Meraldo Zisman (*)
Médico-Psicoterapeuta
Dos comentários recebidos sobre o meu último artigo, que comentou o
aumento de número de gestações em adolescentes, destaco um que me advertiu que
eu deveria ter explicado melhor a relação entre o Abono Barriga e o maior
número de gestações pueris, ao invés de misturar com reformas da previdência,
trabalhista e outras quimeras enganativas...
O que temo ao abordar tais assuntos é envolver a Ciência da Estatística,
deficiente e eivada de erros de coleta, criando mais um diagnóstico de situação
apenas numérico, que serve exclusivamente como alavanca ao empoderamento
político-ideológico, seguido de belos discursos, retóricos e infinitos.
Os números, nunca esquecer, prestam-se à interpretação que convém ao poder.
Deixando de lado os percentuais estatísticos e partindo para números absolutos,
o IBGE informa que, de 1980 a 2000, aumentou em 15% o índice de gravidez na
adolescência, na faixa de 15 a 19 anos. Essa é a única faixa etária que vem
apresentando aumento de fecundidade no País. Isso é mais evidente nas camadas
mais pobres da população. Cerca de 700 mil mulheres de 10 a 19 anos tornam-se
mães a cada ano, sendo que 26% do total de partos são feito em mulheres dessa
faixa etária. Por outro lado, são internadas por dia quase 150 adolescentes
entre 10 e 19 anos, em virtude de abortos provocados. Essa é a quinta maior
causa de internação de jovens em unidades do Sistema Único de Saúde. Dois fatos
preocupantes são: a tendência de fazer abortos em estado adiantado de gravidez,
quando os riscos são muito maiores, e a grande tendência de engravidar
novamente.
Para piorar, temos 1,3 milhão de analfabetos, 17,5 milhões não frequentam
a escola e 5,3 milhões concluíram apenas o ensino médio; 24 milhões não têm
escolarização adequada e 6,6 milhões a têm defasada, com distorção de
idade/série. Conferir em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=253927.
O termo gestação pueril não existe na prática, pois criança que faz outra
criança não é mais criança. É bom lembrar que o termo adolescência foi criado
em pleno século XX, em contraponto ao que ocorria durante a revolução
industrial, quando se passava diretamente de criança para a idade adulta.
Planos e projetos não possuem o dom de se sobrepor à realidade. O título
desta resposta/comentário investe contra o papel da grande mídia brasileira na
manipulação dos fatos apresentados à opinião pública. O fato de quem vive de
bolsa família ter direito a um conversor grátis que transforma sua televisão de
analógica em digital não é fruto do acaso. E ninguém comenta que o Abono
Barriga é um incentivo direto à gravidez na adolescência e indireto ao crescimento
populacional da ‘classe menos favorecida’, o que beira o crime.
O que se publica por ai é que tudo é uma questão de crise econômica. Mas
não existem respostas simples para questões complexas.
(*) Professor Titular da Pediatria
da Universidade de Pernambuco. Psicoterapeuta. Membro da Sobrames/PE, da União
Brasileira de Escritores (UBE) e da Academia Brasileira de Escritores Médicos
(ABRAMES). Consultante
Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha).
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