Por José Eudes Baima Bezerra (*)
"O Governador Cid se dedicou a um rosário de desqualificações, não só do
trabalho dos docentes e técnico-administrativos, mas inclusive da gestão da
instituição"
Produto da greve que paralisou
por 90 dias todos os segmentos das três universidades estaduais cearenses,
ocorreu nos dias 17 e 18 de fevereiro o seminário “O papel da Universidade
Estadual do Ceará (Uece) no desenvolvimento do Estado”. O seminário reuniu
cerca de 450 membros da comunidade universitária com o governador Cid Gomes e o
staff da Secitece. Estruturado em mesas temáticas, conforme os termos do acordo
que pôs fim à greve, o seminário permitiu ampla visão do lugar crucial que a
Uece (além da UVA e da Urca) cumpre na produção científica, cultural e
tecnológica que formam a base do desenvolvimento do Estado. Como lembrou o
reitor Jackson Sampaio em sua exposição, são raros os aspectos da vida
institucional cearense que não tragam impresso o DNA da Uece.
A participação do governador,
contudo, foi decepcionante. Desde sua primeira e longa fala, passando por todas
as intervenções, se dedicou a rosário de desqualificações, não só do trabalho
dos docentes e técnico-administrativos, mas inclusive da gestão da instituição.
Nesse labor, Cid Gomes demonstrou vasto desconhecimento do trabalho e da lógica
que comanda a atividade acadêmica. Praticamente toda a sua “contribuição” pode
ser resumida à tentativa de impor um reordenamento da carga-horária docente de
forma a aumentar a jornada do professor na sala de aula, em detrimento do tempo
gasto na pesquisa, na extensão e na gestão da própria instituição.
A ofensiva de Cid Gomes nesta
direção visa a demonstrar a inutilidade de repor os 163 professores que fazem
falta hoje à Uece por conta de processos de aposentadoria e por força de
mudanças curriculares advindas da legislação nacional. No mundo perfeito do
arrocho fiscal, Cid faz questão de ignorar o fato de que a Uece detém
significativo lugar na pesquisa acadêmica nacional, com nove mestrados
profissionais, 17 mestrados acadêmicos e nove doutorados, tanto na Capital como
no interior, com contribuição efetiva, tanto no campo das ciências básicas,
como no da geração de tecnologia.
As distintas falas do
governador, para além da grosseria e da falta de educação e urbanidade que
surpreenderam a alguns, projeta um grave risco à continuidade deste projeto que
caminha a duras penas, que é a Uece. Infelizmente, a imprensa acabou passando
por alto pelo centro do debate, a sobrevivência ou não da universidade como tal,
e preferiu se concentrar numa provocação grave, mas circunstancial, a ameaça de
transferir o curso de Medicina da Uece para a jurisdição federal. Proposta
inaceitável, funcionou, contudo, apenas como o prosaico bode na sala, para nos
distrair do intento governamental de fazer a Uece retroceder à condição de
colégio de terceiro grau.
(*) Professor adjunto
da Universidade Estadual do Ceará
Fonte: O Povo, Opinião, 13/3/14. p.7.
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