segunda-feira, 10 de novembro de 2025

SER PROFESSOR: sim ou não?

Por Sofia Lerche Vieira (*)

Aproximando-se o Dia do Professor é oportuno refletir sobre o complexo desafio do exercício desta profissão. Vamos lá... Em todo o mundo os docentes representam um elevado contingente do serviço e do orçamento público. Embora sejam muitos, em poucos países seus salários são semelhantes ao de profissionais com qualificação similar. Por isso mesmo, hoje o magistério é profissão de pouca atratividade. Baixos salários, sobrecarga de trabalho e falta de reconhecimento social são elementos de uma desvalorização que provoca uma crise no próprio recrutamento de docentes.

Há uma grave escassez de professores. A Unesco estima que até o ano de 2030 serão necessários 44 milhões de novos docentes para repor os profissionais da educação básica que abandonaram o magistério ou se aposentaram.

Sendo este o panorama mundial, o que dizer do Brasil? A situação é semelhante a outros contextos e tem especificidades. Somam-se aos fatores já referidos o agravamento das condições de trabalho, sobretudo em territórios de maior vulnerabilidade social e econômica, ameaçados pelo crime organizado. O antes protegido espaço da escola hoje está em risco...

Outro agravante da crise do magistério é o aumento de contratações provisórias, criando muros invisíveis entre duas categorias de professores - os efetivos e os temporários, cujos direitos raramente são os mesmos. Estudos mostram que o quantitativo de temporários tem aumentado significativamente nos últimos anos e hoje, já representa a maioria do corpo docente da educação básica. Muitos estados e municípios estão encontrando nessa estratégia uma forma de driblar compromissos previdenciários acarretados pela "Lei do Piso" (Lei nº 11.738/2008).

A despeito de todas as dificuldades, contribuir para formar cidadãos e cidadãs permanece sendo o sonho de homens e mulheres que abraçam o magistério. Para que mais jovens digam "sim" são necessárias e urgentes políticas públicas que reconheçam e valorizem a profissão. A imagem positiva da sociedade, por sua vez, é a pedra de toque para que pessoas competentes e comprometidas queiram ser professores.

(*) Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Uece e consultora da FGV-RJ.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 6/10/25. Opinião. p.18.


domingo, 9 de novembro de 2025

Morre aos 88 anos o padre João Batista Frota

Com atuações em Santana do Acaraú, Massapê, Fortaleza e Sobral, o sacerdote se tornou conhecido pelo projeto humanitário "Cabra Nossa de Cada Dia"

Morreu na noite desta sexta-feira, 7/11, em Fortaleza, o padre João Batista Frota, aos 88 anos. A informação foi confirmada pela Diocese de Sobral, que, em nota, expressou seu pesar e destacou que padre João Batista Frota deixa “um testemunho luminoso de fé e dedicação à vida humana”. A causa da morte não foi divulgada.

Nascido em Santana do Acaraú, microregião de Sobral, João Batista foi morar ainda muito pequeno em Massapê. Foi ordenado presbítero em Roma no ano de 1966 e havia celebrado, em março de 2025, 59 anos de vida sacerdotal.

Ao longo dos anos, exerceu seu ministério pastoral nos municípios de Santana do Acaraú, Massapê e Sobral, consagrando-se como um dos religiosos mais queridos e respeitados do norte do Ceará.

Para além do trabalho na Igreja, o sacerdote envolveu-se em projetos voltados à educação, à juventude, à saúde e à paz.

Entre suas iniciativas mais emblemáticas está a campanha “Natal Sem Fome”, idealizada em 1994, que, ao longo de sua história, arrecadou toneladas de alimentos, roupas e brinquedos, distribuídos para inúmeras famílias ao redor de Sobral.

João Lucas Frota, sobrinho do padre, destacou, dentre as características marcantes do tio, a presença acolhedora. "Hoje nos despedimos do meu tio, Padre João Batista Frota, um homem que não apenas pregava a fé, mas a colocava em cada gesto, palavra e cuidado. Ele foi presença acolhedora, conselho sereno, abraço que confortava e exemplo vivo de amor ao próximo."

