, não comportando qualquer ingerência nossa.

– Mas, comandante, eu jamais pediria que o senhor punisse a minha mulher, pois, apesar de tudo, eu ainda a amo muito.

– Então, você estaria desejando que eu apenasse os homens com os quais ela teve envolvimento carnal? Pelo que você contou, eu puniria quase metade do nosso regimento, desde recruta a brigadeiro.

– Não, comandante! Não é isso o que eu quero.

– Pois, diga-me qual é a razão do seu problema, para eu pensar em uma solução.

– Acho que o problema está nesta terra. Já servi em outras praças e a minha mulher sempre me foi fiel, nunca me traiu.

– Expresse, por favor, a sua reivindicação, sargento.

– Eu quero ser transferido daqui para outro estado, comandante. Os cearenses são muito “tarados”. Eles não dão descanso à minha mulher; é por isso que ela me trai tanto.

A transferência foi-lhe concedida, prontamente, mas não como um castigo preconizado pela sabedoria chinesa.

Marcelo Gurgel Carlos da Silva

Ex-Presidente da Sobrames-Ceará

* Publicado In: SILVA, M. G. C. da (Org.). Ordinário, marche! Médicos contam causos da caserna. Fortaleza: Expressão, 2015. 112p. p.90-91.

sábado, 27 de março de 2021

A XIX BIENAL DA ACADEMIA CEARENSE DE MEDICINA EM ORGANIZAÇÃO

Tão logo expirou o mandato da gestão 2018-20 da Academia Cearense de Medicina (ACM), a Diretoria subsequente, eleita para o Biênio 2020-22, tomou inciativas no intuito de preparar a sua Bienal, sempre realizada no mês de maio dos anos ímpares.

Cumprindo o regramento da ACM, o atual Presidente Pedro Henrique Saraiva Leão delegou ao vice-presidente Janedson Baima Bezerra a responsabilidade de organizar e presidir a XIX Bienal da ACM, que ocorrerá em Fortaleza de 10 a 12 maio de 2021. Para tanto, o acad. Janedson Baima Bezerra instituiu a Comissão Organizadora composta por membros da Diretoria Científica e por confrades convidados, mais afeitos ao tema central do evento.

De antemão, ciente das medidas restritivas de deslocamento das pessoas, vigentes na ocorrência da pandemia do novo coronavírus no País, que dificultavam a feitura de reuniões presenciais, a Comissão Organizadora estabeleceu que as suas reuniões fossem conduzidas sempre de forma virtual, revogando-se tal dispositivo, se possível, quando as condições sanitárias fossem condizentes aos encontros presenciais, o que ainda não aconteceu e não se vislumbra alterar nos meses vindouros.

De forma operacional, foi montado um grupo de WhatsApp específico para tratar da Bienal, o que facilita a comunicação entre os membros da Comissão Organizadora, e acordou-se a utilização da Sala Virtual, via Plataforma Zoom, gentilmente oferecida pela acadêmica Ana Margarida Arruda Rosemberg, para as reuniões regulares ou extraordinárias preparatórias da XIX Bienal da ACM.

Foi uníssona a acolhida da Covid-19 como tema central da próxima Bienal, cuja programação científica gravita ou focaliza os variados aspectos dessa pandemia. Os títulos e as modalidades das exposições resultaram das múltiplas sugestões propostas pelos acadêmicos, de tal maneira que o programa se configurou uma construção coletiva e plenamente enriquecedora.

De princípio, como estava sendo articulada com bastante antecedência, ainda se cogitara a possibilidade de se produzir um evento presencial, ou algo híbrido, quando a pandemia dava sinais de arrefecimento. No entanto, a incerteza do percurso da doença, validada pelos informes epidemiológicos, apesar da tendência de declínio das cifras após o mês de maio do ano passado, deliberou-se pela opção exclusivamente virtual. Essa decisão foi inteiramente acertada diante do recrudescimento das taxas de incidência e de mortalidade pelo novo coronavírus, experimentadas depois das recentes eleições municipais e acentuadas na sequência dos festejos de final do ano de 2020.

Dadas a envergadura e a riqueza da programação traçada, contando com expositores de escol, e a franquia de acesso aos muitos participantes previstos, a ACM contratou uma empresa detentora de boa infraestrutura e expertise na transmissão de congressos e encontros científicos, sociais e culturais, o que avaliza uma expectativa de sucesso dessa empreitada da ACM.

Que todos os interessados possam ter proveitosos momentos de aprendizados e de trocas de experiência na Bienal que tratará de temática da maior importância atual.

