É sempre árdua para mim a experiência de escrever. O texto científico sai com fluidez, incorporei uma fórmula de razoável elegância, mas como é árduo chegar aos resultados, à compreensão do problema, à escolha das ferramentas e dos caminhos da investigação, à composição dos resultados e seus diálogos com a literatura, à contextualização histórica, à clareza das conclusões, superação de teses, novas teses.
E na poesia? Tempos de
esterilidade, longos tempos e, então, depois de acúmulo de ansiedade subir do
estômago para os pulmões, surge um poema, quase inteiro, pouco trabalho depois.
Também pode ser que emerja do asfalto quente e sujo do cotidiano a rara flor de
um prazer, então sobe do coração para o cérebro uma alegria que se torna poema,
grande ou pequeno, pouco trabalho depois. Porém, como é difícil nomear.
Para romance, nunca tive tempo, espaço,
disciplina. O conto me atrai, mas é outro árduo e muito raro afazer. Tenho, no
computador, uns 30 deles, como colheita de 50 anos de labor consciente.
Angustia-me não conceber outro que não eu, pois sempre é minha história que,
submetida ao fórceps de inúmeras contorções ilusionistas, aparece, comparece,
reaparece. Quando outro surge, foi indevidamente apropriado. Também, como é
difícil nomear.
Aí vem a crônica. Dominei a
disciplina dos dois mil caracteres, com espaço. Temas não faltam: corrupção, terrorismo,
preconceitos contra o estranho, o estrangeiro, o diferente. Poderia também
concentrar-me no dicionário das iluminares de generosidade, compaixão,
solidariedade, respeito, autonomia, equidade, amor, dialética do bom e do belo
que pontuam o humano percurso. Mas a pletora de temas leva a resultado zero.
Neste abril da 12ª Bienal
Internacional do Livro de Fortaleza, depois de mais de 50 meses escrevendo
textos de opinião para O POVO, parece que escrevi uma crônica, com perdão de
Moacyr Scliar e de Airton Monte. Eis aqui a confissão, a confusão, incerta
impotência e a falta de inspiração como tema. E como é difícil nomear.
(*) Professor titular em saúde pública e reitor da Uece.
Publicado. In: O
Povo, Opinião, de 25/4/17. p.10.
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