quinta-feira, 26 de junho de 2014

O DEDO SUJO DE QUEM RASPA EM MUITOS TACHOS


Por Ricardo Alcântara (*)

Preceito milenar do Oriente adverte: a nação perde o respeito quando os governantes perdem a vergonha. O secretário Ciro Gomes não honra os servidores estaduais de saúde com o exemplo mínimo de sua presença na secretaria que comanda.
De seus deveres não, mas da vida alheia cuida bem: ontem, em encontro da legenda de aluguel da qual faz parte, definiu (se o termo atende) as posições da ex-ministra Marina Silva sobre o agronegócio como “simpatiquinhas, mas mentirosas”.

À ex-ministra que ele agora aponta o dedo, sujo de raspar em muitos tachos, coube o mérito de iniciar políticas públicas ambientais que hoje rendem reconhecimento internacional ao governo para o qual ele oferece os favores de sua vassalagem.
Logo, a “simpática” e “mentirosa”, quando fora investida de responsabilidades públicas, prestou serviços cujas relevância e consistência não pactuam com a pior versão que sempre cabe ao (eternamente licenciado) secretário de Saúde simular.

Ele a acusa de “desconsiderar que o agronegócio paga a conta do nosso país”. Não: o agronegócio paga, e paga bem, a conta desse modelo que está aí, isto sim, porque quem paga a conta de um país é seu povo, trabalhando muito e falando menos.
Com isso, o ultraconservadorismo dos porta-vozes Kátia Abreu e Ronaldo Caiado recebe agora a providência de sua solidariedade a um discurso que além de desonesto, com sua adesão passa a agregar o valor do seu afamado oportunismo.

Alguma novidade? Até pouco tempo, o eternamente licenciado secretário de Saúde rasgava elogios a Marina Silva. Fez o mesmo com Fernando Henrique. Fez até com ACM, babalorixá de “tenebrosas transações”. Faz com todos, ao sabor da ocasião.
Ciro Gomes ataca Marina Silva, a quem quase santificara em outros momentos, porque ela se alia agora a quem lhe deu as contas, o governador Eduardo Campos, e a quem ele tentara esmagar, a liderança do PSB local de Sérgio e Eliane Novaes.

Melhor exemplo do oportunismo que aciona o instinto de preservação de Ciro Gomes não há do que sua relação política com Lula, a quem já definiu como “genial” e “idiota” diversas vezes, alternadamente, de acordo com as obrigações conjunturais.
Quem queira fazer um julgamento isento das posições da Rede Sustentabilidade, à qual Marina Silva deve obrigações programáticas, procure conhecê-la naquilo que ela declara como compromisso e encontrará posições diferentes do que foi dito.

Sem desconhecer a importância que o agronegócio tem para o país, ali se pretende somente submetê-lo a uma agenda de sustentabilidade que em nada transgride ao que é praticado nas nações mais desenvolvidas do espectro democrático.
Saber da relevância com que o agronegócio participa dos percentuais de crescimento não nos obriga a crer que ser a “fazendinha do mundo” é o destino final do país, que precisa diversificar mais os acentos em que apoia seu desenvolvimento.

Estranho, não? Aderido a uma sigla de aluguel, postado, portanto, ao lado de quem faz da vida pública um balcão de negócios, Ciro Gomes declarou seu “nojo” a Marina Silva e confessou “pavor” às suas ideias, “superficiais” e “irresponsáveis”.
Observado sob a perspectiva do que milhares de brasileiros foram às ruas revelar como suas aspirações cívicas, “nojo” tem a nação pelas companhias de Ciro Gomes. E “pavor” ela confessa aos políticos que se movimentam e se resolvem como ele.

(*) Jornalista e escritor. Publicado In: Pauta Livre.
Pauta Livre é cão sem dono. Se gostou, passe adiante.

Nenhum comentário:

 

Free Blog Counter
Poker Blog