quarta-feira, 20 de maio de 2015

O CRACK DAS VASTAS PERIFERIAS


José Jackson Coelho Sampaio (*)
Quanto mais desenvolvimento político, econômico, social e técnico, mesmo em cultura de exploração do trabalho de muitos para o gozo de poucos, mais se necessita de tempo para o domínio das tecnologias. O séc. XIX exigiu infância, o XX exigiu juventude, o XXI exigirá vida inteira para o domínio das habilidades e da ética, na tensão entre prazer, riqueza e poder. As novas elites exigem mais tempo para formação, trabalho e consumo, dimensão que dá sentido ao processo produtivo de agora, reformulando o papel dos excluídos.
A divisão de classes é global e opõe países: centrais, periféricos, agrários, industriais, financeiros, daí o comportamento elite de uns, puritano de outros e servil da maioria. Os USA, por exemplo, descobriram seus tardo-adolescentes, alienados e individualistas, consumindo as drogas naturais produzidas na periferia do mundo. Então avocaram poder bélico para intervir na Turquia, Afeganistão, Colômbia, resultando em negócios globais, apoiados em forças paramilitares, além de focarem a garra anglo-saxã para novo cluster: as drogas sintéticas, frutos da ciência.
Se a humanidade gosta de droga, o comportamento hedonista massificou-se, a lógica do consumo tornou-se geradora de sentido, a competência técnica multiplica por zilhões a produção das mercadorias, a escala de lucro tornou-se estratosférica, os novos jovens têm hábitos urbanos e afeitos a produtos industriais e lhes foi dito que remédios os salvam de dor, infelicidade e morte. Então surge a cocaína branca dos salões e o barato do crack barato das periferias.
Na economia da dependência química, as máfias racham territórios. Assim, áreas ricas ficam para a cocaína e as pobres tornam-se pasta de crack, com sua côrte de zumbis pelas ruas. Os ditos marginais alimentam ciência, indústria, preconceitos – como fracassados, degenerados – e podem justificar novo tipo de asilo. Assim, todas as ações sociais são defendidas, não pelos méritos próprios, mas pelo efeito estético-higiênico de “tirarem drogados das ruas”.
(*) Professor titular em saúde pública e reitor da Uece.
Publicado In: O Povo, Opinião, de 9/4/15. p.6.

Nenhum comentário:

 

Free Blog Counter
Poker Blog