Acad. Marcelo Gurgel Carlos da Silva

Membro titular da ACM – Cadeira 18

*Publicado In: Jornal do médico digital, 2(11): 55-57, março de 2021. (Revista Médica Independente do Ceará).


sexta-feira, 26 de março de 2021

Crônica: “Cearense é viquingue... Dadonde? Até parece!” ... e outros causos

Cearense é viquingue... Dadonde? Até parece!

O estimado Totonho Laprovitera escreveu artigo há pouco falando dos “viquingues” e “galalau”, a mim dedicando a escrita bem-humorada e inteligente, mister dele para além da prancheta arquitetônica de altíssima catilogência. Só pra discatitar, devolver-lhe-ei a gentileza com o presente bodejado digitativo. Começo por dizer que não sei onde esse povo tava com o juízo quando fez a arrumação pesquisativo-comparativa, mas, se Totonho diz que tem a ver, nele eu me fio.

Uns cururuzão!

Abordemos, pois, as características externas e o psiquismo desse povo agalegado, de quem, sabiamente descrito por Totonho, herdamos a peruca de touro. Detalhe, conforme Jair Morais: “A cagada dum home daquele enche a fossa dum pobre em dois tempos”. Mas, pretensão: o viquingue é feio bichão medonho, à moda umas "vela branca" em busca lá de riba. Cururu teitêi fora d'água. Lapa de hômi que é um setenta (varapau), sobrancelha de caboré, taba do queixo do tamanho duma tampa de rural. É couro no papo que dá pra cobrir uma casa.

A fala imbuluada

Em cearensês castiço, um “mangolzão” com mais de milisseiscentos diabos. Cabelo véi ensebado, um disputismo de dente branco, à moda capucho de algodão; a “crôa” da cabeça, fina que nem assobí de soim. Os pés? Que nem balsa. Os “brancão” têm um engrolado na língua que cristão nenhum entende – fala toda “imbuluada”. Só quere ser as prega! Quando dizem “num sei que, num sei que, num sei que mais lá”, pensam que tão enganando nós! Te conheço, Ceará!

E a goipada deles?

Dizem (dizem!) que são ajumentados, oitavados – acavalados (pé de mesa). Percebi pelo andar, é bem dizer esses meninos criados sem cueca. Aloprados no dicumê (comem a rôdo, eu reparei), uma goipada deles “inhenche” uma bacia de barbeiro. Dou por vista quando dá na fraqueza, um elemento desses. Vi uma numerosidade deles no aeroporto, cada qual com uma maçaroca de papel no sovaco, pareciam uns dotô. E os ói abutecado dos caba véi? As pastas, “imprial” surrão moderno; não largavam de beber água em cuia invocada...

Pense num inlinhado!

Na Praia do Futuro, meses atrás, fiquei cubando a movimentação de um deles, bem gordão (“ah, barriga boa duma facada!!!”). Tinha os ói de bila e o fucim que era um erado – um horror de grande. Pelo que entendi da bichinha gasguita que tava com ele (Jarina Gorila, lá do Alvorada), o réla que ela dava no garçom era assim: “Ô, boca da mãe da lua, ande cá com a conta que o cidadão aqui quer pagar! Ligeiro! E largue de perobagem!” Sem ver de que, começou um labacé. Melaram o estrangeiro.

Cacete pra mais de metro!

Pra ver como são as coisas: quando acabar, o europeuzão se enfezou com o rapaz do estacionamento e deu uma chapuletada no para-brisa do buggy. Arrotando peidança, pegou a carteira, chabobêuzona cheia de dinheiro, e pagou dois contos. A polícia chegou e o inlinhado foi do tamanho dum bonde. Prende num prende, quem tava errado, quem tava certo... Vi a hora correr mão de tabefe. Ia ser distrôço grande, dismantêlo pesado. Mas...

Psiquismo dos viquingues

Sei nem que diabé dez. Só sei que aqui o caba mental do juízo é, perimetral, afetado, doido do caneco rodar...

Fonte: O POVO, de 6/08/2020. Coluna “Crônicas”, de Tarcísio Matos. p.2.

quinta-feira, 25 de março de 2021

A PANDEMIA, O LOCKDOWN, A ESCOLA

Por Henrique Soárez (*)

Todo o respeito ao empenho do Governador Camilo Santana e sua equipe, em especial o Secretário Cabeto, na administração da pandemia no Estado do Ceará.

Somos solidários neste momento em que o risco de colapso do sistema de saúde novamente demanda que se busque o difícil equilíbrio entre salvar vidas e preservar meios de vida.

A melhor notícia da semana veio do próprio Governador informando que até o final de março teremos 1.074 leitos de UTI para Covid, mais do que tínhamos durante o primeiro pico da pandemia.