Também ressaltou que, dentre as homenagens recebidas em vida, o padre João Batista Frota foi agraciado com o Prêmio de Direitos Humanos, concedido pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, em 2011. E informou que o projeto “Cabra Nossa de Cada Dia” será, em breve, apresentado na COP-30, em Belém.

"Guardamos seu legado no coração e seguimos levando adiante o que ele nos ensinou: amar, acolher, caminhar com fé, ter humildade e ajudar ao próximo. Ele sempre repetia uma frase que agora faz ainda mais sentido: Enquanto temos tempo, façamos o bem”, afirmou.

Devido à sua popularidade, a despedida do religioso acontece em três municípios distintos e deverá reunir fiéis, amigos e autoridades locais ao longo deste sábado, 8/11.

Em Fortaleza, o momento ocorreu das 7 horas às 11 horas, na Funerária Ternura. Já em Sobral, acontece das 16h às 19 horas, na Igreja do Patrocínio.

Por fim, no município de Massapê, o velório ocorrerá a partir das 20 horas. O sepultamento está marcado para domingo, 9/11, às 11 horas.

Fonte: O Povo, de 9/11/2025. Cidades. p.16.

Em nome do Pai

Por Patrícia Soares de Sá Cavalcante (*)

Quando eu era pequena, tive um sonho. Vi meu avô Ari caminhando entre outras pessoas na rua. Ele não me via. Senti uma alegria imensa, mas também o receio de não encontrá-lo novamente. Era urgente contar ao papai que ele estava vivo.

Meu avô morreu antes de eu nascer. Cresci sabendo que era possível perder cedo demais alguém muito importante. Isso me angustiava. Por outro lado - talvez pela ausência precoce do meu avô - ganhei um pai amoroso, cuidadoso, que nos transmitiu o gosto e o valor da intimidade.

Embora não o tenha conhecido, o vovô sempre esteve presente em nossa mesa. Papai, um exímio contador de histórias, fez-nos imaginá-lo vividamente: um homem inteligente, culto, à frente de seu tempo, irônico, dedicado à família e extremamente corajoso.

Já adulta, numa tarde na Livraria da Vila, em São Paulo, tomávamos café quando papai me contou algo que eu não sabia:

- Minha filha, depois que o papai morreu, sempre que eu tinha alguma dúvida em um momento difícil, eu sonhava com ele. No sonho, ele me dava a solução. Depois, continuei a sonhar, mas ele já não falava nada. Com o tempo, deixei de sonhar.

Ah, como eu queria sonhar com ele de novo! - disse, rindo emocionado. Não sei se percebeu a minha comoção. Aquilo me atravessou: por um instante, senti a dor que ele carregava pela ausência precoce do pai. Mas o meu pai fez da ausência, presença. Há 25 anos, em um momento de recomeço profissional, homenageou o próprio pai dando o seu nome à Escola Ari de Sá Cavalcante.

Desde então, honra esse legado oferecendo um ensino de excelência e transformando o futuro de tantos jovens estudantes. Em 2025, recebeu o Troféu Sereia de Ouro, concedido pelo Grupo Edson Queiroz, e, com humildade, reconheceu que o prêmio pertence a todos os que fazem a escola.

Na vida íntima, preserva a memória do vovô através de um amor devotado. Talvez seja esse o sentido mais profundo do amor: o desejo - e a capacidade - de manter viva a lembrança do outro em nós.

"O beijo do meu pai, o primeiro que não teria em toda a vida. Ele também veio beijar--me. Não me deixou em um instante ainda. Mora em mim." Blanchard Girão.

(*) Médica psiquiatra.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 7/10/2025. Opinião. p.18.

sábado, 8 de novembro de 2025

POSSES DE ACADÊMICOS HONORÁVEIS E DE QUATRO NOVOS MEMBROS TITULARES DA ACEMES

A Academia Cearense de Médicos Escritores (ACEMES), sob a presidência do médico e professor Luiz Gonzaga de Moura Jr., e tendo por mestre de cerimônias o jornalista Vicente Alencar, realizou anteontem (quinta-feira), dia 6 de novembro de 2025, no Auditório Humberto Cavalcante do Ideal Clube, em Fortaleza-CE, a “Solenidade de Posse” de quatro novos membros titulares, recentemente eleitos em concorrido edital, para o preenchimento das vacâncias decorrentes da passagem de quatro confrades para o quadro funcional de acadêmico honorável.

