sábado, 6 de janeiro de 2018

Falarei como irmão que fala aos seus irmãos

Por Geraldo Frencken (*)

A gente percebe que a questão está muito centrada no celibato. Será que se poderia deslocar o enfoque para além do celibato?

Dom Aloísio Lorscheider marca nossa vida, por suas palavras, seus gestos ou simplesmente por ter estado presente na vida da gente: ele se fez um sinal de unificação e pacificação, colocava o ser humano em primeiro plano, valorizando a prática da escuta e do olhar do outro, base de toda a sua ação pastoral.
Dedicarei estas linhas à relação de dom Aloísio com os “padres casados”, assunto insistentemente evitado por grande parte da hierarquia eclesial e pelo clero em geral.
Em 1983, dom Aloísio participou do “V Encontro Nacional das Famílias dos padres casados”, em Fortaleza. Assim iniciou sua palestra: “Falarei como irmão que fala aos seus irmãos. Importante não me parece ser reintegrar ou não a vocês no ministério sacerdotal. Não é o exercício do ministério que liberta e salva as criaturas. Mesmo para mim, bispo, o essencial não é o exercício do ministério, mas exercê-lo dentro do espírito de obediência ao Pai, até a morte. Então, os dons que todos temos devem ser colocados dentro desta luz; caso contrário, nós só perdemos. De que forma colocar a serviço dos irmãos aqueles dons que vocês têm, em virtude da experiência do ministério sacerdotal e de suas experiências? Acho que reuniões como esta deveriam ser mais apoiadas por nós, bispos. Mesmo com opiniões diferentes – graças a Deus –, vocês devem colocar em comum aquilo que tem, aquilo que conseguem. A situação de vocês interessa à comunidade eclesial: vocês poderão ajudar muitas pessoas no exercício ministerial.
Sugiro, portanto: primeiro, uma atitude de confiança, de abertura total para com o outro, uma atitude de quem sabe escutar. Temos que superar os infantilismos de quem só quer ouvir aquilo de que gosta, para descobrir o que o outro quer dizer de fato. Depois, uma atitude de reflexão serena, tranquila e madura, à luz da fé. Queria partilhar com vocês esta caminhada. Até o momento, a gente percebe que a questão está muito centrada no celibato. E pergunto: será que se poderia deslocar o enfoque para além do celibato?”
Dom Aloísio não ficava apenas em belas palavras, colocando à disposição os aposentos de sua própria casa para padres que estavam “deixando o ministério”, a fim de que tivessem um lugar para morar até estabilizarem sua vida. E mais: enfrentando a pressão do Vaticano, resistiu com firmeza, evitando a demissão dos “padres casados” que lecionavam no Seminário da Prainha.
Um pastor como dom Aloísio faz falta mesmo.
(*) Padre casado
Fonte: O Povo, de 23/12/2017. Opinião. p.9.

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