terça-feira, 19 de outubro de 2021

"VACINA POUCA, MEU BRAÇO PRIMEIRO"?

Por Érico Arruda (*)

Diante da importância das vacinas contra a Covid-19 e da oferta tardia e escassa de imunizantes em nosso País, é preciso ouvir a ciência, para definir a melhor estratégia para rápida e máxima proteção de todas e todos, incluindo os médicos.

Será que a recente sondagem de opinião realizada pelo Sindicato dos Médicos do Ceará sobre 3a. dose de vacina representa de fato a posição da categoria? Presume-se que o maior percentual dos participantes da enquete seja alinhado com a atual diretoria, que já demonstrou suas posições bolsonaristas, negando bastante as evidências científicas.

Claro que profissionais de saúde precisam estar protegidos, mas a maioria já recebeu a 2a. dose. O contexto epidemiológico prevê necessidade, para toda a população mundial, de outras doses em algum momento.

Com a grande escassez atual, porém, reivindicar agora uma 3a. dose para alguns, quando as evidências ainda não apontam essa necessidade imediata, mesmo para o profissional de saúde que não tenha alguma condição adicional (idoso ou imunodeficiente), não nos parece ético. É quase o velho jargão de "farinha pouca, meu pirão primeiro".

Se menos de 30% da população recebeu duas doses da vacina, essa é a verdadeira luta agora. Acelerar a vacinação para diminuir as chances de adoecimento, transmissão, novas variantes. Uma 3a. dose para a população em geral é desafio futuro. Exigi-la agora para alguns, quando tantos não receberam nenhuma, não é razoável! Parece um excesso de corporativismo.

Outro grande equívoco da sondagem feita pelo Sindicato é sugerir que uma vacina seria "melhor" que outra. No contexto de escassez, perguntar a cada médico qual vacina preferiria tomar é algo absolutamente estéril, porque não é viável escolher.

E porque não há estudos comparativos entre os tipos de vacina, capazes de garantir que uma marca seja mais eficaz que outras. Os dados são de populações diferentes, em momentos distintos, impossibilitando comparar eficácia.

Melhor seria se o Sindicato promovesse uma campanha de incentivo à vacinação dos muitos médicos que, infelizmente, recusaram o imunizante até agora.

(*) Médico infectologista. Doutor em Doenças Infecciosas e professor da UECE.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 17/09/2021. Opinião. p.22.


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