Como primeiro orador da noite, por especial deferência do presidente Luiz Gonzaga Moura Jr., o acadêmico Marcelo Gurgel recebeu a designação para saudar os primeiros membros honorários do sodalício: José Jackson Coelho Sampaio (Cadeira 15), Josué Viana de Castro Filho (Cadeira 19), Lúcio Gonçalo de Alcântara (Cadeira 21) e José Mauro Mendes Gifoni (Cadeira 37).

De princípio, no intuito de se evitar repetição dos dados curriculares dos membros honoráveis, esse orador cientificou que os aspectos biográficos integravam o seu elóquio, enquanto os componentes bibliográficos dos homenageados seriam objeto das falas dos novos membros titulares que os sucederiam nas respectivas cadeiras.

Em nome dos novos membros honoráveis, comportou ao Acad. Lúcio Gonçalo de Alcântara efetuar a fala de agradecimento.

O momento seguinte foi reservado à concessão do titulo de membro honorário da ACEMES ao médico e deputado estadual Heitor Ferrer, em reconhecimento à sua profícua atuação em prol da cultura e da literatura cearenses, consoante foi destacado pelo confrade José Lima na saudação ao novo honorário, sendo subsequenciado pelo discurso do homenageado.

O ápice do evento foi a posse dos novos membros titulares, que foram recepcionados, em nome da ACEMES, pelo confrade Arruda Bastos, que salientou os títulos e currículos literários dos recipiendários.

Foram empossados os acadêmicos Henrique Leal (Cadeira 15), Antonio Carlos Chaves (Cadeira 19), Sidneuma Ventura (Cadeira 21) e Fátima Azevedo (Cadeira 37), a eles cabendo discorrer sobre as biografias dos seus respectivos patronos Hyder Correia Lima, Gerardo Frota Pinto, João Otávio Lobo e Geraldo Gonçalves, bem como traçar aspectos bibliográficos dos últimos ocupantes dessas cadeiras, a saber: Jackson Sampaio, Josué de Castro, Lúcio Alcântara e Mauro Gifoni.

O ritual da posse foi concluído com a leitura conjunta do Juramento, pelos recém-empossados, já portando pelerine e medalha da ACEMES, fato acompanhado pelo expressivo número de acadêmicos que, com suas honrosas presenças, prestigiaram o evento.

Ao término da sessão solene, o presidente Luiz Moura fez o seu pronunciamento e declarou o encerramento da solenidade, convocando os acadêmicos presentes para a foto oficial e anunciando que os novos membros titulares recepcionariam seus convidados com um coquetel de congraçamento.

Acad. Marcelo Gurgel Carlos da Silva

Membro titular da ACEMES – Cadeira 24


As Nações Unidas em um mundo em desordem

Por José Nelson Bessa Maia (*)

No momento em que o presidente do Brasil, seguindo a tradição, abre a Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), mas num contexto de contencioso com os EUA, a diplomacia global aguarda com ansiedade o teor do discurso. Em geral, o Brasil tem usado esse espaço para analisar a conjuntura internacional, projetando sua visão de mundo e defendendo temas estruturais, como o combate à fome, o desenvolvimento, o enfrentamento das mudanças climáticas e a reforma de instituições multilaterais.

A primazia na abertura dos discursos na ONU dá de fato ao Brasil uma visibilidade importante. É um canal privilegiado para expor suas prioridades de política externa e marcar posição em temas de relevância global diante de chefes de Estado, delegações estrangeiras e da mídia internacional.

No entanto, apesar da importância da Assembleia Geral da ONU, as organizações internacionais parecem atualmente esvaziadas e inativas. A onda de cortes de ajuda humanitária feita pelo atual presidente dos EUA tem atingido a ONU e outras instituições multilaterais. O Secretariado da ONU e as suas agências já estão despedindo funcionários, suspendendo programas de ajuda e alertando que oferecerão muito menos ajuda às pessoas e países mais vulneráveis ??em todo o mundo.

