quinta-feira, 19 de junho de 2014

OS PANEGÍRICOS DE BOSSUET


O panegírico, originalmente, consistia de uma oração de louvor, em verso ou prosa, proferida nas assembleias gerais do povo grego. O exemplar mais famoso dessa fase é o Panegírico de Atenas, de Isócrates, lido nas festas olímpicas de 384 a.C., no qual o orador exibe um veemente elogio a Atenas e conclama todos os gregos a se unirem, esquecendo as suas diferenças intestinas, em uma luta contra o inimigo comum, os Persas.
Os romanos igualmente intuíram o apreço à oração laudatória em Panegyrici Latine, no qual foram agrupados doze autores de escritos elogiosos, elaborados entre os séculos II e IV, enaltecedores dos feitos imperiais.
No seu significado moderno, a expressão panegírico adquiriu conotação um tanto quanto pejorativa, designando, frequentemente, o elogio desmedido e interesseiro.
Em França, o panegírico encontrou também cultores de classe alta, como Bossuet, cujos panegíricos (ou louvores solenes) dos santos concorreram para reputá-lo como o maior orador sacro desse país.
Jacques Bénigne Bossuet (Dijon, 1627 – Paris, 1704), bispo e teólogo francês, foi um dos teóricos do absolutismo. Segundo ele, os reis recebiam poderes divinos para governar.
Jacques Bossuet nasceu em uma família de magistrados, em Dijon, onde recebeu educação no colégio jesuíta. Estudou teologia aos 15 anos no College de Navarre. Em 1652, foi ordenado padre e recebeu doutorado em teologia.
Seu pai obteve-lhe a indicação para cônego na Mogúncia (Metz), onde ficou popular como orador em controvérsia com os protestantes. Dividiu o tempo entre Metz e Paris até 1659 e a partir de 1660 raramente deixava a capital.
Famoso pelas suas pregações ao rei Luís XIV, foi designado para ser tutor do Delfim, o filho primogênito do rei, renunciando ao bispado de Condom, em que fora empossado em 1669. Foi nomeado conselheiro do rei, depois de aprender o funcionamento da política junto à corte real. Foi eleito para a Academia Francesa.
Foi designado, em 1681, bispo de Meaux e deixou a corte, mas continuou mantendo laços com o rei. Foi, então, um bispo dedicado, pregando e ocupando-se de organizações de caridade, poucas vezes deixando sua diocese.
Embora fosse um religioso, Bossuet era um formulador de ideias favoráveis ao poder do rei. Em seu livro “Política Tirada das Santas Escrituras”, de 1708, Bossuet defendia o direito divino, legitimador do governo da realeza.
Bossuet não colecionou, nem publicou os seus trabalhos oratórios. Somente as suas principais orações fúnebres foram publicadas durante a sua existência terrena. Ele nunca pensou em dar publicidade às centenas de discursos, que pronunciou do púlpito sagrado.
Ao compor esses discursos, destinava-os exclusivamente às pessoas que deviam ouvir sua palavra, sem jamais ocupar-se de perpetuar-lhes a lembrança, pois temia, talvez, obedecer a um sentimento de vaidade profana, caso os entregasse ao público. O seu fim, segundo o grande orador, era “ensinar santa e fielmente a verdade” e não ostentar a própria glória. (In: Prefácio da edição original de 1870).
Uma cuidadosa impressão de “Panegíricos”, de Bossuet, foi lançada em 2013, pela Castela Editorial, reproduzida da tradução do Pe. Clementino Contente, que foi publicada em 1909, por H. Garnier, sob o título: Orações Fúnebres e Panegíricos – Nova edição conforme o texto da edição de Versailles. Na recente edição, estão contidos em suas mais de quinhentas páginas, 23 discursos que discorrem sobre 18 santos católicos, alguns deles de ampla devoção no catolicismo brasileiro (e.g. S. José, S. Francisco de Assis, S. Pedro, S. Paulo) e outros de maior afeição no cenário hagiológico europeu, como S. Francisco de Sales, S. Francisco de Paula, S. Bernardo, Sta. Catarina etc.
Não se tratam de meras biografias de santos, redigidas de modo a assinalar feitos ou datas dos perfilados, mas de peças oratórias, riquíssimas em palavras de espiritualidade cristã, dignas de leitura daqueles que buscam aprimoramento e maior intensidade de sua vivência religiosa.
Enfim, uma leitura plenamente recomendada aos lucanos.
Marcelo Gurgel Carlos da Silva
Integrante da Sociedade Médica São Lucas
* Publicado In: Boletim Informativo da Sociedade Médica São Lucas, 10(82): 5, maio de 2014.

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