sábado, 29 de agosto de 2009

AMIZADES FAMILIARES NO OTÁVIO BONFIM

O bairro Otávio Bonfim serviu de palco para os acontecimentos principais da vida do casal Luiz Carlos da Silva e Elda Gurgel, pois nele viveram por mais de seis décadas, trazendo ao mundo e criando uma extensa prole. Elda chegou no bairro ainda muito menina, ao passo que Luiz veio no início da juventude; mas, ele tinha tanta afeição ao logradouro que costumava dizer que somente o largaria quando fosse para a sua última morada, situada na necrópole de São João Batista.
Era, nos anos 1940/50, um bairro claramente residencial, posicionado nas proximidades da área central de Fortaleza, sendo residência maiormente de famílias de classe média da capital cearense. Nessa época, não havia apartamentos no bairro e as famílias habitavam casas modestas, quase sempre contíguas, que abrigavam os muitos filhos que insistiam em nascer, nas décadas de 1950/60.
Havia bastante interação entre as famílias, que se conheciam e compartilhavam de muitos momentos comuns, daí ser natural que, no seio delas, florescessem amizades e até namoros entre os filhos de casais amigos, porque com tantos rebentos haveria de ter compatibilidades, etárias e de gênero, para possibilitar tais relacionamentos. Permeando tudo isso, estavam as ações encetadas pelos frades franciscanos, sediados no bairro, que catalisavam as intervenções no campo religioso e no terreno social.
Eram amigos, ou integrantes do circuito prévio de amizades de nossos pais, de algumas famílias constituídas, que residiam no bairro há um certo tempo, como os Botelho Ramos, Camelo Parente, Medeiros Comaru, Sales Rocha, Rocha Alexandre, Castro Costa, Cavalcante Albuquerque, Passos Lima etc. Outras amizades foram agregadas, a partir da condição de vizinhança domiciliar, a citar: Acioli, Félix de Souza, Macedo, todos da Rua Justiniano de Serpa, e os Teixeira Lima, Martins Brasil, Jucá Nogueira, Marques Nogueira, moradores da Rua Domingos Olímpio e de suas imediações.
A maioria desses lares figurava com muitos filhos, quase sempre estudantes de escolas públicas, ainda detentoras de certa credibilidade de ensino, porque os pais, em geral, lutavam com muitas dificuldades financeiras e não conseguiam arcar com os gastos de manutenção simultânea de vários meninos em colégios particulares de Fortaleza; até mesmo os que podiam bancar a escola privada de algum dos filhos evitavam fazer escolhas que gerassem privilégio para uns em detrimento de outros de sua própria linhagem.
A despeito desses percalços, pode-se afirmar, categoricamente, que, “grosso modo”, esses pais de família souberam compensar as restrições de recursos materiais domésticos, provendo uma educação plena de valores morais e espirituais, direcionada para sobrepujar os entraves que a vida expõe, ao tempo em que encaminharam a maior parte dos seus para a formação universitária, nas poucas faculdades existentes, naquele período.
As famílias de então exibiam com júbilo, e quiçá com um toque de orgulho, a cada ano, os seus rapazes de cabeça raspada “a zero”, indicativa da recente aprovação nos concorridos vestibulares, e motivo de envaidecimento do “bicho”, que tratava de cobrir a sua calvície, temporária e artificial, com uma boina de calouro.
Com efeito, a quantidade de médicos, advogados, engenheiros, veterinários, agrônomos, economistas, dentre outros, despontados no Otávio Bonfim, evidencia o acerto de tantas famílias na educação e na preparação de seus jovens para a vida.
Marcelo Gurgel Carlos da Silva

* Publicado in: O Povo. Fortaleza, 29 de agosto de 2009. Jornal do Leitor. p.2.

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