O vírus e as ondas de contágio seguem rumos que a ciência ainda está por decifrar. As variantes parecem adiar a elusiva imunidade de rebanho.

A vacina, única solução estrutural, demora por complexidades logísticas globais e problemas políticos nacionais.

Mas, e aqui reside a diferença central entre o primeiro e o segundo ano da pandemia: os profissionais da saúde já sabem tratar a doença. A mortalidade de 2021 é uma pequena fração da mortalidade de 2020.

Seguimos em uma guerra, não há dúvidas. Mas o objetivo estratégico neste ponto do combate, o "Salvar Vidas" de agora, deveria ser um só: dar aos profissionais de saúde tudo o que precisarem para evitar mortes.

Compreendemos o desafio cronológico diante do nosso Estado. A expansão da capacidade de atendimento é complexa (leitos, profissionais, insumos, etc.). Se por isso o lockdown for julgado inevitável, que seja efetivo. Para toda a sociedade e por um número limitado de dias.

Com medidas reais para proteger os cidadãos menos favorecidos. Que, após estes dias, a reabertura seja pautada por indicadores transparentes e públicos, priorizando as atividades que já provaram não ser focos de contaminação.

Dr. Cabeto afirmou à imprensa em 04/01 que "as escolas não tiveram um alto índice de contágio. Foi pequeno, menor do que 1%". Esta fala reflete a operação das escolas, sob protocolos, desde que foi autorizado o retorno às aulas presenciais em setembro.

Assim, que as escolas, públicas e particulares, possam muito em breve voltar a atender seus alunos de forma presencial e segura, zelando não só pela aprendizagem, mas também pela sua saúde integral. Por isso clamam as famílias cearenses. 

(*) Engenheiro eletricista, diretor do Colégio 7 de Setembro e da Uni7

Fonte: Publicado In: O Povo, de 25/2/21. Opinião, p.20.

quarta-feira, 24 de março de 2021

Pesar da Sobrames Ceará por Dr. Antônio Eusébio Teixeira Rocha

Nota da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores – SOBRAMES

Comunicamos, com grande pesar, o falecimento do nosso estimado confrade Dr. Antônio Eusébio Teixeira Rocha, membro titular da SOBRAMES-CE. 

Expressamos nossos sinceros votos de pesar à família do querido Dr. Eusébio, desejando paz e conforto espiritual neste momento de dor e saudade.

Dr. Eusébio honrou a nossa profissão, tem um passado de luta por uma saúde de qualidade e, em todos as funções que ocupou, sempre teve uma atuação íntegra, responsável, competente e voltada para os mais altos interesses da saúde do nosso Estado.

A SOBRAMES veste-se de luto com a partida do já inesquecível confrade, que durante muitos anos enobreceu os quadros da nossa entidade, sempre com sua sensibilidade e inigualáveis produções literárias.

Raimundo José Arruda Bastos

Presidente da Sobrames

Me faltam palavras pra esse momento, mas meu pai virou um anjinho e está cuidando de nós! Pedimos muito oração por ele e por nós nesse momento e compreensão. Que vocês fechem os olhos e lembrem o último abraço, o último sorriso, o último momento alegre com ele. Meu paizinho se foi e dei o último abraço, não como queria, mas ele foi abraçado por todos nós!

Manu, filha

Dia 11/Abril/16 o Eusébio tornou-se membro da nossaSOBRAMES Ceará

Descanse em paz meu AMIGO Eusébio

Que Deus conforte os corações de toda a família.

Obrigado por tudo meu amigo

Argollo

Deus o receba em Seu Reino de Glória.

Paulo Ferreira

Eusébio, meu bom amigo, agora você é com Deus. Tive a honra de fazer a apresentação dele na posse na Sobrames. Por isso, com frequência me chamava de padrinho.  E como eu gostava! Estou muito triste com a partida de Eusébio.  Imaginem a dor e o sofrimento da esposa e dos filhos, tanto amados por ele. Rogo a Deus conforto aos seus familiares e o Reino de Glória ao amigo Eusébio.

Sebastião Diógenes

Ceifado, na fase produtiva da vida (56). Uma visão social e musical no regional: cutuca a burra. Deus o receba Eusébio, e conforte a nós todos. Meus Deus!

Lineu Jucá

Descanse em paz Dr. Eusébio.

Que Deus dê o conforto a familiares e amigos.

Ele esteve na Sobrames em janeiro para receber seus livros. 

Ficarei com suas palavras de carinho e atenção comigo.

Obrigada por tudo.

Orlania.

Inesquecível Eusébio! Agora compartilhando sua alegria com os anjos!