Na verdade, diplomatas e analistas de geopolítica especulam que os EUA poderão reduzir ainda mais sua contribuição financeira à ONU e/ou até mesmo abandoná-la, sem que nenhum outro país pareça estar disposto a assumir prontamente a parcela da contribuição americana de manutenção da organização. No entanto, para aqueles preocupados com o risco de colapso da ONU convém analisar a literatura acadêmica sobre a resiliência dos organismos internacionais.

As instituições com um grande número de membros, como a ONU, superam as que envolvem apenas alguns estados membros. No ano em que completa 80 anos de sua fundação (2025), a ONU tem a vantagem da longevidade e da universalidade dos seus membros. Mas as partes da ONU que provavelmente se sairão melhor ao eventual colapso financeiro são suas agências mais técnicas, que lidam com formas funcionais de cooperação e definição de normas, e não órgãos altamente políticos como o Conselho de Segurança e as agências especializadas que fornecem ajuda externa.

Nesse cenário de fraqueza da ONU e de desordem global, o discurso do presidente do Brasil deverá aproveitar a tribuna para reiterar a defesa da democracia, da autodeterminação dos povos e do multilateralismo. Em suma, expressar uma firme defesa da não ingerência nos assuntos internos dos países e de respeito à soberania das nações, assim como da necessidade de restabelecer os mecanismos financeiros e o poder das organizações de cooperação internacional.

(*) Ex-secretário de Assuntos Internacionais do Governo do Ceará, mestre em Economia e doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (UnB) e, atualmente, consultor internacional.

Fonte: O Povo, de 28/09/25. Opinião. p.21.

sexta-feira, 7 de novembro de 2025

No céu dos bonecos, dizendo "me aguarde!"

Por Tarcísio Matos (*)

Se tomarmos como base o lado trash do “bonequeiro” - sujeito presepeiro, bagunceiro, perturbador da ordem, praticante de arruaças, que escandaliza e apronta rolo -, o criador Augusto César Barreto Oliveira, pessoa física, passou longe. O “gigolô de Seu Encrenca”, ao contrário, era da paz: manso, sensível, generoso, disciplinado, profissional do riso mais único que raro: talentoso, criativo, inspirador. Amigo de todas as horas, tinha a piada na ponta da língua e uma gaitada contagiante.

Quando entrava em cena acompanhado de um boneco, a transformação era certa, esculhambação graúda: plateia se abrindo em gargalhadas com ocara “munganguento”, fuleiro, ferino, gaiato - “ventriloquente”.

Pernambucano de nascimento, o mestre do mamulengo chegou ao nosso estado há 45 anos e nunca mais deixou de botar seu impagável boneco. Figura da televisão (Encrenca, Cassimiro, Chibata) e dos palcos (Fuleiragem), era âncora plantonista: as piadas vinham, sobretudo, do dia a dia. Entre os bordões, “Me aguarde!” foi o mais famoso. Havia outros: “Tabaco demais é fumo!”, “Em matéria de tal e coisa, tudo mais é isso mesmo!”, “É fumo, meu filho!”

Internalizando o jeito cearense de fazer humor, ele se referenciou na terra de Quintino e Chico Anysio, fazendo o Brasil “se lascar de rir” das potocas que criava - roteirista dos próprios personagens. Augusto, sem perder o sotaque do torrão natal, fez escola. Botou “boneco federal”, mantendo constância e disciplina.

A televisão acelerou sua fama. E foi lá, na Jangadeiro, que tive a honra de trabalhar com ele, dando o grau em esquetes, partilhando e aprimorando causos. Aprendi muito com esse Bonequeiro de muitos bons bonecos. Fizemos rádio, CD de piadas e de músicas.

Uma dele. Na Paraíba, onde fez o “Seu Chibata”, o noticiário falava da fabricação, envase e comercialização de cachaça caseira por ‘microempresários encarcerados’, tudo dentro do presídio de segurança máxima. Como de praxe, o boneco pega o telefone e disca para o secretário de Polícia:

- Quer dizer que estão comercializando cachaça falsificada no presídio de segurança máxima, Sr. Secretário? Pois olhe, bota esses homens na cadeia!

(*) Jornalista de O Povo.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 6/11/25. Opinião.p.16.

