Por Luiz Gonzaga Fonseca
Mota (*)
Ricardo e
Zé, nordestinos, resolveram morar em São Paulo. O primeiro foi ocupar um cargo
na diretoria de uma sólida e grande empresa. Zé, semianalfabeto, viajou com a
coragem e a cara, além da mulher e um filho de três anos, na esperança de
conseguir trabalho. Na cidade grande, Ricardo, executivo importante, analisava
e discutia diariamente os agregados econômicos do País, as taxas de juros, de
câmbio, o “spread” bancário, enfim o comportamento dos indicadores com vistas à
obtenção de lucros crescentes. Morava num bairro nobre da Capital. Possuía
belos automóveis, lanchas, haras, aeronaves e frequentemente viajava ao
exterior, a negócios ou fazer turismo. Seu padrão de vida era muito elevado;
não sei se o nível de felicidade também o era. Por sua vez, Zé conseguiu, por
acaso, uma colocação de auxiliar de portaria no condomínio habitado pelo dr.
Ricardo. O pobre zelador ficou muito feliz. Recolhia o lixo, cuidava do jardim,
vigiava os portões e ganhava o salário mínimo, com a promessa de ter a carteira
assinada. Zé, infelizmente, não conseguiu estudar. Foi vítima, como muitos, das
injustiças da sociedade. Passava os dias servindo aos moradores do rico
condomínio paulistano e as noites, com a mulher e o filho na favela Jardim
Ângela, dormindo num barraco coberto por papelão e feito de madeira usada. O
mais triste aconteceu: numa noite que Ricardo recepcionava a “high society”, o
filho de Zé, subnutrido, com pneumonia, faleceu na fila do SUS. Pobre Zé,
vítima também da perversa distribuição de renda. Vida sem esperança e
solidariedade. Ademais, para uma criança ser saudável e promissora, é fundamental
uma boa educação cognitiva e comportamental. Assim, quem educa está praticando
um ato de amor a Deus. Segundo Santo Agostinho: “O supérfluo dos ricos é o necessário dos pobres”.
(*) Economista. Professor aposentado da UFC. Ex-governador do
Ceará.
Fonte: Diário
do Nordeste, Ideias. 24/1/2020.
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