Por Tales de Sá Cavalcante (*)
O
genial Carlos Drummond de Andrade, em "José", poetiza os
sentimentos de alguém diante da perda. Para ele, "A festa acabou / A luz
apagou / O povo sumiu (…) A noite esfriou / O dia não veio / O bonde não veio /
O riso não veio / Não veio a utopia / E tudo acabou / E tudo fugiu / E tudo
mofou / E agora, José? (…) Sua doce palavra / Seu instante de febre / Sua gula
e jejum / Sua biblioteca (…) Sem teogonia / Sem parede nua / Para se encostar /
Sem cavalo preto / Que fuja a galope." E Drummond indaga: "Você marcha,
José! / José, para onde?"
Muitos
assim se sentem ao perderem no futebol, dito sem lógica, no amor sem lógica, na
lógica da vida. Alguns podem ficar como "José", pela política. Nas
recentes eleições presidenciais, a torcida parecia estar na arquibancada
de um jogo de futebol, quando, na verdade, estava a escolher não o dono do
país, e sim o nosso representante a comandar o transatlântico chamado Brasil.
Ele será puxado por dois rebocadores. Se um deles o puxar à direita e o outro à
esquerda, o navio não seguirá a trajetória ideal. Mas, se ambos, após o
consenso, o arrastarem em igual direção e sentido, alcançaremos o objetivo
almejado.
Que os
homens públicos, ao divergirem, procurem, sem ódio, o acordo. Basta seguirem os
exemplos dos políticos do passado. Magalhães Pinto, proprietário do Banco
Nacional, ao disputar o Governo de Minas com Tancredo Neves, solicitou a este
um encontro a dois e lá afirmou: "Caro Tancredo, vim oferecer a
contribuição do Banco Nacional à tua campanha." (Àquela época, era possível
a doação de empresas às campanhas.) Noutro caso, no Congresso, Carlos
Lacerda disse: "Tenho a maior admiração pelo Dr. Campos… pela sua
absoluta imparcialidade: mata imparcialmente os ricos, de raiva, e os pobres,
de fome." E Roberto Campos respondeu: "A fúria da seta dignifica o
alvo."
Que,
em 1º de janeiro, nossa nave parta em harmonia, já o condutor, a depender
de seu desempenho, poderá ser alterado de quatro em quatro anos e, como todo
representante, deve ser bem escolhido, exigido e, qualquer que seja seu partido,
nunca divinizado.
(*) Reitor do FB UNI e Dir. Superintendente da Org. Educ. Farias
Brito. Membro da Academia Cearense de Letras.
Fonte: Publicado In: O Povo, de 17/11/22. Opinião, p.16.
Nenhum comentário:
Postar um comentário