Maria Dione Rola

E assim se faz história

Se constrói saudade

Faz valer a vida

O quanto se é lembrado

Celebrado

É o valor do foi

Do que é

Mensagem para o que podemos ser

Dr. Eusébio já deixa saudade

Muito nos ensinou com seu bom humor

Agora, alegra o céu!

Fábio Santana

Pesaroso acompanho a manifestação de luto da diretoria da Sobrames Ceará pela perda do nosso valoroso sócio.

Ficarão em nossas lembranças as suas participações em nossas antologias e mais do que tudo as manifestações de afeto e de esperança de sua filha Manu que tanto nos animavam do desejo de que o Eusébio superasse os infortúnios de sua enfermidade.

Que Deus o receba entre os Seus eleitos.

Marcelo Gurgel

UNIÃO DE ESFORÇOS PARA ENFRENTAR A PANDEMIA

Por José Sarto (*)

O ano de 2021 trouxe um novo cenário de enfrentamento à pandemia da Covid-19. Ao mesmo tempo em que iniciamos a campanha de vacinação, uma conquista da ciência que renova nossas esperanças, por outro lado, os casos voltaram a crescer, já repercutindo em maior demanda assistencial.

Nesse contexto, a Prefeitura de Fortaleza tem empreendido todo o esforço necessário para cumprir o cronograma de imunização, ampliar a capacidade de atendimento hospitalar e realizar ações de fiscalização, a fim de fazer cumprir os decretos vigentes de distanciamento.

Desde 1º de janeiro, quando iniciamos a atual gestão municipal, nosso foco de trabalho tem sido zelar pela saúde dos fortalezenses e salvar vidas.

Nossas equipes foram preparadas e começaram o Plano de Vacinação no mesmo dia da chegada dos primeiros lotes de imunizantes, em 18 de janeiro. Até ontem, 24 de fevereiro, 115.442 pessoas já haviam sido beneficiadas com a primeira dose. Desse total, 34.999 receberam a segunda dose contra a Covid-19.

Neste primeiro momento, estamos atendendo profissionais de saúde, idosos com mais de 75 anos, pessoas com mais de 60 anos que vivem em instituições de longa permanência e também aquelas com deficiência com mais de 18 anos institucionalizadas.

Ainda temos, contudo, um longo percurso até conseguirmos imunizar parcela considerável da nossa população. Por esse motivo, é preocupante perceber que muitas pessoas têm relaxado nas medidas de prevenção, agravando a circulação viral.

Tendo isso em vista, a Prefeitura vem trabalhando incansavelmente para definir estratégias de expansão de leitos na nossa rede hospitalar. Já iniciamos esse processo nas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e dispomos de 170 novos leitos de observação para tratamento de Covid-19.

Diariamente a estratégia vem sendo atualizada e, assim, estamos conseguindo ampliar a capacidade de resposta assistencial, inclusive de UTIs, também no Hospital da Mulher, no Instituto Dr. José Frota, no Frotinha de Messejana e em outras unidades municipais de saúde.

Intensificamos, ainda, as ações de fiscalização. A fim de garantir o cumprimento dos decretos vigentes, nossas equipes da Guarda Municipal e da Agefis têm atuado, em conjunto com órgãos estaduais, para garantir o horário adequado de funcionamento do comércio e de serviços.

A fiscalização tem visado ainda locais onde historicamente são registradas aglomerações. Com o objetivo de minimizar a lotação no transporte público, em parceria com o Governo do Estado, a Prefeitura está custeando o reforço de 200 veículos na frota de ônibus em horários de pico.

A pandemia ainda não acabou e, portanto, é determinante que toda a população se sensibilize e obedeça aos protocolos sanitários. A prevenção é o caminho mais eficaz para conter a epidemia e, portanto, devem ser reforçados os cuidados como uso constante de máscara, distanciamento social e higienização das mãos sempre que possível.

Somente com união de esforços e envolvimento de todos conseguiremos reduzir a disseminação do vírus e superar este difícil momento. 

(*) Prefeito de Fortaleza.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 25/02/21. Opinião, p.21.

terça-feira, 23 de março de 2021

UMA VACINA E TRÊS FILMES

Por Eduardo Jucá (*)

A autorização dos primeiros lotes de vacinas contra Covid-19 no Brasil gerou uma onda de comemorações talvez incompatível com o tamanho da tragédia. O imunizante é nossa maior esperança e devemos lutar pela disponibilização da maior quantidade possível o quanto antes.

Entretanto, o lento começo expôs o quanto a crise pode ser aumentada. A busca pelas doses em um salve-se quem puder mal disfarçado pode ser bem entendida se compararmos o quadro com três filmes conhecidos.

