sexta-feira, 5 de agosto de 2011

A COPA E A CONTA

Por Ricardo Alcântara (*)
Mesmo com o maior número de títulos, a seleção brasileira – “pátria de chuteiras”, na imortal definição de Nelson Rodrigues – não joga uma Copa do Mundo em casa há 60 anos (o México, também pobre, já sediou duas).
Como realizar o evento era um desejo nacional reprimido, não foi difícil para o ex-presidente Lula convencer os brasileiros de que a empreitada, mais do que uma boa ideia, era quase um motivo de afirmação nacional.
Topamos, claro, mas não sem antes sermos seduzidos ainda pela ressalva providencial de dois apelos irresistíveis e que podem ser resumidos em um só: ficaríamos com todo o saldo físico de um conta compartilhada.
O primeiro é que a reforma dos estádios não seria feita com dinheiro público. O segundo: a realização do evento desencadearia um agudo processo de construção de obras de infraestrutura. Como se diz por lá, sounds great!
Como se pode ver, a versão que nos foi oferecida garantiria não apenas o milagre da multiplicação dos pães, mas outro, ainda maior: o circo seria integralmente financiado por conta e risco da iniciativa privada.
Estamos ainda há três anos do início do evento e a perspectiva já é bem mais modesta. Tudo indica que pagaremos com receita própria para receber benefícios desproporcionais ao nosso esforço de investimento.
Qualquer cidadão bem informado percebe – pelos prazos restantes, pelos recursos empenhados e pela conversa de sempre – que vem por aí uma drástica redução no conjunto previsto de reformas urbanas.
Para fechar a conta do engodo, sabe-se melhor agora o que todos já sabiam antes: a reforma e construção dos estádios serão bancadas, sim, com o aumento do endividamento público. Estádios privados, inclusive.
No ambiente generalizado de ufanismo, corre o risco de pegar fama de chato quem se atreva a antecipar uma perguntinha boba: como serão custeadas, a partir de então, as sofisticadas arenas esportivas construídas? Deixa prá lá.
Para piorar ainda mais o estado das coisas, com essa bolinha mixuruca que a seleção brasileira anda jogando, até mesmo a alegria de levantar a taça tornou-se uma incerteza. É visível a falta de envolvimento dos caras.
No contexto desse cenário, o movimento tuiteiro “Fora Ricardo Teixeira” é risível. Beira a alienação. A fulanização da crítica despreza a extensão das responsabilidades para aderir ao escapismo de uma catarse estéril.
(*) Jornalista e escritor. Publicado In: Pauta Livre.

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