segunda-feira, 17 de julho de 2017

ABUSO DE MEDICAÇÃO


Meraldo Zisman (*)
Médico-Psicoterapeuta
É inegável que a geração de crianças nascidas nesta era, a da tecnologia, é diferente das anteriores, e as escolas precisam se adequar ao novo perfil do alunato. Pais, mestres e/ou responsáveis necessitam repensar como devemos olhar as crianças e os adolescentes, na contemporaneidade. Adianto que sou do tempo em que se respeitavam os jovens como pessoas e, não os deixavam ao léu, largados, sem lhes impor limites e/ou regras. Por outro lado, as expectativas em relação às crianças e aos adolescentes aumentaram, sobremaneira, na tradicional classe média urbana brasileira. O que está ocorrendo é uma inversão de atributos. Todos se consideram capazes de educar, mas, na verdade, quando todos acreditam que educam ou ensinam, ninguém educa ou ensina.
Por motivos diversos, os pais e/ou responsáveis exigem, dos educandários, o que não conseguem realizar no interior dos lares. Acredito que, na maior parte das vezes, a capacidade de vencer na vida, é um desígnio dos pais, dentro dos lares. Atribuir essa tarefa aos professores representa uma fonte de insegurança. Os professores não estão capacitados, tampouco foram preparados, para desempenhar tal papel. Pais ausentes, que não podem dar a devida atenção aos seus filhos, procuram viabilizar, através de sua descendência, aquilo que desejavam ter alcançado.
Sendo assim, terceirizam seus planos e sonhos para as escolas. Sob pressão constante, as escolas e os profissionais das áreas psicológica, psiquiátrica e/ou psicopedagógica, passam a atribuir aos alunos, não poucas vezes, o diagnóstico de portadores de TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade ou DDA/TDA - Distúrbio/Transtorno de Déficit de Atenção com ou sem hiperatividade (salvo as exceções de praxe). Sendo assim, os jovens são medicados, desnecessariamente.
Uma matéria recente, publicada no jornal New York Times (dezembro de 2011), ressalta a escassez de medicamentos psicoativos. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS, 1981) cabe relembrar: os medicamentos psicoativos "são aqueles que alteram o comportamento, o humor e a cognição". Isto significa, portanto, que tais drogas agem, preferencialmente, nos neurônios, afetando o sistema nervoso central, ou seja, a mente humana.
O tratamento para o TDAH ou DDA/TDA leva, muitas vezes, à depressão, ao pânico, à ansiedade, aos distúrbios de linguagem, e outros mal-estares psiquiátricos. Os fabricantes das drogas Ritalina® e Concerta® (medicamentos que possuem o mesmo nome, no Brasil), reclamam da falta de previsão, por parte da Food and Drug Administration (FDA), a Agência controladora da produção e distribuição dos medicamentos, nos Estados Unidos. Neste sentido, a produção de drogas similares e genéricas, naquele país, como entre nós, apresenta-se bem menos dispendiosa, porém, não tem sido capaz de suprir a demanda do mercado norte americano.
Não compete a mim, como médico ou professor titular aposentado de Pediatria, discutir o poder da indústria farmacêutica, ou os abusos de diagnósticos. No entanto, confesso que me causou espanto, o fato de a medicação ter passado a ser receitada para melhorar o desempenho escolar de jovens que, em verdade, são completamente normais. Isto é um fato gravíssimo! Essas medicações estimulantes são, no presente, as drogas psiquiátricas mais receitadas para crianças e adolescentes. Daí, para o abuso de outras medicações assemelhadas, basta um pequeno passo.
(*) Professor Titular da Pediatria da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União Brasileira de Escritores (UBE) e da Academia Brasileira de Escritores Médicos (ABRAMES). Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha).

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