"O Poço" retrata prisioneiros divididos em andares. A comida vem descendo andar por andar, e as pessoas vão retirando sua parte. Quem está nos andares superiores desperdiça enquanto quem está nos andares inferiores fica com o que sobrar.

Se esta comida fosse a disponibilidade de vacinas no tempo e na quantidade adequados, estaríamos bem abaixo.

Em "Titanic", as vacinas equivalem aos botes salva-vidas e nossa sociedade é um navio que afunda fraturado pelo iceberg da polarização e dos extremismos. Na corrida pela sobrevivência vale tudo, incluindo fraudes e emprego de privilégios.

Por fim, a "Lista de Schindler" descreve como é angustiante tentar entrar no cadastro dos que serão salvos. Com menos doses do que necessário, testemunhamos o esforço de pessoas que frequentam hospitais diariamente no sentido de comprovarem seu direito de acesso ao imunizante.

A escassez torna difícil a identificação das prioridades e o jogo de influências ameaça um sistema que já luta com enormes desafios.

Como afirmou o médico João Gabbardo, sempre na linha de frente do combate à pandemia, "se todos são prioritários, ninguém é prioritário". Ou como diria o profético Orwell, "todos são iguais, mas alguns são mais iguais do que os outros". 

(*) Médico neurocirurgião pediátrico, professor, pesquisador e palestrante.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 14/2/2021. Opinião. p.28.

segunda-feira, 22 de março de 2021

VERDADE POLÍTICA

Por Luiz Gonzaga Fonseca Mota (*)

Carlito Maia, um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores disse certa vez: “Quando a esquerda começa a contar dinheiro, converte-se em direita”. Sem tomarmos como regra geral, podemos dizer que quando a direita deixa de contar dinheiro vira esquerda. Essas observações mostram a importância dos aspectos monetários na formação do pensamento e das atitudes, ao longo do tempo, de boa parte da humanidade. Estudiosos, abordaram tal comportamento à luz de princípios políticos, éticos e morais. As duas frases mencionadas, apesar de aparentemente simplórias, concentram mensagens fortes. Lamentavelmente, nos dias atuais, a exacerbação do pragmatismo está ocupando espaço das opções ideológicas e institucionais. Acreditamos serem as manifestações pragmáticas influenciadas pelo maniqueísmo direita e esquerda, pela ânsia de poder, pela falta de solidariedade, pelo individualismo e pela ausência de sentimentos espirituais. O Estado existe não para ser opressor, tampouco de direita ou de esquerda, mas para assegurar os princípios básicos da democracia. Precisamos nos voltar para o conhecimento das verdades essenciais, objetivando alcançar os valores éticos indicadores de um mundo social baseado nos conceitos de liberdade, de justiça e de igualdade de oportunidades. Ademais, concordamos que um líder não se faz pela força, por instrumentos e mecanismos artificiais, mas pelo reconhecimento livre e soberano do seu povo. Forçar o surgimento de uma liderança, usando segmentos da falsa mídia e “marqueteiros” gananciosos poderá gerar uma farsa administrativa e política. Aqueles que assumem um cargo na vida pública pensando em fazer negócios e não trabalhar pelo povo, não são democratas, pelo contrário, são tiranos enrustidos, dominados por forças da corrupção. Por fim, não ao maniqueísmo direita e esquerda, mas sim a defesa da democracia.

(*) Economista. Professor aposentado da UFC. Ex-governador do Ceará.

Fonte: Diário do Nordeste, Ideias. 5/3/2021.

domingo, 21 de março de 2021

SYNALAR X SIMILAR

             Um tenente médico fazia um atendimento de um sargento no Hospital Geral de Fortaleza (do Exército), HGeF, tendo prescrito um creme para o tratamento de uma doença de pele. Como desejava que o sargento iniciasse logo o tratamento, ele solicitou ao auxiliar de enfermagem que entrasse em seu consultório, dizendo:

Cabo Alfredo, por favor, vá na farmácia do hospital e peça para dispensarem esse creme que prescrevi para o sargento.

Alguns instantes depois, o Cabo Alfredo voltou e disse:

– Tenente, o farmacêutico me mandou dizer que o remédio que o senhor passou estava em falta.

– Nesse caso, retorne lá, por favor, e pergunte ao farmacêutico se ele tem um similar.

– Sim, tenente! É pra já. São dois passos pra ir, e dois para voltar.

Rapidamente, o cabo Alfredo estava de volta e informou:

– Tenente, o farmacêutico me mandou de novo dizer que não tem no estoque nenhum similar.

