domingo, 24 de dezembro de 2017

O legado de dom Aloísio Lorscheider, o brasileiro que quase foi papa

Por LUANA SEVERO, jornalista de O Povo

Aloísio Lorscheider foi defensor da democracia e chegou a enfrentar perseguições durante o Regime Militar (Foto Edimar Soares 10/10/2006)
 Dez anos se passaram desde a morte de dom Aloísio Lorscheider, arcebispo de Fortaleza entre 1973 e 1995, o primeiro brasileiro cotado para ser papa. O religioso teve parte da trajetória contada em manchetes de jornal
Quando menino do campo, no Rio Grande do Sul, Leo — que, futuramente, seria dom Aloísio Lorscheider — contava que seu maior medo era ser condenado ao inferno. Há exatos dez anos, em 23 de dezembro de 2007, ele encarou a passagem para o outro plano. Mas, pouco tempo antes disso, menos angustiado depois de uma intensa trajetória dedicada ao catolicismo, a respeito do que seria seu último destino, disse: “Estou preparado. Sou curioso, quero ver o outro mundo. Viver face a face com Deus será, sem dúvida, diferente”.
Primeiro brasileiro cotado para ser papa, dom Aloísio foi arcebispo de Fortaleza entre 1973 e 1995, até se mudar para São Paulo e, depois, de volta para o Sul. Seus 22 anos de experiência na Capital renderam manchete nos jornais locais desde que chegou ao aeroporto, vindo transferido de Santo Ângelo, no Rio Grande do Sul, onde assumiu o cargo de arcebispo pela primeira vez. Naquele dia, ao público entusiasmado que o esperava desembarcar do avião, ele adiantou, com a humildade de sua formação franciscana: “Vim para servir, não para ser servido”.
“Estou preparado. Sou curioso, quero ver o outro mundo. Viver face a face com deus será, sem dúvida, diferente" Dom Aloísio Lorscheider, pouco antes de morrer
Uma das suas primeiras contribuições, logo que assumiu a arquidiocese, foi reunir esforços para a conclusão da obra da Catedral Metropolitana, no Centro, que, até então, se arrastava há 34 anos — o templo começou a ser erguido em 1939 e foi inaugurado em 1978. Como o gaúcho já havia assumido empreitada semelhante em Santo Ângelo, logo ficou conhecido nacionalmente como “o bispo das catedrais inacabadas”.
Trabalho social
Outra urgência sentida por ele foi a de cuidar de quem vivia em extrema pobreza. A literatura conta que sua primeira obra social na Capital foi a campanha “Mensageiro da Fraternidade”. Numa kombi que circulava pelos bairros, pedia roupas e objetos em desuso. E, do alto-falante do automóvel, emitia: “O que sobra na sua casa está faltando na casa do seu irmão”. Além disso, a bordo de um fusca dirigido por ele mesmo, fazia questão de conhecer pessoalmente a vida das pessoas — independentemente se elas morassem na Capital, no Interior ou numa unidade presidiária.
Perseguição política
Defensor da democracia, dom Aloísio enfrentou perseguições durante o Regime Militar. Antes mesmo de chegar a Fortaleza, investigado por envolvimento com células comunistas porque pregava consciência política e igualdade entre os homens, foi preso em 1969 no que narrava ter sido o momento mais angustiante de sua vida. Futuramente, já na Capital, continuou a sofrer fortes intimidações como a vez em que tentaram arremessar uma bomba dentro da sua residência no anexo do Seminário da Prainha.
Relação com o Ceará
Enquanto morou em Fortaleza, o arcebispo constatou que “o cearense é um bravo”. E o povo, também, construiu uma boa relação com dom Aloísio. Tanto que, no discurso de despedida da Capital, em 1995, ele tentou abrandar os corações dos que ficaram, dizendo: “Não tenham medo, pequeno rebanho”. Futuramente, voltou à Capital somente para cuidar da saúde, que há anos estava ruim.
No novo século, distante das funções como arcebispo e de volta para os cuidados dos frades franciscanos, que ensinaram boa parte de tudo o que ele partilhou com o mundo, se ocupou em passar os meses que lhe restavam refletindo sobre a vida e sobre o que, hoje, representa a Igreja Católica. Em 2007, internado, bastante debilitado, recebia visita de parentes e amigos. Até que, às cinco horas e vinte minutos de um domingo, aos 83 anos de idade, se eternizou.
CHEGADA A FORTALEZA


Em 6 de agosto de 1973, O POVO noticiava a posse de dom Aloísio como arcebispo de Fortaleza.


80 ANOS
No dia 8 de outubro de 2004, entrevista encerrou série especial o O POVO que comemorou os 80 anos de dom Aloísio.
REBELIÃO
 
Em 15 de março de 1994, numa das visitas rotineiras ao Instituto Penal Paulo Sarasate (IPPS), em Aquiraz, dom Aloísio e outros religiosos foram rendidos por um grupo de presidiários. O caso foi noticiado no dia seguinte pelo O POVO. A rebelião envolveu, além dos padres, autoridades políticas, gestores do poder público e fotógrafos como João Carlos Moura, que estava a serviço do O POVO. O sequestro durou até o outro dia, quando os detentos negociaram uma fuga. Dias depois, dom Aloísio retornou ao presídio e perdoou os agressores. 
A PARTIDA
 
No dia 23 de dezembro de 2007, dom Aloísio morreu, na Santa Casa de Porto Alegre, aos 83 anos. Ele estava internado desde 28 de novembro por causa de insuficiência cardíaca. O POVO do dia seguinte contou a história.
SAIBA MAIS
Escrita por Rotsen Aguiar, da Comunidade de Deus, a coletânea Lorscheider conta a história de dom Aloísio e relata seus ensinamentos, em três volumes:
Volume 1 - Biografia. Palavras Vivas
Volume 2 - Ensinamentos Universais
Volume 3 - Traços da Alma. Devocional Bíblico Diário 
Fonte: O Povo, de 23/12/2017. Cotidiano. p.3.
 
 
 
 
 
 
 



 

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