quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

FELICIDADE EM TEMPOS DE PANDEMIA

Por Cláudia Leitão (*)

E 2020 se foi. Todos dirão que já foi tarde, ou que esse ano nem aconteceu. Mas se pensarmos mais e melhor, poderíamos concluir que este annus horribilis poderia nos ter ensinado muito.

O primeiro aprendizado é que, apesar dos benefícios conquistados pelo projeto civilizatório iluminista, a felicidade continua tão invisível para nós quanto o alinhamento sideral de Júpiter e Saturno.

Se olharmos para os últimos séculos, poderíamos constatar que a idade da razão nos vendeu "gato por lebre" e que os avanços materiais e intelectuais do ser humano não o aproximaram do bem viver. A pandemia veio coroar essa sensação de fracasso e por o dedo em nossas feridas existenciais quando nos adverte que, nem o domínio da natureza, nem o aperfeiçoamento das virtudes humanas, nem o governo racional permitiram à humanidade um final feliz.

Afinal, no que erramos? Como transformamos o sonho do jardim das delícias em uma realidade ecológica catastrófica, ameaçadora da nossa própria existência no planeta?

Eduardo Gianetti observa que o erro capital da ética iluminista foi dar uma ênfase desmesurada à transformação, em detrimento de uma atenção maior à espiritualidade. Evidente que há condições objetivas e subjetivas para que se possa experimentar o status da felicidade. E, quanto mais se produzem indicadores para tentar mensurar esse état d'âme, menos conseguimos experimentá-lo.

Em um país marcado por uma histórica e abissal desigualdade sócio-econômica, vale, ainda, refletir sobre os significados e a viabilidade do "ser feliz"? Em tempos de pandemia talvez tenhamos uma consciência para responder a essa pergunta. De repente, todas as grandes ambições pessoais e profissionais sucumbem diante dos pequenos desejos e instintos legitimam nossa humanidade.

Queríamos abraçar, acolher, estar próximos. Queríamos nos reunir para exorcizar juntos esse ano trágico, mas a ratio humana cumpre seu importante papel e estimula a prudência. Quem sabe possamos reconhecer, em meio a tantas perdas e impossibilidades, que a felicidade se alimenta da empatia e da solidariedade e, por isso, como poetizou Belchior, é uma arma quente.

(*) Professora da Uece. Diretora do Observatório de Governança Municipal do Iplanfor.

Fonte: Publicado In: O Povo, de 28/12/20. Opinião, p.21.

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