Médico-Psicoterapeuta
Segundo o psicologista Paul
Bloom, nascido em 1963, e autor do livro 'How Pleasure Works', o termo
virgindade aparece, nada menos, do que 700 vezes, no Antigo Testamento, e ocupa
lugar ainda mais central no Cristianismo, com o suposto nascimento virginal de
Jesus.
Não cabendo ao cronista discutir
assuntos ligados ao transcendente, ressalto um fato que a mídia destaca hoje: o
leilão terminou e o lance vencedor atingiu 780 mil dólares, pelo direito à
primeira noite com a catarinense Catarina Migliorini. Como se trata de
psicoginecologia, eu tenho todo o direito de dar a minha opinião.
A fêmea humana deixou de anunciar
o seu período fértil, como o faz a maior parte das primatas, ficando muito mais
difícil, para o macho, ter a certeza de que o filho que ele criará é, mesmo,
seu.
Uma maneira utilizada para
aumentar as chances de as crianças serem legítimas era copular,
preferencialmente, com mulheres virgens. Antes, porém, de maldizer o processo
que levou a fêmea humana a esconder a ovulação, gerando milênios de opressão, é
bom lembrar que a ocultação do estro resultou no sexo recreacional, e na
formação de relações duradouras, entre homens e mulheres.
Se esconder o cio era válido no
Pleistoceno (época geológica que começou há cerca de um milhão e setecentos e
cinquenta mil anos, e terminou, aproximadamente, há dez mil anos), não faz mais
nenhum sentido, no mundo moderno, em que a mulher pode controlar sua
fertilidade, e existem exames de DNA à disposição dos homens mais desconfiados,
dar tanto valor àquela pequena membrana.
Antes de prosseguir seria bom
relembrar o que dizem sobre o cio (o período de fertilidade). Ele é um estado
de receptividade sexual extrema, pelo qual passam as fêmeas de muitos
mamíferos, tais como alguns primatas e morcegos, com exceção das mulheres. O
período varia de sete a 15 dias, porém, em alguns casos, pode se estender um
pouco mais, ou um pouco menos.
No caso das primatas, por
exemplo, o cio ocorre duas vezes por ano, ou seja, de seis em seis meses,
estando elas ativas para o ato sexual, apenas, naquele período. Em relação às
mulheres, por sua vez, a atividade sexual pode ocorrer em qualquer ocasião do
ciclo.
Confesso que me afligem várias
perquirições, tais como esta, ensinada por minha avó. Por que nós comemos mais
ovos de galinhas do que de patas? Justamente, pelo fato de que as primeiras
sabem fazer propaganda (um grande estardalhaço), do seu produto, enquanto que
as segundas põem seus ovos sem barulho.
Em pleno século XXI, algumas
culturas continuam valorizando a virgindade como um objeto precioso, sagrado,
sendo preciso ser guardado a “sete chaves”. E os machões, face à
camuflagem do cio escondido, oculto, sem cheiro, da qual as mulheres são
dotadas, pagam um alto preço para passarem, com elas, a primeira noite.
Neste sentido, acredito que a
jovem catarinense está certíssima! Ela vai ganhar um bom dinheiro, para
entregar uma simples abstração, que a maioria das adolescentes oferece,
gratuitamente, aos seus namorados, e, as demais mulheres, aos seus amados.
Se há algo chocante nessa estória
é o valor que nós, homens, ainda atribuímos à virgindade, como se estivéssemos
no período Pleistoceno. Não há dúvida alguma: hoje, o conceito de virgindade
oscila entre uma relíquia mental da pré-história e, em sociedades
conservadoras, uma forma desumana de manipular e tiranizar a mulher.
(*) Professor Titular da Pediatria
da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União
Brasileira de Escritores (UBE) e da Academia Brasileira de Escritores Médicos
(ABRAMES). Consultante
Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha). Foi um dos primeiros
neonatologistas brasileiros.
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