– É uma pena, cabo Alfredo. Eu gostaria muito de ajudar o sargento.

– Ah, doutor! Essa farmácia daqui não tá com nada. Eu sou dono de uma “farmacinha” na periferia, que eu botei no nome da minha mulher, onde eu ganhos os meus trocados, fazendo curativos, “tirando” pressão e aplicando injeções, e lá eu tenho esse remédio pra vender.

– Ah! É, cabo! Qual deles?

– O primeiro que o senhor escreveu eu não tenho não! O que eu tenho é o segundo, o “Similar”, posso até trazer pro senhor.

– Está certo, cabo! Pode trazer, pois se estiver correto comprarei o medicamento para o sargento – falou o tenente médico, exibindo um sorriso meio maroto.

No dia seguinte, conforme já desconfiava, o tenente médico recebeu a visita do cabo, que lhe trazia um medicamento denominado: Synalar, um produto contendo acetonido de fluocinolona, um corticosteroide tópico dotado de atividade anti-inflamatória, antipruriginosa e vasoconstritora.

Marcelo Gurgel Carlos da Silva

Ex-Presidente da Sobrames-Ceará

* Publicado In: SILVA, M. G. C. da (Org.). Ordinário, marche! Médicos contam causos da caserna. Fortaleza: Expressão, 2015. 112p. p.88-89.

A SAÚDE DA MULHER PARA GONORREIA

          Nas forças armadas, já de longa data, a despeito dos modernos antibióticos de uso ambulatorial, os casos de doenças sexualmente transmissíveis (DST) nos praças requerem o tratamento hospitalizado, ou seja, como se diz no jargão militar, baixados na enfermaria. Para os militares, essa prática é também uma medida de segurança, a fim de evitar a maior propagação das DST.

Um soldado foi atendido no Hospital Geral de Fortaleza (do Exército), o HGeF, exibindo um quadro típico de gonorreia, com intensa secreção purulenta uretral e antecedentes de contato sexual com uma parceira igualmente portadora dessa gonococcia.

Na verdade, ele não queria ser internado, e insistia em dizer que ele e a companheira já estavam sendo tratados, e logo ficariam bons.

O capitão médico perguntou-lhe:

– Onde você foi atendido?

– Ah, doutor! Foi um “doutor” lá na farmácia do meu bairro.

– Era um médico mesmo? Não seria um farmacêutico?

– Eu sei que era um “doutor” que vendia os remédios.

– Então, nesse caso, devia ser um balconista de farmácia.

– Disso não tenho certeza não, capitão; mas eu contei a ele o meu problema, e aí ele passou o remédio pra mim e pra garota que sai comigo. Até comprei duas caixas: uma pra mim e outra pra ela.

– Qual foi o medicamento que ele indicou?

– Ah, doutor! Eu tô aqui com a caixa no meu bolso – responde, prontamente, o soldado, entregando a caixa ao capitão médico.

O médico ficou deveras intrigado com o medicamento proposto: “A Saúde da Mulher”. Tratava-se de um regulador menstrual, à base de passiflora, de uso popular, indicado nas cólicas menstruais, perturbações da menopausa e manifestações agudas ou crônicas das dismenorreias e nas irregularidades do fluxo menstrual.

Marcelo Gurgel Carlos da Silva

Ex-Presidente da Sobrames-Ceará

* Publicado In: SILVA, M. G. C. da (Org.). Ordinário, marche! Médicos contam causos da caserna. Fortaleza: Expressão, 2015. 112p. p.87-88.

sábado, 20 de março de 2021

O fracasso das “autoridades locais” (Prefeitos e Governadores) no enfrentamento da Covid-19

Por J.R. Guzzo, jornalista

Quase todos os governadores dos 27 estados brasileiros, incluindo-se aí o do Distrito Federal, terão pelo menos uma coisa em comum nas suas biografias: o fracasso diante da Covid. Uns tiveram resultados piores que os dos outros, outros erraram mais do que uns, e a maioria teve a coparticipação entusiasmada dos prefeitos no fiasco geral. Mas todos foram derrotados. Estão querendo, ao que parece, fazer “um pacto nacional” para dizer o quanto são bons. Não vai adiantar nada.

Não é uma questão de ponto de vista. Os fatos mostram que os governadores – “autoridades locais”, como foram definidos pelo STF – estão administrando a Covid com autonomia e com responsabilidade exclusiva, no mundo das coisas práticas, há mais de um ano. Passado este tempo todo, os hospitais públicos sob a sua gerência direta estão em colapso – sem leitos suficientes nas UTIs, sem equipamento adequado, e sem outras coisas essenciais para o tratamento da doença. São eles mesmos que dizem isso.

