sexta-feira, 13 de julho de 2018

ONDE NASCEM OS FORTES

Cláudio Ferreira Lima (Arte de Carlus Campos)
Por Demitri Túlio, colunista de O Povo
Ninguém veio para ser eterno, mas algumas pessoas poderiam ficar por mais tempo na vida. Pelo menos enquanto ainda tivessem disposição para brigar por uma Cidade mais coletiva e um espaço público pleno. Falo de personagens do naipe de Cláudio Ferreira Lima. Pena que tenha partido, aos 71 anos, com a cabeça e o corpo ainda num frenesi por uma história melhor para quem nasceu por aqui e na vastidão do Semiárido. Cláudio Ferreira Lima, do tempo que o conheço, de uns 15 anos para cá, nunca perdeu o viço da conversa ou da capacidade de proposições práticas e estudadas para se acabar o fosso que existe entre a favela e a Aldeota, entre o chão batido e o granito. Ele era a cara de uma das Fortaleza que me deixo tomar o corpo, que não passo sem seus agrados, que preciso retornar quando quero ir embora para cuidar da vida em outros braços.
Mas insistia o quixote Cláudio Ferreira.
Foi um dos poucos economistas a cara do Sertão e generoso na partilha sem frescuras e hermetismo. Informado até as tampas, intelectual sofisticado e, provável, um dos maiores leitores do dia a dia que tive a sorte de receber diálogos. É uma pena que no tempo em que as ideias mais estão maturadas e as arrogâncias vão se desmilinguindo, o corpo nos surpreenda com seus inesperados. Mas é dos ciclos da natureza que somos feitos e esquecemos. Das últimas conversas que troquei com Cláudio pelo zap, perguntei como estava indo a luta do rochedo contra o câncer de próstata. E me respondeu, penúltimo, que “andei mal. Feito passarinho baleado com baladeira malvada. Mas debaixo da cumbuca, voltei ao normal”. Torci por seu triunfo e, egoísta, desejei que não arredasse do País logo agora. Nesse momento escroto do conservadorismo em que seres humanos, feito ele, teriam de encarnar um Heitor troiano.
Tornou-me, um dia, com versos de Isabel Ferreira Lima. “Essa impressão de que há leveza antes da angústia / há verso pleno de vida antes da realidade / Há, enfim, esperança / essa teimosa que me chega quando mais grito”. Perguntei se podia visitá-lo, se não fosse machucar mais ainda suas dores. Disse-me que seria um prazer, mas eu, adiando os dias, não fui. A velha desculpa da falta de tempo, uma torpeza dos não-encontros...  Quando soube de sua travessia, me bateu um vazio. Parecido quando Demócrito Dummar quis ir. Parecido quando sinto falta de uma floresta cuidada na Cidade, de um parque que está sumindo na Sabiaguaba, do Sertão, do Castanhão que vou embora dos pássaros de lá, das chuvas e até do silêncio das estiagens encandeantes...  Sentirei saudades suas, camarada! Mas agradecido pela oportunidade das trocas. Um grande abraço daqui.
Fonte: O Povo, de 8/7/18, Crônica, p.28.

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