quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

MÃE, QUANDO EU CRESCER, QUERO SER ENFERMEIRA

Por Pe. Ermanno Allegri (*)

O que leva uma adolescente a querer abraçar, hoje, uma profissão de alto risco? Ela vê a vizinha sair cedo para o hospital e voltar à noite cansada. A jovem fica uns minutos falando do medo daquela profissional ser infectada ou de levar a doença para casa; da falta de condições para o atendimento; conta do estresse dela por assistir impotente às mortes diárias, mas, ao mesmo tempo, ressalta a felicidade profunda em ver os infectados voltarem para suas famílias.

Cerca de oito mil dos 160.000 mortos pela pandemia no Brasil eram funcionários da saúde. Uma categoria massacrada pelo Covid-19. Como fazem falta os 10.000 médicos cubanos chutados pela crueldade do governo.

Penso nas palavras de Jesus: "Ninguém tem mais amor do que aquele que dá a vida pelos irmãos". Então, os profissionais da saúde são verdadeiros santos e mártires. Nessa pandemia, com os templos fechados, eles celebraram milhares de missas, dia e noite, lá nos hospitais. Fora dos espaços religiosos, acontece o lava-pés de Cristo.

Nesse contexto trágico, Francisco abre a porta à esperança. Na encíclica Fratelli Tutti (Nº 54) escreve: "Apesar das sombras densas, Deus continua a espalhar sementes de bem na humanidade. A recente epidemia permitiu valorizar tantos companheiros e companheiras de viagem que doaram a própria vida (...): médicos, enfermeiros e enfermeiras, farmacêuticos, empregados dos supermercados, pessoal de limpeza, cuidadores, transportadores, homens e mulheres que trabalham para fornecer serviços essenciais e de segurança, voluntários, sacerdotes, religiosas... compreenderam que ninguém se salva sozinho."

E despertou os poderosos: 92 super-ricos de sete países, intitulados de "milionários pela humanidade", publicaram uma carta aberta em 13 de junho pedindo que suas fortunas sejam taxadas para os governos investirem no combate à Covid-19 e que essa cobrança se torne permanente. "A humanidade é mais importante do que o nosso dinheiro", escreveram. Importante ressaltar: Não há nenhum dos 200.000 milionários brasileiros entre os signatários.

Hoje, é necessário construir centenas de escolas e cursos universitários para repor a falta de profissionais para restaurar o estrago que o governo fez na área da saúde. Mas há verba para isso? Há sim, de sobra. Os milionários brasileiros deveriam procurar seus colegas e assinar a carta.

E nós, pais, mães, educadores, comunidades temos a coragem de lançar para os jovens o desafio de descobrir dentro de si o que há de melhor para orientar seu futuro profissional, seu papel social, tanto como atividade de subsistência, quanto de doação aos excluídos e abandonados? Essa é a revolução espiritual necessária; espiritual não só como algo religioso, mas como vivência do amor, da compaixão, da bondade, da capacidade de lidar com o novo que acontece e saber seu lugar na sociedade, na casa comum planetária.

Sairemos melhores ou piores desta pandemia? A fraternidade da carta de Francisco diz que é preciso salvar o ser humano enquanto ser humano, com liberdade e audácia para provocar resistência; assim como insurgência moral e espiritual frente à irracionalidade e a truculência do capital e seus governos. Com essa formação, será fácil escolher ser enfermeira. 

(*) Padre diocesano, coadjutor na paróquia da Tabuba, Caucaia, e do Movimento Igreja em Saída.

Fonte: O Povo, de 13/11/2020. Opinião. p.19.

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