Por que os hospitais públicos estão em colapso, se os governadores tiveram um ano inteiro, e mais de R$ 30 bilhões em verbas da União, para cuidarem do serviço? Não pode ser porque foram competentes e tiveram azar. Não pode ser porque houve uma quantidade de infectados não prevista, ou porque ocorreu alguma outra surpresa. Não foi por culpa de seres extra-terrestres. O que aconteceu, para quem não quer ser enganado com palavrório vazio, é que os responsáveis fizeram mal o trabalho que estavam obrigados a fazer.

Durante este ano em que tiveram plenos poderes para tratar da epidemia quase todos os governadores brasileiros, com a participação dos prefeitos, fizeram o que bem entenderam e não tiveram de responder legalmente por nada. Governaram por decreto-lei, fizeram compras sem licitação, proibiram a entrada nos parques públicos, fecharam o comércio, fecharam a indústria, fecharam as escolas. Há um ano vivem e governam para um mundo exclusivo da classe média alta, e daí para cima – o mundo do “home office”, do “delivery” e do “fique em casa”, facilidades não disponíveis para a imensa maioria da população brasileira. Em troca, temos 260 mil mortos e hospitais quebrados.

Os governadores já puseram a culpa do seu fracasso no presidente da República, porque, entre outros delitos anti-distanciamento social, ele não usa máscara, faz discurso em aglomeração e diz que se cansou do “mimimi” em torno da epidemia. Agora, para reforçar, deram de jogar a culpa em ninguém menos que os próprios cidadãos que governam – em seu modo de ver as coisas, são eles que estão causando a doença, por não obedecerem às ordens dos “comitês de salvação pública” montados dentro dos governos estaduais para gerir a Covid.

Não importa que todos obedecem a maioria das ordens, e na maioria do tempo – se foi até a esquina sem máscara, ou coisa parecida, o indivíduo começa a ser visto como um marginal pelas “autoridades locais”. Tanto faz, também, que as ordens que os governadores vêm dando há um ano não tenham servido para rigorosamente nada em termos de reduzir mortes e infecções – que, ao contrário, só aumentam. A culpa, agora, não é mais apenas do presidente. É também da população. Aí eles socam multa em cima das pessoas – e ficam com a consciência em paz.

Fonte: Gazeta do Povo, de 8/03/2021. (Circulando por e-mails e iPhones).

sexta-feira, 19 de março de 2021

Crônica: “O lobisomem de Oiticica” ... e outro causo

O lobisomem de Oiticica

Chamava-se Chico Firmino, mais conhecido por Neném. Bebia uma cachaça amuada. Sempre que se melava, dizia pra mãe que queria ver o cão, não tinha um tico medo "de marmota". Certa noite, na casa de um amigo na Redenção, papo já cheio de alpiste, cisma de voltar pro sítio onde morava, distante duas léguas. O amigo ainda pondera:

- Durma por aqui, homem! Amanhã você vai. A essa hora, perto da Oiticica (lugarejo praquelas bandas) aparece um lobisomem. Tem medo não?

- De jeito e maneira! É com ele que eu quero me encontrar, ver se ele é macho mesmo. E dar-lhe umas chulipas, goipar na croa da cabeça...

Neném sai em busca de casa. Noite alta, lua espalhando brilho na mata. Enfim, o encontro com o dito lobisomem, esparramado na beira do caminho. Neném chega perto, chuta areia na cara do bicho, que ligerim se levanta, balança-se todo e encara o desafeto embriagado. Neném se arrepia.

Arrepiado, bate da mão a faca... Mas, quede faca que prestasse? A peixeira, como por encanto, fica enrolada à moda linha em carretel. Quanto mais tentava meter a lâmina nos vazios do lobisomem, mais a faca se desmanchava. Já se urinando, Neném se vale de São Francisco e mete o pé na carreira. Chega em casa, cai no pé da porta, sem voz - quatro da manhã. Uma semana sem voz.

Quando consegue pronunciar alguma mentira, conta pra mãe que fora enganado a respeito do lobisomem da Oiticica. Era tudo conversa mole do povo.

- Que cão que nada, mãe! O lubisômi é uma cuia com um litro e meio de aluá dentro. E o clarão da lua fazendo ela se bulir. Eita bebida sem futuro!

Parto difícil

Stepherson Paraíba Jereissati manda-nos outra das suas. Conta que sua mãe teve oito filhos, todos em casa. Quem segurou os rebentos? Dona Maria Parteira, moradora de Nazarezinho, a 12 km de São Gonçalo. "Eu nasci no dia em que deu a maior chuva do Nordeste. Era meia noite, mãe grávida de mim. Ela começa a gemer e fala pra papai: - Nego, o menino vai nascer. Corra e pegue dona Maria Rosa. E foi por causa desse parto que pai nunca gostou d'eu!"