Crônica: “A cota de sabedoria e bom humor de dona Cotinha” ... e outro causo

A cota de sabedoria e bom humor de dona Cotinha

Traçar uma "galinhazinha pé dura" com pirão numa esquina de Jacarecanga, pense numa maravilha! E com um amigo contador de histórias de vera, vogando, "é de obrar e ver a ruma", como diria Procópio Straus no auge da fama. Penosa degustada lentamente para poder ouvir amiúde relatos cinematográficos do Kleber - ocorridos na sua Quixadá idolatrada, salve-salve. A primeira, o drama vivenciado por dona Cota (Cotinha dos íntimos), na maturidade de suas nove décadas bem aproveitadas.

Embora lúcida, mais que de repente, a laboriosa senhora ficou "assim, meio perturbada do juízo". Motivo ela teve: a possibilidade de os filhos e netos a internarem num abrigo de idosos mantido pela Congregação, confinamento "sem o menor futuro" para quem nunca foi chegada à monotonia respeitosa dos velórios.

Pois Kleber, conta pra gente o desfecho do encontro familiar que terminou em comédia!

- Tá. Certo dia, em meio à conversa entre os descendentes, no alpendre de casa, dona Cota, cheia de razão e outonos nos couros, após argumentar não suportar a "paz de cemitério" da instituição para onde a desovariam, sapecou uma pérola. Sabe o que ela disse?

- Não, mas faço vaga ideia...

- Isso mesmo. Falou na moral: "Se é de passar o tempo só comendo e rezando naquele lugar, prefiro um cabaré, ouvindo Bartô Galeno e beliscando uma zinebrinha"!

Goleiro que toma calmante toma bola

Para essa aqui o Kleber trouxe até testemunha: a Claudinha, colega de firma, companheira de um ilustre lateral direito do Quixadá, cujo nome, no idioma tupi, significa "água ou riacho dos camarões" - ninguém menos que o grande Potengi. E tem a ver com um primo dele, rapazote lá das brenhas que, conforme o povo do lugar, era "um 'ispecialista' em tibungar no Açude do Cedro". Por conta desse potencial, alguém achou que havia ali um goleiro. Quais especialidades as mencionadas? "Cangapé e tainha, características essenciais a um bom guarda-valas", reforçou um colega da escola.

Nonatim, assim chamado, seria o nome ideal pra quebrar galho grande demais: substituir o goleiro do time do distrito, contundido de uma panelada vencida, na partida decisiva de um torneio que durava já quase nove meses. Sabedor que Potengi era parente de Nonatim, o treinador pediu essa força:

- Convença ele, o jogo é daqui a pouco! Tamo sem goleiro! O homem é Nonatim!

- Deixe comigo! Vou à casa dele agora! Vai dar certo!

E deu, ou quase. Dez minutos de conversa e o tibungueiro e cangapezeiro topou a parada. Mas, como era de se esperar, Nonatim tremeu nas bases, afinal, foi tudo muito em cima da hora. Fato é que, faltando pouco pra iniciar a refrega, temos um "goalkeeper" se pelando de medo, tamanha a responsabilidade. Em risco de pedir pra defecar e sair, aconselhou-se com a mãe, que prescreveu a bandinha dum remédio "indicado para alívio sintomático da ansiedade, tensão e outras queixas...". Tomou meia "piula". Zero efeito. Que fez ele, no aperreio? Tomou a outra metade, e mais um comprimido inteiro.

Bola em jogo. Pra encurtar conversa, o placar já apontava 9 a 1 pro time adversário ao final do primeiro tempo. Contam que era assim: encostado na trave, o goleiro, totalmente zuruó, apenas virava a cabeça pra ver as bolas adentrarem à meta solenemente. Arquejando, não se bulia, feito "estauta". Claro, foi substituído por um qualquer da linha.

Potengi, no intervalo, foi ao vestiário (uma Kombi com as portas abertas) saber do apagão, fora ele o responsável por trazer Nonatim a campo.

- Macho, diabo foi aquilo?!? Num pegou uma?!?

- Poten... Eu quero é... uma reeeeede!!! - respondeu o frangueiro, olhos semicerrados, refestelado num tamborete.

Fonte: O POVO, de 10/10/2025. Coluna “Crônicas”, de Tarcísio Matos. p.2.

 

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