quarta-feira, 18 de agosto de 2021

APESAR DE HOJE, COMO DIZ A CANÇÃO POPULAR

Por Sofia Lerche Vieira (*)

Talvez seja impossível identificar exatamente quando extremismos passaram a pautar comportamentos e ações de nossa convivência diária.

Se é verdade que tais ideias costumam estar associadas ao fascismo, hoje possuem características próprias, de algum modo associadas à inserção das redes sociais no cotidiano dos tempos atuais.

Acompanhando a trajetória de grandes plataformas de expressão, como o Facebook e o Instagram, observa-se que representam não apenas estratégias poderosas de comunicação, como mecanismos de acirramento de conflitos.

Na tribuna de uma rede social todos aparentemente têm o mesmo poder de voz, embora os perfis falsos e robôs estejam aí para afirmar o contrário.

Se todos se julgam legítimos detentores da verdade, ainda que esta seja sujeita a controvérsias, a pretensão de impor opiniões é quase irresistível, sobretudo numa sociedade onde a convivência democrática é ainda tão frágil.

Nos pequenos e grandes grupos, pautados por interesses comuns, sejam eles familiares, profissionais, políticos e de outra natureza, uma significativa parcela de participantes se faz porta-voz de pensamentos radicais.

Em tais casos, ou os demais concordam com as opiniões predominantes ou, se veem na contingência de retirar-se ou, pior ainda, serem "cancelados". Certo é que a tolerância vai perdendo espaço e cedendo lugar a uma cultura de ódio.

A cultura do ódio a esse outro que pensa diferente, corrompe relações e põe em xeque elementos preciosos da convivência social. A empatia, qualidade essencial de nossa humanidade, vai se tornando escassa e rarefeita.

Em tempos como os que vivemos, quando o luto pela perda de tantas vidas ceifadas pela Covid-19, deveria inspirar solidariedade e compaixão, ficamos à mercê da intolerância, permitindo que seu império se alastre.

Em meio a esse cenário desalentador, importa não perder a fé de que o melhor antídoto contra o extremismo é exatamente a possibilidade de restabelecimento do diálogo e da capacidade de escuta entre as pessoas.

Afinal, como diz a canção popular: "amanhã, apesar de hoje, será a estrada que surge pra se trilhar". 

(*) Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Uece e consultora da FGV-RJ.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 21/06/21. Opinião, p.20.

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