Seu Zé Avelino pegou o cavalo e partiu pra trazer a cachimbeira. Ao atravessar o riacho que separa São Gonçalo de Nazarezinho, as águas do corrente ainda batiam nos peitos do cavalo. Pegou dona Maria e marchou de volta. Mas agora a correnteza cobria dois homens, um no tuntum do outro. A parteira confessou: "Seu Zé, estou com medo de atravessar esse riacho no lombo do cavalo. Leve ele primeiro, deixe do lado de lá, depois venha me pegar".

Feito! Cavalo na outra margem. Zé Avelino volta nadando pra pegar dona Maria Rosa Parteira. Escancha ela no espinhaço e tibungo no rio. "Foi a partir daí que papai passou a nutrir afobamento por mim. Minha irmã me contou, depois que ele morreu". O que houve, então?

- Quando papai alcançou o meio do riacho, com a parteira nas costas, apertou uma diarreia grande nela. E dona Maria Rosa cagou meu pai legal, nas partes do couro que ficavam fora d'água. Onde a merda quente bateu, couro caiu. Criou uma bolha no espinhaço dele...

- Entendi...

- Por causa duma besteira dessas pai se enfezou. Isso é lá motivo para um pai ter raiva dum filho?!?

Fonte: O POVO, de 24/07/2020. Coluna “Crônicas”, de Tarcísio Matos. p.2.

quinta-feira, 18 de março de 2021

O QUE FALTA DIZER SOBRE VACINAS?

Por Carlos Magno Castelo Branco Fortaleza (*)

Na década de 1850, circulava em Londres um panfleto (ancestral notório do Whatsapp) bradando que a vacina era "inútil, cruel e desumana".

Não fazia um século que Edward Jenner se apropriara de um conceito do folclore popular: a ideia de que mulheres que ordenhavam vacas e adquiriam a "varíola bovina" (vaccínia) eram imunes à terrível bexiga.

Esta, aliás, a doença que desfigurou Marcela, aquela que amou Brás Cubas "por quinze meses e onze contos de réis". Voltando da literatura à vida, a prática de inocular o vírus da vaca (vacina) para prevenir a varíola foi um sucesso, mas teve desde cedo seus detratores.

Ao longo do século XIX, Pasteur e seus colaboradores ampliaram o número de vacinas disponíveis, movimento que continuou ao longo do século XX.

Tal foi a euforia com vacinas e antibióticos que o Prêmio Nobel de Medicina McFarlane Burnett decretou, nos 1960s, "o fim das doenças infecciosas como dano social aos seres humanos".

Em 2021, a afirmação de Burnett nos traz um sorriso triste. No entanto, há algo a se comemorar. A vacinologia, nome atribuído à atividade de pensar em estratégias biológicas imunizantes, desenvolver produtos e por fim testá-los em humanos, tem se desenvolvido em velocidade sem precedentes. E assim, um ano após os primeiros casos de Covid-19, já dispomos de diversas vacinas em uso nos diferentes países.

Que vacina é a melhor? Qual a mais segura? Precisaremos de doses periódicas de reforço? Essas são dúvidas que só análises de longo prazo poderão responder.

O importante, porém, é que as vacinas disponíveis reduzem a chance de transmissão e os casos graves da Covid-19. Podem evitar o colapso dos sistemas de saúde, salvar vidas e reduzir a velocidade da pandemia. Mas para que isso aconteça, precisamos que grande parte da população (pelo menos 70-80%) seja vacinada. Isso depende de vários fatores, como a disponibilidade, logística de distribuição e, sobretudo, adesão dos brasileiros.

O momento não é para cabos de guerra políticos e afirmações xenofóbicas. Precisamos de muitas vacinas, chinesas, russas, inglesas, americanas... quantas conseguirmos, desde que se mostrem seguras e eficazes. Peço licença aqui para citar um dado pessoal. Recebi as duas doses da Coronavac, o que me deixa feliz e otimista. Eu sentiria o mesmo se recebesse a vacina da Aztra-ZênecaPfizer ou a Sputinik V.

Como descobriu Edward Jenner no século XVIII, grandes iniciativas tem inícios pequenos. A varíola foi erradicada na década de 1970. Quiçá em breve erradiquemos este vírus pandêmico. 

(*) Professor da Faculdade de Medicina da Unifesp.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 25/02/21. Opinião, p.21.

 

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