A democracia surge e se impõe a partir da expansão do número de seres humanos livres de escravidão, servidão e miséria, pelas pactuações de direitos e deveres. O Estado surge e se impõe a partir do desenvolvimento das cidades, quando, em nome do poder, da segurança e das transmissões intergeracionais de conhecimento, especializam-se os síndicos da sociedade. A política, porém, é constituinte arcaica da hominidade, quando primeiro se negociou quem caçaria, cuidaria das crias ou zelaria pelo sono da tribo.
Porém, no percurso, a política foi capturada pelos jogos de poder, no Estado; depois pelas corporações de ideias e interesses, nos partidos políticos; por fim, prática e simbólica, pela miríade de competências de intermediação, nos políticos profissionais. Daí, cada um de nós esqueceu que somos, radicalmente, cuidado, trabalho, técnica, ética e política. A própria democracia contemporânea nos amputa ao declarar que o poder “emana” de nós, não se realiza em nós/por nós.
No caso do Brasil, se o traçado histórico nos legou um Estado burocrático-autoritário, uma economia estado-dependente, industrializada, mas periférica, heterogênea, desigual, e grande parte dos políticos profissionais assumiram o papel de lobistas dos próprios interesses, como recuperar o protagonismo de todos e de cada um, superando a perversão das representações tornadas delegações acríticas e dos coletivos que, em nome da igualdade, sequestram totalitariamente a liberdade individual?
Como recuperar a política se aprendemos que tudo tem preço, inclusive dignidade e indignidade, pois o dinheiro tornou-se o equivalente geral de todo o valor; o assalariamento submeteu tempo e habilidades; e a ética do trabalho foi superada pela ética do consumo? A mercadoria e o dinheiro universalizaram-se, daí o desejo individual impulsivo também o fazer, como motivo bastante, justificativa em si mesma de toda prática.
as, enquanto a Copa do Mundo ainda atordoa uns e outros, preparemo-nos para as eleições de outubro.
(*) Professor titular em saúde pública e reitor da Uece
Publicado In: O Povo, Opinião, de 8/7/14. p.8.
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